O Economista austríaco
Prêmio Nobel Friedrich Hayek foi taxativo:
A própria sociologia poderia ser quase considerada uma ciência socialista, por ter sido abertamente apresentada como sendo capaz de criar uma nova ordem no socialismo (Ferri, 1895), ou, mais recentemente que pode prever o desenvolvimento e moldar o futuro, ou de criar a humanidade (Segerstedt, 1969:441). Como a 'naturologia' que outrora pretendeu substituir todas as pesquisas especializadas da natureza, a sociologia prossegue no menosprezo soberano do conhecimento obtido por disciplinas consagradas que há muito tempo estudam estruturas crescidas como o direito, a linguagem e o mercado. (3)
Charlatanice
Os positivistas do século passado chegavam, portanto, a negar a liberdade do homem, que eles consideravam como puramente ilusória, a fim de tornar possível a existência das ciências sociais. Engajavam-se assim em debates filosóficos sem conclusões. Estão hoje ultrapassados, pelo menos no que concerne às ciências sociais.
Duverger, Maurice: 6.
Podem exclusivistas se arvorarem socialistas? A “
Crítica da Ciência” não concorda:
Em Sociologia as analogias aconteceram com a utilização de metáforas, tiradas dos organismos, aplicadas à sociedade e às relações sociais. Os organismos e as sociedades talvez pareçam dentro de certos limites; mas os sociólogos que se viciaram nas metáforas a partir de organismos com freqüência vão além dessas semelhanças específicas e acabam por atribuir às sociedades todas as propriedades que existem só nos organismos. (4)
Wittgenstein também liquida com o encadeamento de Newton e Comte. “Quando pensamos no futuro do mundo, visamos sempre o ponto onde ele estará se continuar a seguir o curso que vemos seguir hoje; não prestamos a atenção no fato de que ele não segue em linha reta, mas segue uma curva, e que sua direção muda constantemente.”
(5)
É impossível o cálculo de todas as variáveis incidentais, seus pesos específicos, momentos e intensidades de influências, ainda mais antecipadamente.
A
Sociologia se apresenta, no mínimo, capenga, limitada. Sorokin qualifica-a “de manifesto caráter reducionista em virtude da ênfase dada a este ou aquele outro fator particular, a partir do qual se pretendia traçar a linha evolutiva e predeterminada dos acontecimentos históricos”.
(6)
As principais características do indivíduo no grupo são, portanto, o desaparecimento da personalidade consciente, o domínio da personalidade inconsciente, a orientação de pensamentos e sentimentos em uma só direção mediante a sugestão e contágio, a tendência à realização imediata de idéias sugeridas. O indivíduo não é mais ele mesmo, é um autômato destituído de vontade. Ademais, pela mera participação num grupo, o homem desce vários degraus na escada da civilização.
Le Bon, cit. Kelsen, Hans, A Democracia: 315
Por volta de 1950, uma enxurrada de teorias encaravam os
many worlds (muitos mundos), efeitos quânticos provocados pela
Teoria da Relatividade na cabeça dos pesquisadores.
A realidade que subjetivamente podemos enxergar é apenas uma, de tantas existentes.
Se aqui é noite, lá é dia. Se uma moeda mostra cara, ao universo mostra coroa, mas sem antagonismos: “Há infinitos universos paralelos formando ramificações. Em cada um se atualiza uma realidade."
(7)
Evidentemente, nada disso se conhecia, sequer se imaginava. O prego ia sem estopa, mas colava.
Enquanto os direitos de liberdade nascem contra o superpoder do Estado - e, portanto, com o objetivo de limitar o poder - os direitos sociais exigem, para sua realização prática, precisamente o contrário, isto é, a ampliação dos poderes do Estado.
BOBBIO, Norberto, A Era dos Direitos: 72-
O Caos frente à Sociologia e ao Direito Positivo
Vivemos à base de idéias, de morais, de sociologias, de filosofias e de uma psicologia que pertencem ao século XIX. Somos os nossos próprios bisavós.
