quinta-feira, 28 de agosto de 2008

A instalação da república positivista no Brasil




Vivemos sobre uma civilização. A cada escavação do metro ou abertura de poços descobrimos uma relíquia. A antigüidade nos enriquece, mas em certo sentido nos impede de viver. 
VASSALIS VASSALICO¹
O vermelho das datas dos aniversários,
Pompas de mármore, árduos monumentos,
Pompas da palavra, parlamentos,
Centenários e sesquicentenários,
São apenas cinzas, a menor flama,
Dos vestígios desta antiga chama.
JORGE LUÍS BORGES, La Moneda de Hierro,
Obras Completas, Tomo II: 129.
Justo por cinzas, claro, essas dtas festivas são apropriadas para colorir com a cor que se quiser.  Das mais devotadas são  7 de setembro & XV de Novembro. Ambas deveriam ser motivo de vergonha, jamais de jactância. A primeira assinala um brado retumbante disparado aqui, do outro lado do Atlântico, contra um pai que finalmente dormia sossegado em sua varanda. E a segunda não passou de simples traição da própria guarda imperial. Reverenciam-se os atos quiçá por distantes, e cercados de intensa divulgação, mas uma publicidade enganosa que certamente não passaria por um órgão de defesa do consumidor se revelados motivo, método e consequências que os rótulos píntados heróicos de antemão esconderam. Por aqui ninguém se dá conta de nada, mas as artimanhas aqui vistas pelo inglês já não iludem nem mais ninguém, sequer aquele inocente alemão acostumado ao embarque por Eixo, tampouco os românticos italianos, outrora sensíveis aos romeus & julietas, benitos & claras.
O mito final da República é uma mentira útil que se deve contar a essas crianças, a fim de que se submetam à autoridade paterna da ordem estabelecida.(KELSEN,  H., 1998: 323

