quinta-feira, 4 de setembro de 2008

O desenvolvimento de Keynes no Brasil - II

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Estado Poder inverte a ordem dos fatores. Para ele, sua força é que confere liberdade e prosperidade aos cidadãos. Seu princípio prioritário é a autoridade. Ávido de tudo reger, sequioso de tudo regular, absorve e centraliza um número sempre crescente de atividades. Apoiando-se num aparelho tecno-burocrático,dirige, comanda, ordena. Sem ouvir, nem informar-se. Distante, com relação ao Parlamento e aos organismos intermediários; cheio de suspeitas diante das associações e das coletividades locais, e a arrogância no poder. O Estado-Poder mantém a Nação sob tutela. Para fazer a felicidade dos cidadãos a despeito deles, senão contra eles. Roger-Gérard Schwartzenberg¹
Do fã-clube internacional de executivos e intelectuais seguidores do Maquiavel da Economia toma parte nosso renomado mestre caseiro Celso Furtado, economista, catedrático e ex-Ministro de vários setores.O professor foi taxativo ao apontar as principais crises do Brasil : “são a financeira e a social.”(2)  S.Exa. colheu o ensejo para reverenciar (!?) a inflação: “Ela desenvolveu grande parte do país” (3). Não deixa de estabelecer outra verdade o Vip (4) brasileiro: a inflação realmente desenvolveu parte do país, especialmente a dos especuladores financeiros e seus associados políticos. Nas noites que antecediam as maxidesvalorizações, volumosas negociatas eram encetadas lá pelo Sol Nascente. Eduardo Mascarenhas confirma a predileção:
Inspirados por essas certezas keynesianas, desenvolvimentistas e social-democráticas - já amplamente consensuais - Estados Unidos, Itália, Espanha, França e Inglaterra, além de vários países latino-americanos, entre os quais o Brasil, apertaram o gatilho e dispararam políticas desenvolvimentistas, trabalhistas e sociais. (5)
No mercado americano o Brasil comprava café (?!) em grandes quantidades e completava o ciclo da corrupção. Tal “política” levou ao esgotamento das reservas cambiais. Providenciou-se, então, um rápido e “pequeno” empréstimo de 160 milhões de dólares, dos quais metade para pagamento das dívidas com os credores daquele mesmo país. A trapaça, naquele tempo, já era comum; e muito fácil. O agricultor, de credor passava a devedor.
O gatilho cobria o esbulho com tal naturalidade que governantes vinham a público dizer que o cometiam, mas não muito, só de vez em quando, como se dependesse da intensidade e extensão do delito a sua tipificação e conseqüente graduação penal. Exemplos pioneiros? Getúlio Vargas e seu sucessor, Café Filho. Ufana-se o último:
“Antes da minha investidura o Tesouro emitira, só num mês, 3 bilhões e 200 milhões de cruzeiros, devendo-se isto principalmente a crise de exportação do café. Nos dois primeiros meses de meu governo, a média de emissões foi de 1 bilhão de cruzeiros.” (6)
Para Lucas Lopes, Ministro da Fazenda de Juscelino*, isso era desprezível: “Os políticos brasileiros não acreditavam em inflação, acreditavam em obras bem feitas. Pouco se incomodavam se essas obras resultavam ou não de um processo inflacionário, de emissão de recursos”. (7)  Lopes foi contando:
Seguramente Juscelino era um político que complementava Vargas na sua formação. Vargas era um homem de espírito social, que dava a prioridade ao problema político e social, enquanto Juscelino era mais um formulador e executor de programas de desenvolvimento. Mas Juscelino dava todo o apoio à política social de Vargas no sentido de dar maior participação ao trabalhador, de criar mais empregos. (8)
O ex-ministro assombra-nos:
Eu não tinha a menor idéia de planejamento econômico no estilo moderno, implicando decisões macroeconômicas e monetárias. O planejamento no período em que trabalhei como planejador era o planejamento do Roosevelt, do Lillienthal, planejamento de obras e construções. (9)