(Bergier, Jacques e Pawels, Louis, O despertar dos mágicos, p. 31)
A possibilidade de uma ordem impossível de ser conhecida veio com o matemático francês Henry Poincaré ao fim do século XIX. Traduzidos para nada menos do que seis línguas, aqueles trabalhos foram pautados pela criatividade, excedendo a régua de Descartes, sem perder de vista a realidade. A partir de então, confirmou-se a existência do que se conhece como
comportamento caótico. Paul Ormedord comenta a revolucionária ótica de Poincaré:
Mais significativo ainda foi o que ele descobriu em sistemas físicos que aparentemente eram bastante simples. A característica típica do sistema caótico é que é impossível prever seu comportamento a longo prazo, uma propriedade que não pode ser abarcada por uma visão que considera o mundo como uma grande máquina. Segundo esta visão, uma alavanca puxada aqui, neste momento, terá conseqüências em diferentes partes do sistema com o passar do tempo, as quais, dado um entendimento suficiente do funcionamento de uma máquina, podem ser compreendidas em seu todo e acuradamente previstas. Em sistemas caóticos, isso simplesmente não é verdadeiro.(8)
Einstein, além de citar Poincaré em inúmeros comentários, concordava plenamente com a possibilidade do comportamento caótico; para tanto, trouxe o exemplo das condições do tempo. Não custa repeti-lo:
Para dizer a verdade, quando o número de fatores em jogo num complexo fenomenológico é demasiado grande, o método científico falha na maioria dos casos. Basta pensar no tempo atmosférico, em que a previsão até mesmo para uns poucos dias antecipados é impossível... As ocorrências nesse domínio estão fora do alcance da previsão exata devido a variedade de fatores em operação, e não devido a alguma falta de ordem na natureza.(9)
O atual Ministro Tarso Genro detecta um impacto social proveniente de ocorrências surgidas fora do alcance e da previsão exata de economistas e positivistas jurídicos, provocado pelo que os olhos não vêem:
Outras alterações, no plano jurídico, passam a subverter os próprios conceitos de eficácia da norma, da hierarquia entre elas e da sua territorialidade: uma simples regra de caráter secundário numa grande bolsa de Chicago ou Londres pode, não só refletir diretamente - causar efeitos, portanto ter eficácia - na situação de equilíbrio macroeconômico de um país inteiro, como ensejar modificações legais e valorizar ou desvalorizar ativos de todo um ramo industrial. (10)
A engenharia arranjou satélites, microondas, radares e câmeras. Atingimos o intento? Talvez tenhamos melhorado um pouco, mas continuamos incapazes de prever a intensidade da cheia do rio Mississipi, do terremoto japonês, da explosão do Etna. Se fatores sem alma perfazem comportamentos ininteligíveis, por ocorrência simultânea de milhares de incidentes, o que dizer das influências sofridas e expressadas pela gente? Que precisão matemática daí pode advir? Que tipo de sociologia se pode dispor? Como prever tantas interferências?
Com o elemento
hipótese praticamente banido até mesmo das ciências humanas, em especial da sociologia, não é de se admirar que apenas há anos se tornasse confirmada a nova ciência, do caos, a incerteza, nos microscópios de W. Heisenberg e Bohr, corroborada pelos testes de M. Planck e E. Schroedinger, por volta de 1925:
“Nos anos 20, os físicos, liderados por Heisenberg e Bohr, constataram que o mundo não é uma coleção de objetos distintos; pelo contrário, ele parece uma teia de relações entre as diversas partes de um todo unificado.”
(11)
O vácuo de tempo ocasionado pelas convulsões sociais e principalmente as guerras, todavia, relegaram estas pioneiras constatações a petit comitès. Hoje, a sustentação científica do fenômeno é corroborada por quase todos os pesquisadores contemporâneos, de todos os ramos científicos. Ao verificarmos ecossistemas vemos a teia, a importância de vínculos, a tendência à associação, até à cooperação, elementos ligados por diversas razões ser abdicar sua originalidade, suas característica, sua vocação. Lewis Thomas destaca: “Não somos seres solitários. Cada criatura está, de alguma forma, ligada ao resto e dele depende”.
(12)
Graças a Planck, sabemos: “Além da estrutura atômica da matéria, há uma espécie de estrutura atômica da energia”
(13), constante universal.