As primeiras histórias das instituições foram histórias do direito, escrita por juristas que com freqüência tiveram um envolvimento prático direto nos negócios do Estado. (BOBBIO, N. 1987: 54)
As últimas não são diferentes. O próprio  BOBBIO,uno dei maggiori intellettuali del Novecento, sentiu na pele o genuíno platônico. Sem o carma não haveria o fascismo.
A marcha positivista
Esses homens incríveis e suas máquinas maravilhosas - eis o lema desta passagem de século, quando se acreditou piamente na capacidade de controlar mares, céu, terra e os próprios homens. Talvez os maiores ícones dessa época em que o otimismo social tornava-se uma espécie de utopia alentada e o futuro prometia um destino civilizado sejam a ciência e suas invenções diletas, que revolucionavam o transporte, a higiene, a agricultura e o próprio dia-a-dia. É dessa maneira que o Brasil entra no novo século: confiante nas verdades absolutas, nas certezas fáceis e nos prognósticos que anunciavam o controle e a evolução de toda a humanidade rumo a um só destino. Mas esses "tempos modernos" traziam seus limites: veneno e antídoto, a ciência representava, ao mesmo tempo, a utopia e seu calvário.
O positivismo jurídico remonta à expressão da lei, isto é, da vontade do legislador.  O ninho mais produtivo se alojou em sua vizinhança, precisamente em Paris, quando as elucubrações cartesianas de ROUSSEAU obscureceram os preceitos da relatividade elencados por MONTESQUIEU. O Espírito das Leis predizia que um sistema democrático não teria êxito em países de grande extensão territorial. Então a França simplesmente descartou o Barão de La Brède:
O clima e o temperamento, mesmo quando são uma causa física primordial do caráter de um povo, são submetidos a uma causa posterior e secundária ainda mais enérgica, a ação do governo e das leis que tem a faculdade de violentar as ações, criar hábitos novos e contrários aos antigos, e, por esse meio, mudar o caráter das nações, coisa de que a história da vários exemplos. VOLNEY, Tableau du Climat et du sol des Etats-Unis, Eclaircissements, art. IV, em Euvres, F. Didot, 1843: 709; cit. GUSDORF, Georges, As Revoluções da França e da América: 104)
Curiosamente a Vaca Leiteira imprimiu um o caráter ilusório à Nação, um  romantismo quase quixotesco, grosso modo inverso da ciência, pero medalha de ouro em duas modalidades: recordista em constituições e prêmios Nobel de Literatura
O Eua solucionou a restrição de MONTESQUIEU simplesmente respeitando o way of life de cada colônia. O território foi dividido em pequenos estados, unidos. A arte lograva contornar a advertência do mentor dos Tres Poderes, mas o sucesso do método cartesiano levado ao êxtase pelo "Contrato Social" encorajaram os franceses ao desatino. A codificação em larga era tapete precioso ao desfile de Napoleão. Relegado o Corso  à Santa Helena, coube a  Comte  aproveitar o espólio, emprestando ainda maior verniz ao modelito dogmático, ao gáudio de mais dois napoleões.
O mundo assim organizado pelo século XIX, ao produzir automaticamente um homem novo, intrometeu nele formidáveis apetites, e poderosos meios de toda ordem para satisfazê-lo - econômico, corporais (higiene, saúde média superior à de todos os tempos), civis e técnicBloco de texto uma enormidade de conhecimentos parciais, porém eficientes. Nosotros, macaquitos brasileños, importamos a metonímia. No meado do XIX chegou o container para impor a ordem expressa, real, rumo ao suposto progresso: : "As primeiras manifestações da doutrina de Comte no Brasil datam de 1850, ou mesmo um pouco antes.” (COSTA, C.: 34)
O idioma franco se fazia diplomático; portanto, internacional. Sua cultura era a preferida do jet set.  A  arquitetura, e a moda, encantavam os primos pobres. O inglês era restrito aos seus domínos, inacessíveis aos latinos, e desprovido de charm. A França mostrara pujança ao correr com D. JOÃO VI, e por tudo isso o positivismo criou asas. O próprio Rei tratou de importar uma excursão completa  de artistas do filet-mignon da Europa. (1816)  O Rio teve muitas transformações desde a época colonial, de quando já se perdeu quase tudo - ressalta Carlos Fernando Andrade, superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no Rio. - A Missão Francesa trouxe grande influência do neoclássico, com suas sucessões de arcos e uma platibanda que, além de esconder telhados, apresenta elementos como colunas e estátuas. As construções da Avenida Rio Branco (inaugurada com 30 prédios acabados e 85 ainda sendo erguidos) obedeceram às regras de um concurso de fachadas que previa prédios parecidos com os da capital francesa. O Rio de Janeiro ainda conserva algum estilo da Cidade-luz, sobressaindo-se as tradicionais luminárias, e grandes prédios públicos - Banco Central, Biblioteca Nacional, a própria sede do Iphan, o Museu Nacional de Belas Artes, o Teatro Municipal e o Centro Cultural da Justiça Federal, e a antiga sede do STF Também estão tombados o prédio do Clube Naval e os imóveis 88 e 155 da avenida, que pertencem, respectivamente, à Ordem Terceira de Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte e à Santa Casa da Misericórdia. A influência na arquitetura se manifesta em quatro estilos: neoclássico, eclético, Art Déco ou Art Nouveau, e o moderno. O estilo mudou não apenas a paisagem, como os costumes .Passeio pelo art déco de Copacabana A moda chic induziu os moradores seguirem os cortes parisienses, e incrementou os hábitos nos cumprimentos, nas danças, e nos passeios pelas boulevards cariocas.. RFI - Leia e ouça comentários sobre aspectos inéditos da imigração francesa no Brasil
Valorizaram-se escolas militares, politécnicas, faculdades de Engenharia. As faculdades de Direito, de Filosofia, de Economia logo abririam os portões. Nos corredores, ecoava o canto heróico e entusiasta, refrão do conto de Comte :
A República está próxima. E não há como resistir. As sociedades obedecem ao influxo de leis tão exatas, precisas e invariáveis como as que regem os fenômenos transformadores do mundo físico. É que os fenômenos sociais estão sujeitos às leis naturais, como os fenômenos físicos. É que há uma física social. CASTILHOS, Julio, cit. FLORES, Hilda Agnes Hubner, Revolução Federalista: 18
