quinta-feira, 28 de agosto de 2008

O desenvolvimento de Keynes no Brasil - I


É incrível o que Keynes pensou. Ele foi muito mais do que um economista. O que ele escreveu é muito mais relevante para a Economia do que tudo que fizeram depois Antônio Delfim Netto
As grandes nações não são jamais arruinadas pela prodigalidade e mau emprego dos capitais privados, embora, às vezes, o sejam pelos públicos. Na maior parte dos países, a totalidade ou a quase totalidade das receitas públicas é empregada na manutenção de indivíduos não produtivos [...] Toda essa gente, dado que nada produz, tem de ser mantida pelo produto do trabalho de outros homens. SMITH, Adam, Inquérito Sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações vol.I, 1999: 599.
O mundo da guerra
Se um E.T. por aqui aportasse, avisaria que era só esperar um pouco - os terráqueos mutuamente se liquidariam, e eles poderiam tomar a Terra de graça. Enquanto se deflagrava a I Guerra, questão arrastada desde Napoleão, a U.R.S.S. mostrava ao mundo que Marx tinha razão. Operários do mundo todo ameaçavam se reunir. Vizinhos da Alaska se apavoraram, e não menos os europeus. Keynes sugeriu que era possível elidir a pretensão usando, apenas, da esperteza: bastaria acabar com o padrão ouro. Com isso, os países poderiam “fabricar” dinheiro à vontade, propiciando, dessarte, farta distribuição às ameaçadoras classes proletárias. A Grande Depressão foi provocada para mandar o pudor às favas, em troca da salvação geral. A primeira tentativa em alemão fracassara, mas a Itália de Mussolini já provava ser possível a artimanha:
“O medo atingiria o povo e a liderança seria entregue àqueles que oferecessem uma saída fácil, a qualquer preço. A época estava madura para a solução fascista." (Polanyi, p. 275)
Diante dos abutres comunistas, nada melhor do que um espantalho. Roosevelt não titubeou, e assim se instalou, nos EUA e alhures, o fascismo político e o keynesianismo econômico que o sustentava. Os nazi-fascistas tiveram o fim conhecido, os americanos a sorte de seus despojos, mas por aqui a perfídia se estenderia, assim envenenando a Economia e de resto a sociedade brasileira a conta-gotas.
A introdução de Keynes no Brasil

O keynesianismo prático é uma planta nova que não pode ser transplantada para o solo estrangeiro, pois nele morreria e se tornaria venenosa antes de morrer. Joseph Schumpeter
Embora muito distante dos megalomaníacos da moda 30 - Mussolini, Hitler, Stálin, Roosevelt, Salazar, Franco etc., - também no Brasil o Estado passou a ser visto, usado e difundido como único instrumento capaz de proporcionar o progresso econômico, o motor do desenvolvimento, ao tempo em que brecava as terríveis ambições marxistas. Assim é que simultaneamente entramos no joguinho torpe, uma chicana não só política, mas artística, onde a ideologia encobria a sangria:
“Estão todos lembrados que foi sobretudo logo após a Revolução de 1930 que se exarcebou a crítica aos bacharéis em direito, como se eles, com seu amor ou apego aos sistemas normativos, constituíssem um empecilho ao despertar da nacionalidade.” (Reale, Miguel, Pluralismo e Liberdade, p. 271.)
"Getúlio Vargas, líder da Revolução de 1930, é apoiado por políticos reformistas e liberais [?] e inspirado na doutrina keynesiana. Na realidade, o desenrolar de seu governo não representou ruptura com o passado, mas reacomodação de interesses." (Mascarenhas, E., p. 51)
A “política”, bem “disfarçada” na ciência expressa pelos padrões exclusivos da maquinaria financeira do Estado, dispensava conceitos éticos, a “vã filosofia”, e o Direito Natural. O poleiro mais alto estava reservado aos passistas-economistas: "Como grupo profissional, chegam a rivalizar-se com os advogados. O papel mais destacado que representam é uma das características mais marcantes dessa nossa época de intervencionismo." (Bilhão: 138)
O gado foi orden(h)ado pelos bretes positivistas, cobertos por emissão à vontade:
Reverberações keynesianas rondavam Vargas. É o getulismo, tornado claro e plenamente delineado ao longo do Estado Novo, uma assimilação do New DealEstado Novo, Vargas tão logo tomou posse tratou de criar o Min. Trabalho e de propor leis trabalhistas. A Lindolfo Collor competiu comandar as ditas leis trabalhistas, antecedendo, deste modo, em dois anos, as políticas trabalhistas do New Deal. O Estado desenvolvimentista latino-americano, na sua versão getulista e brasileira, seria isto: um keynesianismo antropofágico, assumido ou por contágio. Um Welfare State verde amarelo, industrializador e autoritário, talhado em Pau Brasil. (Mascarenhas, E., p. 51.)
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A legislação social, a reorganização sindical de 1931, a criação dos Tribunais de Trabalho e Juntas de Conciliação, a representação classista, a liberdade sindical episódica de 1934, os conselhos técnicos setoriais e de assessoria governamental, a Carta de 37, a reorganização sindical de 1939, a Lei do Enquadramento Sindical de 1940, e, finalmente a Consolidação das Leis do Trabalho, documentam a institucionalização de um modelo de relações entre Estado e sociedade conduzidas vertical e hierárquicamente pelo Estado, conforme regras por ele estabelecidas.
(
Oliveira, Jaime A. de Araújo e Teixeira, Sônia M. Fleury, p. 110.)
A manutenção da perfídia
A desordem monetária, produzida pelas intrépidas teses keynesianas, teve como conseqüências a inflação, a desorganização institucional, a diminuição real do lucro e, por conseguinte, o empobrecimento dos assalariados. O investimento social, concebido como uma partilha autoritária da riqueza no nível microeconômico ou como programa estatal financiado com emissões monetárias, só provoca a depressão social. Neste caso, a raposa no galinheiro não é o empresário, mas o Estado, que depena as galinhas sem misericórdia.
(Mendoza, Plinio Apuleyo, Montaner, Carlos Alberto, Llosa, Alvaro Vargas, p. 128)
O totalitarismo político-jurídico perdeu seu apelo em 1945, mas a praga econômica varou o EspaçoTempo, acentuando a intensidade com o retorno do caudilho, e seus sucessores:
Também merece menção o fato de Keynes ter sido um dos maiores responsáveis, na conferência de Bretton Woods em 1944, pela criação do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional. O papel desempenhado por essas instituições - especialmente pelo Banco Mundial - no processo de estatização da economia brasileira, em particular, e latino-americana, em geral, ainda não foi devidamente reconhecido. Com efeito, o enorme volume de financiamentos concedidos pelo Banco Mundial às empresas estatais contribuiu decisivamente para a expansão dessas empresas e, conseqüentemente, para agravar os resultados negativos decorrentes do fato de setores importantes e básicos da economia nacional serem inteiramente controlados e dependentes da ação governamental
Colletc Writings of J. M. Keynes, XVI, Activities, p. 313 a 334, cit. Johnson, P., p. 22.
Ufanava-se o ex-presidente Café Filho (Coleção Nosso Século, 1945/60: 200): Antes da minha investidura o Tesouro emitira, só num mês, 3 bilhões e 200 milhões de cruzeiros, devendo-se isto principalmente a crise de exportação do café. Nos dois primeiros meses de meu governo, a média de emissões foi de 1 bilhão de cruzeiros."
Para Lucas Lopes, (P. 219) ocupante do Ministério da Fazenda de Juscelino e pai do ex-Presidente do Banco Central do Brasil, Francisco Lopes, vulgo Chicolopes, este algemado na frente das câmeras de TV ao término de sessão investigativa do Congresso Nacional, tudo isso era desprezível: "Os políticos brasileiros não acreditavam em inflação, acreditavam em obras bem feitas. Pouco se incomodavam se essas obras resultavam ou não de um processo inflacionário, de emissão de recursos."
Ele .foi contando:


Seguramente Juscelino era um político que complementava Vargas na sua formação. Vargas era um homem de espírito social, que dava a prioridade ao problema político e social, enquanto Juscelino era mais um formulador e executor de programas de desenvolvimento. Mas Juscelino dava todo o apoio à política social de Vargas no sentido de dar maior participação ao trabalhador, de criar mais empregos.
O ex-Ministro nos assombra (p. 114) por ter se valido da mesma falsa modéstia, desta confissão do gurú McNamara:
Eu não tinha a menor idéia de planejamento econômico no estilo moderno, implicando decisões macroeconômicas e monetárias. O planejamento no período em que trabalhei como planejador era o planejamento do Roosevelt, do Lillienthal, planejamento de obras e construções
Dessa absurda e irresponsável maneira é que Keynes permaneceu na ribalta:
Inspirados por essas certezas keynesianas, desenvolvimentistas e social-democráticas - já amplamente consensuais - Estados Unidos, Itália, Espanha, França e Inglaterra, além de vários países latino-americanos, entre os quais o Brasil, apertaram o gatilho e dispararam políticas desenvolvimentistas, trabalhistas e sociais. (Mascarenhas: 130)
Nos anos 60 o keynesianismo foi universalizado, 'alcançou seu potencial', num sentido duplo: o uso da política fiscal para equilibrar as economias foi estendido à França, Itália, Alemanha e, em menor escala, ao Japão; e essa política tornou-se mais ativa e ambiciosa à medida que renascia o receio de recessão. De modo geral, enquanto o interesse dos primeiros keynesianos se concentrava em garantir o pleno uso dos recursos existentes, os keynesianos dos anos 1960 procuraram garantir o pleno uso dos recursos potenciais - i.e., o crescimento da capacidade produtiva da economia, com o objetivo de conter a inflação de custos e satisfazer as 'exigências' sociais, cada vez maiores, sentidas pela economia. O que David Marquand (1988) chamou de fase democrática social do keynesianismo, está associado a uma guinada política para a esquerda e o uso sério, pela primeira vez, da política fiscal, deslocando-se a ênfase na demanda do setor privado para o público. O orçamento tornou-se, simultaneamente, uma peça da administração da demanda, do crescimento e da previdência social. A partir dos anos 60 a participação dos gastos públicos no PIB começou a subir em toda a parte (Skidelsky: 136).
COMPLEMENTE:

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