Relata Clemente da Nóbrega:
A coqueluche desencadeada pela Teoria do Caos começou com Edward Lorentz, um meteorologista que no início da década de 1960 trabalhava no celebrado MIT. Lorentz desenvolveu um programa de computador para simular sistemas metereológicos. O computador revelou que minúsculas variações produziam alterações drásticas. Era como se o bater das asas de uma borboleta em São Paulo acabasse desencadeando um furacão em Salvador. A partir daí, esse efeito - de que causas minúsculas podem ter efeitos enormes - ficou conhecido como 'efeito borboleta' e cientistas de diversos outros campos começaram a investigar se havia 'efeitos borboleta' em outros domínios também. E havia. (14)
O “efeito-borboleta” é provocado pelo que se convencionou chamar de “atrator”. Além das conexões locais, pois, existem as não-locais, mas instantâneas e imprevisíveis. São fenômenos que se sujeitam, como tudo, à relatividade e à realidade quântica. Lembrando a fusão do EspaçoTempo na fórmula de Einstein, eventos expressam influências remotas e futuras de todo o Universo. A isto se referem, com outras palavras, (quiçá variando um pouco pelo temor da “morte”) as doutrinas religiosas.
James Gleick, em
Chaos- the making of a new science,
(1987) traduzido como
Caos: o Nascimento de Uma Nova Ciência,
(1991) chama atenção às atuais preocupações:
Cientistas de hoje procuram saber como os sistemas se comportam na turbulência, como a ordem evolui de condições caóticas e como os sistemas de desenvolvimento alcançam níveis elevados de diversidade. Essas indagações são extremamente pertinentes para as companhias e a economia. Livros sobre gerenciamento falam como 'prosperar no caos'. (15)
Nas ciências humanas, especificamente na produção legislativa, F. Von Hayek, da
Escola Austríaca de Economia, em meados do século, propôs qualquer coisa semelhante, a qual tratou de
Cosmos:
Uma ordem existente, ou que se formou independentente de qualquer desejo humano, constitui uma ordem espontânea, ou um cosmos, denominação advinda do grego antigo que alguns filósofos políticos modernos recomendam para distinguir a ordem espontânea da ordem artificial, construída, projetada, sistemática ou não espontânea, que chamam taxis. Para formar um cosmos comum as pessoas só precisam, pois, concordar com regras abstratas (normas gerais de conduta aplicáveis em número incerto de casos futuros) enquanto que para formar uma organização elas precisam ou concordar ou ser forçadas a aceitar uma hierarquia de objetivos predeterminados. Portanto, somente um cosmos pode constituir uma sociedade aberta, enquanto que uma ordem política concebida como uma organização taxis será fechada, tribal. (16)
Outro espelho de eficiência e eficácia caótica da ordem espontânea, o qual nada mais é do que o
Laissez-Faire, Michel Serres trouxe do comportamento das formigas:
Consideremos uma colônia de formigas cujo movimento, aparentemente browniano, vai aparecer agora, após longo tempo, ordenado na construção de um formigueiro. Esse último é uma obra gigante com relação a dimensão dos indivíduos, e uma obra bastante regular com relação a desordem do vaivém deles. (17)
George Herbert Mead
(1863-1931, A filosofia do ato: 153; cit. Abbagnano: 29)) e Dewey bem souberam captar:
A comunidade fala-lhe com uma mesma voz, mas cada indivíduo fala partindo de um ponto de vista diferente; no entanto, estes pontos de vista estão em relação com a actividade social cooperativa e o indivíduo, ao assumir sua posição, encontra-se implicado, devido ao próprio carácter da sua resposta, nas respostas dos outros.
Descolarizando
O estudo da sociedade é tão precioso porque o homem é muito mais ingênuo como a sociedade do que como indivíduo. A sociedade jamais considera outro modo a virtude senão como meio para atingir a força, a potência, a ordem.
F. Nietzsche, Vontade de Potência - Parte 2 : 276.)
Ao redor de 1970 Ivan Illich propôs “descolarizar a sociedade”, substituindo-a por
redes de descolarização. (18) Illich ainda invocava todas as formas de auto-decisão política como o legítimo direito “É decidir por si e para si mesmo”. Este “reequipamento” e esta “restruturação” da sociedade constitui, para ele, a nova tendência no âmbito da civilização industrial.
O pesquisador da Universidade de São Paulo
(USP), Ronaldo Entler, tem se dedicado a pesquisar caóticos na produção artística e no uso dos novos sistemas de comunicação. Em suas observações, percebeu claras similaridades entre sistemas dinâmicos das ciências físicas e as teias de informação da Internet.