Houve Augusto Comte. Pensava conhecer o futuro que estava reservado à humanidade. E, portanto, considerava-se o supremo legislador. Pretendia proibir certos estudos astronômicos por considerá-los inúteis. Planejava substituir o cristianismo por uma nova religião e chegou a escolher uma mulher para ocupar o lugar da Virgem. Comte pode ser desculpado, já que era louco, no sentido mesmo com que a patologia emprega este vocábulo. Mas como desculpar seus seguidores? VON MISES, Ludwig: 31
Esses seguidores são, apenas, muito ambiciosos.
O fato de, no Brasil, o Estado ter se organizado antes da sociedade, impondo-se sobre esta, teria sufocado processos autônomos de organização cujo resultado se via na debilidade da sociedade civil. (COSTA, V.: 33)
O golpe
Dom Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Bragança e Habsburgo, chamado O Magnânimo (Rio de Janeiro, 2 de dezembro de 1825 — Paris, 5 de dezembro de 1891), foi o segundo e último Imperador do Brasil. Dom Pedro II era um grande estadista, há unanimidade, mas o reluzente ouro detém o irresistível poder gravitacional, tal qual luz, à maripôsa.
O Brasil saíra de uma Independência fictícia. A Corte Portuguesa continuava no domínio, mercê dos descendentes diretos. Enquanto o Imperador viajava aos EUA, na comemoração do centenário da Independência daquele já vanguardeiro país, por aqui se começava a tramar sua queda. O Imperador trouxe a concepção federalista, expressa pela cópia da bandeira (2), e pela distensão adotada. O historiador José Murilo de Carvalho, (D. Pedro II, Companhia das Letras: 2007), informa: o Brasil jamais desfrutara tanta liberdade de expressão quanto no Segundo Reinado. Até mesmo injúrias ao monarca eram publicadas, não admitindo ele que fossem punidas ou que os jornais que as divulgavam fossem processados ou fechados. Nada disso vinha ao caso; ou melhor, seria bem aproveitado: 80% da Nação era simplesmente analfabeta.(Segundo a Casa Ruy Barbosa)
A Guerra do Paraguai atiçara a volúpia militar. O pacifista Imperador repreendera publicamente os soldados, taxando-lhes “assassinos legais”. E por bizarro, a Abolição da Escravatura completaria a justificativa golpista:
As dificuldades da economia, agravadas com os gastos decorrentes da Guerra do Paraguai e, principalmente, a abolição da escravatura colocaram a aristocracia rural contra o imperador. O exército, por sua vez, buscava maior autonomia — que considerava conseqüência natural do sucesso na guerra — e estava bastante influenciado pelas idéias positivistas e republicanas. Wikipédia
Mercê do francês, quedamos reféns dos marechais: :
Inspirados na filosofia de Auguste Comte e na sua Teoria dos Três Estados ou Estágios de Civilização (o teológico, o metafísico e o científico ou positivo), os republicanistas que se opunham aos democratas defendiam uma república provisória com meio para alcançarmos a ordem e o progresso. Segundo eles, somente numa ditadura sociocrática, nos moldes positivistas, poderiam ser resolvidos os nossos problemas; para atingirmos esse objetivo tornava-se necessária a instauração desse regime ditatorial e, ao combaterem então a monarquia esses políticos defendiam o republicanismo.DA SILVA, Prof. Nady M. D., Positivismo no Brasil, Univ. Fed. do Maranhão.
"O movimento que destruiu a monarquia brasileira não passou de um processo de institucionalização jurídico-político de forma republicana de governo através de golpe militar”. (WEFFORT, Francisco Correa, Por que Democracia)
Para Michaël Zöller, sociólogo alemão da universidade de Bayreuth, o que se chama de Estado é certamente um sistema de interesses pessoais organizados, uma Nova Classe. Como todos nós, sua ambição é aumentar a remuneração e a autoridade.. Como classe, ocupam-se, pois, a desenvolver seus poderes,suas intervenções e sua parte no mercado, isto é, a apropriação pelo setor público dos recursos nacionais, operada através do imposto sobre a sociedade civil. SORMAN, G. :74.
Um prosaico fato contribuiu à precipitação golpista: os "heróis" da guerra tinham sido barrados no famoso Baile da Ilha Fiscal, e isso não poderia ficar em branco. Na mesma hora em que se acendiam as luzes do palacete para receber os milhares de convidados engalanados, os republicanos se reuniam no Clube Militar, presididos pelo tenente-coronel Benjamin Constant: "Mais do que nunca, preciso sejam-me dados plenos poderes para tirar a classe militar de um estado de coisas incompatível com sua honra e sua dignidade".(http://veja.abril.com.br/historia/republica/sociedade-baile-imperio-ilha-fiscal.shtml)  Sem a menor informação, o povo foi presa fácil, facilmente convencido³:
Apesar de gozar de boa imagem entre a população, Pedro II foi deposto no dia 15 de Novembro de 1889, através do golpe militar do qual fez parte o Marechal Deodoro da Fonseca, que seria mais tarde o primeiro presidente republicano brasileiro. (Wikipédia)
Isso é o que se comemora. As propriedades da família imperial e seus menores bens foram imediatamente arrestados e leiloados. Em seguida, a nova casta mostrou a cara, em flagrante violação da Constituição recém promulgada em 1891. O marechal Deodoro ordenou o fechamento do Congresso. Para evitar uma guerra civil, o mal. acabou renunciando, em favor do coleguita Floriano.
Dom Pedro II deixou o Brasil sem ressentimento, embora triste. Ao ser deposto, e banido do País, formulou «ardentes votos por sua grandeza e prosperidade». Era paraEra para inglês ouvir. Ele sabia, de antemão, que isso seria impossível:
É sabido que Augusto Comte não teve uma compreensão plena e segura do fenômeno jurídico, tendo seu espírito dominado por um determinado tipo de ciência do direito e por uma determinada espécie de jurista: o filósofo de Montpellier tinha diante dos olhos uma Jurisprudência formalista e convencional, enclausurada no mundo dos conceitos e dos silogismos, distante das mutações sociais, por força de sua fundamental inspiração racionalista e abstrata. Pelas mesmas razões, não concebia ele o jurista senão um 'leguleio' divorciado das realidades humanas, apegado em demasia ao casuísmo, perdido no sonho de subordinar o devir histórico a regras estereotipadas e frias.
REALE,  Miguel, Pluralismo e Liberdade

Augusto Comte, cujas idéias hoje fossilizadas são simples curiosidade nos museus filosóficos, pertencia à perigosa espécie dos que se julgam donos da verdade e se auto-atribuía uma missão que o levou à beira da loucura. Suas idéias eram uma mistura de messianismo e dogmatismo: uma monomania pseudocientífica. A política devia obedecer a critérios científicos, impostos por uma minoria de especialistas. A representação política não tinha qualquer valor; o único que importava era a competência. A política 'científica' consistia em fazer de cada indivíduo um funcionário social, totalmente subordinado ao poder. Nada mais estranho ao pensamento de Comte do que a noção liberal de direitos individuais: 'Todo direito individual é uma abstração, a sociedade é a única realidade'. Nada de divisão de poderes: o Legislativo e o Judiciário deviam ser inteiramente subordinados ao Executivo. Tudo para o Estado, nada para a sociedade; em suma, um completo sistema de despotismo espiritual, político e social. CANGUILHEM, Georges, Cahiers pour l'analyse; cit. DESCAMPS, C.,: 88
Na euforia do racionalismo, se desvinculou perigosamente o Direito Positivo de quaisquer outros compromissos com valores fixos e imutáveis, passando tudo a depender das maiorias eventuais, comprovadamente volúveis e supostamente representativas da fonte de sabedoria, que é o povo. Boaventura, Jorge, O Estado de São Paulo, 29/4/1996: A2
Ruy Barbosa (Novos Discursos e Conferências: 350; cit. Bonavides, P. Ciência Política: 317) retratou a usurpação, nada mais do que prelúdio do presente::“Deste feito, o presidencialismo brasileiro não é senão a ditadura em estado crônico, a irresponsabilidade geral, a irresponsabilidade consolidada, a irresponsabilidade sistemática do Poder Executivo." Quem poderia confortar a Águia de Haia? O país quedara aos pés da classe dominante, porque naquele tempo o que dominava era o fuzil, sim senhor.  O resto era só para inglês ver. Solitária e visível, a Águia foi facilmente abatida pelo comando de terra.
SP, 24 de abril de 2011: Criado em 1890 pelo marechal Deodoro da Fonseca no primeiro ano depois da Proclamação da República, o Montepio Civil da União resistiu por 101 anos mantendo o privilégio de conceder pensão vitalícia a filhas solteiras de ministros de Judiciário.