A rede oferece acesso a diferentes assuntos, todos interligados, em ordens que não obedecem necessariamente aos catálogos das bibliotecas e aos processos de pesquisa convencional", analisa. "A maneira como se trilha o caminho da informação acaba por alterar as indagações do pesquisador e o resultado final de seu trabalho". Em seu trabalho O Caos na Rede e a Ruptura das Hierarquias, Entler destaca a interdisciplinaridade como virtude de um novo padrão de construção do conhecimento. Na Internet, as informações não estão necessariamente arquivadas como nas estantes de uma livraria. Na busca por um dado, esbarra-se ao acaso em uma série de informações correlatas, muitas vezes capazes de enriquecer o estudo em curso. "A situação sugere que o pesquisador se coloque sensível aos eventuais novos caminhos, apontados no próprio trajeto.
Admitiam-se como científicos ou legítimos só aqueles conceitos “derivativos da experiência”; isto durou séculos. A tortuosa, estreita e escura estrada já acabou:
“Os positivistas modernos tem condição de ver mais claramente que a ciência não é um sistema de conceitos mas, antes de tudo, um sistema de enunciados.”
(19)
A moderna filosofia, além de muito mais humana, mais sensível, “existencial”, também é liberal, natural e democrática. A nova geração sabe disso:
A civilização emergente estabelece um novo código de comportamento para nós e nos transporta para além da padronização, da sincronização e da centralização, para além da concentração de energia, dinheiro e poder. Essa nova civilização tem sua própria e distinta concepção de mundo, maneiras próprias de lidar com o tempo, o espaço, a lógica, e a relação de causa e efeito. (20)
Percebemos a anemia científica da sociologia no reconhecimento, até autocrítica, deste que se fez grande artífice da democracia contemporânea, o também francês Maurice Duverger:
“A Sociologia não é completamente científica”.
(21)
Joseph Needham também reconheceu - a pretensão sociológica é equivocada, porque proveniente daquele mecanicismo newtoniano:
As coisas comportam-se de certas maneiras não necessariamente por causa de ações ou impulsões prévias de outras coisas, mas porque sua posição no universo cíclico em constante movimento era tal que elas foram dotadas de naturezas intrínsecas que tornaram esse comportamento inevitável. (22)
O Novo Mundo
Em contraposição a Hegel e toda a ala da supremacia estatal, defende Bergson o valor supremo da individualidade humana. Qualquer espécie de sociedade é um meio, e não um fim em si mesma.
BERGSON, Henri, cit. ROHDEN, H., A 1993, Vol II: 206.
A sociedade e a natureza se desdobram na complexidade crescente:
Assim, descobriu-se recentemente que na natureza tudo está subordinado a uma ordem, até mesmo os fenômenos confusos, sem nexo, totalmente imprevisíveis. Esta ordem 'superior' é capaz de explicar eventos aparentemente randômicos - não importa se se trata de bolsa de valores, da mudança na temperatura de nosso planeta, ou da maneira que nos formulamos nossos pensamentos - e que podem ser expressos tanto em fórmulas matemáticas e físicas, quanto em belas imagens (os chamados fractals) disformes, mas com uma atraente irregularidade. Todos esses eventos tem algo em comum: o fato de serem atraídos a certos estados da natureza, o que lhes dá unidade, se bem que disfarçada. A nova regularidade dos fenômenos deu origem a uma nova ciência, que tem o “caos” como tema central e, na qual um dia, deve se enquadrar a teoria das ondas. (23)
Nesta teoria de ponta talvez pudéssemos identificar a velha constatação de Adam Smith, elaborada no século XVIII, da ação da
Mão Invisível a qual regula, melhor do que qualquer dispositivo, a sociedade, e os preços pelas quais ela se relaciona:
O esforço natural de cada indivíduo para melhorar suas própria condição constitui, quando lhe é permitido exercer-se com liberdade e segurança, um princípio tão poderoso que, sozinho e sem ajuda, é não só capaz de levar a sociedade à riqueza e prosperidade, mas também de ultrapassar centenas de obstáculos inoportunos que a insensatez das leis humanas demasiadas vezes opõe à sua atividade.
SMITH, A. cit. DOWNS: 56
Consubstancia-se com a singela proposição de TOCQUEVILLE ( 1997: 18):
Os interesses dos indivíduos se compensam entre si e o produto final coincide com o interesse da comunidade. Em outras palavras, a consciência do indivíduo é árbitro e condutor tanto do interesse público quanto do privado, que não é obra do acaso.