TRIBUNA DA IMPRENSA - Rio de Janeiro - Editor-chefe: Jornalista Carlos Lacerda.
No segundo decênio deste século, num Brasil que perdeu o pulo da passagem do séc. XIX para o XX, surge como expressão das oligarquias dominantes, a candidatura do marechal Hermes da Fonseca; e como reação liberal e progressista, a desse grande rejeitado que o Brasil tantas vezes usou quantas desperdiçou, Ruy Barbosa. Naturalmente, venceu Hermes da Fonseca, pois a eleição era uma ficção jurídico-política. Algumas dezenas de pessoas - se tanto! - conduziam a nação e decidiam do seu destino. O povo não participava do processo, senão como mera figura retórica. A Ruy ficou-se devendo o serviço de criar, por assim dizer, uma opinião pública atuante. Através de estados de sítio e habeas-corpus, de peregrinações cívicas, palmas e perigos, ele começou a mobilizar a consciência coletiva. E se o acusam de tê-la inventado, ainda é maior o seu mérito. Pois o homenzinho valeu, sozinho, por toda uma comunidade incapacitada para o uso da razão.
LACERDA, Carlos, Em Vez: 30.
Para P. Johnson (A History of the American People), tanto os seres vivos quanto os países tem um código genético. A forma como um país é criado define seu futuro. É, portanto, seu DNA. O nosso apresenta o franco colorido
A universidade brasileira ainda não existia, é certo, mas também há consenso em se afirmar que sua emergência foi retardada pela posição dos positivistas comtianos - ortodoxos ou heterodoxos, autoritários ou democráticos - que consideravam que, no clima de opinião vigente, sua instalação apenas aumentaria a confusão existente no país entre as etapas ou estágios de desenvolvimento do pensamento. LOVISOLLO: 243
,
A Ciência Política, como todas as ciências humanas que se desenvolveram no interior da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, como era então denominada por ocasião de sua fundação, teve a sua marca francesa.
Sua origem foi sociológica com forte influência filosófica. QUIRINO, Célia, Departamento de Ciência Política da USP - Estud. av. vol.8 no.22 São Paulo Sept./Dec. 1994
Antônio Paim confirma o liame, e as consequências da macaquice:
A evolução da elite política brasileira no sentido de uma tendência abertamente fascista, com o Estado Novo, não poderia ter ocorrido sem trabalho prévio, ao longo de várias décadas, seja do castilhismo, no meio político, seja do positivismo, no meio militar. A base comum que possibilitou o trânsito de uma a outra das posições pode ser apreendida na análise de uma obra que expressa melhor que qualquer outra essa evolução: o Estado Nacional de Francisco Campes (1891/1968).
Ramiro Barcelos retratou a chaga gaúcha, onde o embrião positivista foi avassalador:
Nas trevas da negra noite
O gaúcho destemido
Corre, seguindo o ruído,
Sem medo ou temor da morte;
E vai, sem rumo e sem norte,
Guiado só pelo ouvido.

O povo é como boi manso
Quando novilho atropela
Bufa, pula e se arrepela,
Escrapeteia e se zanga;
Depois...vem lamber a canga
E torna-se amigo dela.

Home é bicho que se doma
Como qualquer outro bicho;
Tem às vezes seu capricho,
Mas logo larga de mão,
Vendo no cocho a ração,
Faz que não sente o rabicho.

Pobre Estância de São Pedro
Que tanta fama gozaste!
Como assim te transformaste
Dentro de tão poucos anos,
De destinos tão tiranos
Não há ninguém que te afaste!

Na mão do triste Chimango,
O arvoredo está no mato;
O gado... é só carrapato;
O campo... cheio de praga,
Tudo depressa se estraga,
No poder de um insensato.

E tudo o mais em São Pedro
Vai morrendo, pouco a pouco,
A manotaços e a sôco
Rolando pelo abismo;
Pois com o tal positivismo,
O home inda acaba louco...

AUGUSTO COMTE, falecido na metade do século retrasado, ainda consegue ditar o futuro, pelo presente:
O cortejo dos presidentes, ministros, senadores, deputados federais, governadores, deputados estaduais, prefeitos e vereadores aberto em 1889 informa que a troca de regime não mudou a essência da coisa: o Brasil republicano é o Brasil monárquico de terno e gravata, só que mais cafajeste. Muito mais cafajeste, informa a paisagem deste começo de século 21. Depois de 500 anos, os herdeiros dos traços mais detestáveis do DNA nacional promoveram o grande acerto dos  amorais, instalaram-se no coração do poder e vão tornando decididamente intragável a geleia geral brasileira. seção Vale Reprise
Pesquisa dá respostas ao atraso do Brasil - O positivismo não foi apenas o primeiro movimento filosófico moderno a influenciar as autoridades brasileiras, já no século passado, mas também conduziu a supervalorização da ciência, a ponto de considerá-la perfeita e acabada, simplesmente pronta a ser ensinada, mas não a ser pesquisada. E desta vez, mais do que nunca, o responsável pelo atraso não é o estrangeiro. Mas deliberadamente local. MAKIYAMA, Marina R., O Estado de São Paulo, 21/5/1995: D14.
__________
Notas
1.
Co-autor do filme "Z". - O Estado de São Paulo, 9/12/1995.
2. *Os EUA, representam as independências dos estados nas estrelas, as quais se projetam pelas harmônicas, estáveis e contínuas linhas vermelhas. Traduzem, por esta notável arte, o equilíbrio e a estabilidade de sua democracia liberal, sob o regime federativo.
No nosso, a hierarquia imperial exige comando supremo, a centralização. Mister um desenho que a exprima. Assim trocamos a cópia americana da bandeira provisória da República dos Estados Unidos do Brasil por uma geometria remetente ao centro, onde foram alojadas as estrelas:

"Na mesma sessão de 15 de novembro, em que a Câmara Municipal carioca reconheceu o regime, hasteou José do Patrocínio oficiosamente uma bandeira republicana, decalcada sobre a norte-americana, apresentando faixas horizontais alternadamente verdes e amarelas. Preocupado com a imitação do modelo estrangeiro, alheio às tradições nacionais, apressou-se Teixeira Mendes em conceber outra, que caracterizasse a nova situação política, simbolizando a filiação do presente em que se adentrava, ao passado imperial. Assim, conservando as três figuras geométricas do pendão monárquico (retângulo verde inscrevendo o losango amarelo que por sua vez circunscreve o círculo), eliminou os emblemas do regime decaído (coroa encimando escudo, contendo este esfera armilar sobre a cruz de Cristo) e os ramos de tabaco e café, moralmente indesejável aquele enquanto fonte vegetal de um vício e economicamente inadequados ambos, visto que não mais representarem as principais riquezas agrícolas do país. A tudo substituiu uma esfera representando o aspecto celeste do Rio de Janeiro no instante do advento do regime que simbolizava, com a inscrição Ordem e Progresso. Na distribuição estrelar introduziu o Cruzeiro do Sul, cujo formato em cruz evoca os antecedentes católicos da nação. (Virmond de Lacerda Neto, A República Positivista, Juruá Editora, Curitiba, 2003: 132)
Para um povo ignorante de tudo, imagine da arte, era muito pouco a simples presença das cores suas formas geométricas. Por isso é que com indisfarçável orgulho, no “lábaro estrelado”, foi impregnada a presunção científico-militar, mais vontade do que afirmação, de que só a ordem trará o progresso, o que pressupõe ser a ordem unida a operação mais adequada à felicidade. Marchamos em ordem, ao progresso; só não se sabe de quê, ou à felicidade de quem. O dístico chega a ser cunhado na borda de moedas do real, as de cinqüenta centavos, algumas das quais, trazidas ao conhecimento público por acaso, foram imprimidas com a mensagem “Orcem” e Progresso, erro ou blague que induz supor que devamos efetuar a navegação da vida orçando... só não se sabe para que lado.
O “adaptador” do original “Ordre et Progrès” presidia o “Apostolado Positivista no Brasil”. Raymundo Teixeira Mendes era o nome do artista, muito usado para denominar ruas em diversas capitais. Por causa dessa excelência, a bandeira, tão habilmente desenhada, nasceu privada do céu noturno integral e as estrelas, ofuscadas pela presença intrusa da faixa imperativa. Desse modo “ciência” “intervém” na natureza... tapando-a parcialmente, numa ex(im)posição tão ridícula quanto inóqua, atestado de ignorância científica, certamente motivo de chacota entre pesquisadores mais atentos.
Não por acaso, o deputado Wenceslau Escobar apresentou, já em 8 de junho de 1908, portanto há exato século, um novo projeto de alteração, com a supressão da faixa e do lema. Como se vê, o pleito foi arquivado. Na constituinte de 33, várias sugestões foram oferecidas, mas para a ditadura, nenhuma poderia ser mais eficaz do que o dobrado francês. Ora na faixa, em lugar da concepção de Comte, são usados todo o tipo de mensagens de marketing, a começar pela recente conclamação Avança Brasil, e até pela inserção do número 0800612211 para ligações gratuitas ao Senado. Isso mesmo – em lugar do lema, o pavilhão nacional também portou número! Em qualquer país, a adulteração de símbolo oficial, ainda mais a bandeira, não se precisa nem vetar... mas o que significa um pavilhão a governos atolados em negociatas?
* Discurso de posse de Deodoro da Fonseca  Concidadãos – O povo, o exército e a armada nacional, em perfeita comunhão de sentimentos com os nossos concidadãos residentes nas províncias, acabam de decretar a deposição da dinastia imperial e conseqüentemente a extinção do sistema monárquico representativo.
Como resultado imediato desta revolução nacional, de caráter essencialmente patriótico, acaba de ser instituído um governo provisório, cuja principal missão é garantir, com a ordem pública, a liberdade e os direitos dos cidadãos.
Para comporem esse governo, enquanto a nação soberana, pelos seus órgãos competentes, não proceder à escolha do governo definitivo, foram nomeados pelo chefe do poder executivo da nação os cidadãos abaixo assinados.
Concidadãos – O governo provisório, simples agente temporário da soberania nacional, é o governo da paz, da liberdade, da fraternidade e da ordem.
No uso das atribuições e faculdades extraordinárias de que se acha investido para a defesa da integridade da pátria e da ordem pública, o governo provisório, por todos os meios a seu alcance, permite e garante a todos os habitantes do Brasil, nacionais e estrangeiros, a segurança da vida e da propriedade, o respeito aos direitos individuais e políticos, salvas, quanto a estes, as limitações exigidas pelo bem da pátria e pela legitima defesa do governo proclamado pelo povo, pelo exercito, pela armada nacional.
Concidadãos – As funções da justiça ordinária, bem como as funções da administração civil e militar, continuarão a ser exercidas pelos órgãos até aqui existentes, com relação ao ato na plenitude dos seus efeitos; com relação às pessoas, respeitadas as vantagens e os direitos adquiridos por cada funcionário.
Fica, porém, abolida, desde já, a vitaliciedade do senado e bem assim abolido o conselho de estado. Fica dissolvida a câmara dos deputados.
Concidadãos – O governo provisório reconhece e acata todos os compromissos nacionais contraídos durante o regime anterior, os tratados subsistentes com as potencias estrangeiras, a dívida pública externa e interna, os contratos vigentes e mais obrigações legalmente estatuídas.
Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, chefe do governo provisório.
Fonte: BONFIM, João Bosco Bezerra. Palavra de Presidente - Discursos de Posse de Deodoro a Lula. Brasília: LGE Editora, 2004.

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