O poder da minoria
A sociologia, que pretendeu ser científica ao trabalhar com amostras de população e de acordo com métodos matemáticos, fracassou até no campo da cientificidade. Seus resultados não têm nenhum valor cognitivo ou de prognóstico. Por isso é que estamos numa crise de sociologia.
Brian, D: 28
Se demoramos mais de dois séculos para entender ADAM SMITH, um para EINSTEIN, e não sei quanto precisará alguém para deixar de ser bobo e se inteirar pelo menos de BOBBIO. (Sorry) Há mais de meio apregoava o socialista BERTRAND RUSSELL (Ideais Políticos: 10):
"Não um único ideal para todos os homens, mas um ideal diferente para cada homem é o que deve ser alcançado, se possível."
"Isto faz dos seres vivos elementos numa vasta rede de inter-relações que abarca a bioesfera de nosso planeta – que em si mesma é um elemento interligado dentro das conexões mais amplas do campo psi que se estende pelo cosmos." (LASZLO: 198)
A crise da sociologia pode ser real ou imaginária, mas não há dúvida de que tem sido proclamada por muitos. Em 1946, na aula inaugural pronunciada na London School of Economics and Political Sciences, T. H. Marshall se mostrou preocupado com a “encruzilhada” na qual se encontrava a sociologia. As tarefas práticas eram urgentes e os recursos teóricos pareciam inadequados. As interpretações herdadas dos clássicos seriam insuficientes para fazer face às urgências da reconstrução social. Em lugar das teorias globalizantes, caberia formular “pontos de apoio intermediário”, de modo a atender aos desafios imediatos, localizados, setoriais, quotidianos, de normalização e ordenamento dos problemas sociais.
IANNE, Octávio, A crise dos paradigmas na Sociologia - Problemas de explicação
O desenvolvimento econômico e político requer ser redescoberto e readaptado a partir da cabeceira, retorno ao Estado Liberal, como predisse, já há aproximadamente 30 anos, M. Fergunson:
“Aproxima-se uma revolução. Não será como as revoluções de antanho. Partirá do indivíduo e da cultura e só transformara as estruturas políticas em última instância. Não terá a necessidade de recorrer à violência para impor-se e a violência não poderá sustê-la.”
(24)
Houve duas revoluções de antanho similares, não lembradas por Fergunson: a
Revolução Gloriosa, de 1689; e a
Queda do Muro, 1989. Ao fechar o século, como efeito da compreensão dos limites das ciências, da teoria do caos e das revoluções subversivas, o Parlamento da Inglaterra, curiosamente com predomínio trabalhista, rende-se totalmente aos princípios liberais, eu diria “lockeanos”, o que Roy Jenkins chama de “a sociedade civilizada”:
“Indivíduos diferentes desejam tomar decisões diferentes dizendo respeito ao seu comportamento individual; sob condição de não restringir a liberdade de outrem, devem poder fazê-lo num quadro de compreensão e tolerância”.
(25)
Ora, ora, não é o mesmo que diz, em 94, Alvin Toffler:
“Tolerância ao erro, ambigüidade e, sobretudo, diversidade, apoiadas por senso de humor e de proporção são requisitos indispensáveis à sobrevivência ao arrumarmos a nossa mala para a maravilhosa viagem ao próximo milênio.”
(26) E, logo adiante, a importantíssima constatação, onde resplandece a importância do indivíduo e de sua pequena comunidade:
“O primeiro princípio herético de governança da
Terceira Onda é o fato do poder da minoria. Ele sustenta que o poder da maioria, o principal legitimador da Segunda Onda, está progressivamente obsoleto. Não são as maiorias que contam e, sim, as minorias”.
(27)
A França reconhece o brilho, presta homenagem ao princípio de Locke e volta ao futuro:
“Depois de erguidos o
Arco do Triunfo e a torre
Eiffel, um projeto francês pretende criar o primeiro símbolo verdadeiramente global – no espaço. É a
Estrêla da Tolerância, uma nave que usa um conceito revolucionário: a propulsão por vento solar.”
(28)
Os pesquisadores se debatem pela reversão:
Do lado da sociologia, sabe-se que mesmo um autor como Luhmann acabou por se ver compelido a introduzir uma mudança radical no paradigma das relações entre a pessoa e o sistema social. Deixando de ser categorizada como mero ambiente do sistema social, a pessoa passa a valer, também ela própria, como sistema. Um sistema social, a figurar como seu (da pessoa) ambiente. A pessoa vê-se, assim, chamada - e legitimada - a desafiar permanentemente o sistema social, como fonte de 'contingência', 'irritação', mesmo desordem. De acordo com o 'novo paradigma luhmanniano', 'na construção de sistemas sociais, a complexidade opaca dos sistemas pessoais aparece como indeterminabilidade e contingência'. Não sobrando para o sistema social outra alternativa que não seja 'interiorizar a complexidade' irredutível, emergente da pessoa. O que bem justificara a pretensão de apresentar a nova teoria de Soziale Systeme (1984) como uma Zwang zur Autonomie. (29)
No país de Morin, Bachelard, Gèny, Serres, Bergson, e Chardin, a
Sorbonne não rebentou o busto de Comte, como fez a Rússia com o de Marx; sintomaticamente, porém, ela o deslocou:
Durante dez dias recarreguei as baterias em Paris, no Quartier Latin, que freqüento há quase 50 anos. A não ser a mudança do monumento a Augusto Comte da frente da Sorbonne para sua direita, desobstruindo a visão da fachada da Universidade, não noto qualquer mudança notável. (30)
Parada a
Sociologia, incinerada sua carga letal, uma
Individuologia, que tal?
Aprecie: ___________
Notas
1. Warat, Luiz Alberto, Mitos e Teorias na Interpretação da Lei, p. 82.
2. Kelsen, Hans, A Democracia, p. 304.
3. Hayek, Friedrich August von, Os erros do socialismo - Arrogância Fatal, p. 76.
4. Deus, Jorge Dias de, org., p. 203.
5. Wittgenstein, Ludwig, (1989-1951) Tratactus Lógico-Philosphicus, publicado no Brasil pela Edusp, cit. Prado Jr., Bento, Folha de São Paulo, 8/6/1997, Mais!, p. 5.
6. Sorokin, Pitirim A., La Sociológie au XXe Siecle, p. 96 e seguintes.
7. Toffler, Alvin e Toffler, Heidi, p. 20.
8. Ormerod, Paul, Morte da Economia, p. 51.
9. Einstein, Albert, Einstein Por Ele Mesmo, p. 94.
10. Genro, Tarso, Direito e Globalização, Jornal do Comércio, Porto Alegre, 12/12/1996, p. 26.
11. Capra, Fritjof, Sabedoria Incomum, Conversas com pessoas notáveis, p. 15
12. Thomas, Lewis, The Lives of a Cell, p. 6.
13. Planck, Max, cit. Einstein, Albert, Escritos da maturidade: artigos sobre ciência, educação, relações sociais, racismo, ciências sociais e religião, p. 241.
14. Lorentz, Edward, cit. Nóbrega, Clemente,, p. 235.
15. Toffler, Alvin e Toffler, Heidi, p. 74.
16. Hayek, Friederich Von, The Confusion of Language in Polítical Thought, London, 1968; cit. Maksoud, Henry, Demarquia Um Novo Regime Político e Outras Idéias, p. 83/84.
17. Serres, Michel, cit. Descamps, Christian p. 101.
18. Illich, Ivan, cit. Schwartzenberg, Roger-Gérard, Sociologia Política, p. 454 e segs.
19. Popper, Karl, A Lógica da Pesquisa Científica, p. 35.
20. Toffler, Alvin e Toffler, Heidi, p. 118.
21. Duverger, Maurice, Sociologia Política, p. 198.
22. Needham, Joseph, Science and Civilization in China, p. 279.
23. Richers, Raimar, Surfando as Ondas do Mercado, p. 21.
24. Fergunson, Marylin, Conspiração Aquariana.
25. Jenkins, Roy, cit. Schwartzenberg, Roger-Gérard, Sociologia Política, p. 440.
26. Toffler, Alvin e Toffler, Heidi, p. 113.
27. Idem.
28. A idéia, que está sendo desenvolvida pela ESA (Agência Espacial Européia) foi criada por Nersi Razavi, cientista da empres Phenix. Ele apresentou seu trabalho no 51. Congresso Internacional de Astronáutica que terminou Sexta-feira no Rio de Janeiro. (Folhaciência, Vento solar impulsiona nave espacial. - Folha de São Paulo, 8/10/2000, p. A27.
29. Luhmann, N., cit. Andrade, Manuel da Costa, Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal: Uma Perspectiva Jurídico-criminal, p. 26.
30. Correio do Povo. - Porto Alegre, 15/6/1997, p. 4.