Que coragem! Planejar como gastar, que excelente profissão. Mas donde tirar recursos ou como incrementar a produção, isso não era o mais importante para o Ministro da Fazenda do Brasil!
O importante era um Programa, um plano de metas, obras, investimentos. De acordo com Keynes, não havia nem necessidade de serem investimentos produtivos. O absurdo só é menor do que o acatamento da estupidez:
Qualquer gasto é preferível a nenhum gasto. Abra buracos e os tape de novo.
Ou pinte a Floresta Negra. Se não puder pagar aos indivíduos um salário para
que façam alguma coisa de útil, pague-lhes para que façam algo de idiota.
Gastando-se assim a poupança, elevam-se os salários, o que aumenta o
consumo que, por sua vez, aumenta a produção de bens e serviços.
(KEYNES, J.M., cit. MISES,
Ludwig von, As Seis Lições, p. 527)
Tudo poderia ser coberto através de movimentação monetarista, que por sua vez traria o apelidado "retornos crescente". De fato, recaia um "retorno crescente" mas de dívidas à revelia. Istso, todavia, é que não vinha ao caso. Importava o imediato, a conquista e a manutenção do poder, no maquiavelismo justificante:
Por uma ironia da história, o democrata Juscelino teve sua eleição garantida por força de um 'contragolpe' militar, empossado em pleno estado de sítio, debelando rebeliões de oficiais da Aeronáutica no início e no fim de seu mandato. O exército desempenhou papel importante na política do Governo. E os militares executivos ascendiam aos cargos civis, formando com o Cap. Lúcio Meira, o Gen Ernesto Dorneles, o Gen Amauri Kruel, o Gen. Magessi Pereira, Brig. Guedes Muniz na legendária FNM, Brig. Henrique Fleiuss, Gen. Ernesto Geisel no CNP, Cel. Jarbas Passarinho na Petrobrás da Amazônia, Gen. Macedo Soares, Gen. Ururai Magalhães, Gen. Viana, Gen. Justino Alves, Cel. Edmundo Macedo Soares em Volta Redonda, Cel. Alberto Bittencourt nos Correios, etc. O Programa de Metas não impedia o atendimento prioritário das reivindicações militares por equipamentos e maiores salários, chegando ao cúmulo da compra do 'Minas Gerais' o famoso porta-aviões de segunda mão. 'Com o porta-aviões deixarei de ser inimigo da Marinha e ao mesmo tempo serei esquecido pelos partidários do Brigadeiro (Eduardo Gomes) que, de outra maneira, não me deixarão governar'. (10)
O Programa havia sido cumprido; mas além dos "partidários do Brigadeiro", o povo e o FMI estavam descontentes. O economista professor Eugênio Gudin também:
“A política de restrição de crédito seguida pelo Sistema de Reserva Federal foi duplamente infeliz, pois era diametralmente oposta ao objetivo da estabilidade internacional e de necessidade duvidosa a nossa economia doméstica.” (11)
A moeda não mais refletia a produção; apenas a especulação. Cheques-sem-fundo em profusão:
Durante 5 anos emiti 134 milhões de cruzeiros novos. Mas façamos um cálculo, para se compreender melhor a extensão dessas emissões. Naquela época, o Brasil tinha 60 milhões de habitantes. Isto quer dizer que toda aquela pletora de desenvolvimento representou, na realidade, o sacrifício de dois cruzeiros novos, em 5 anos, para cada brasileiro. Ou, reduzindo-se o prazo para maior realismo a simbologia numérica: o sacrifício foi de apenas 40 centavos anuais para cada habitante. Alguém seria capaz de fazê-lo por menos dinheiro? (12)
A questão não era só financeira, mas também filosófica, de princípio: precisava fazê-lo?
Fosse quanto fosse, precisava sacrificar 60 milhões de pessoas na época, que somadas até hoje ultrapassa o bihão de pessoas atingidas por causa do mísero capricho, subjetivo ideal?
Brasília foi construída, e um grande lago também; nele mergulham os patos, nossos irmãos.
* * *

Juscelino Kubitschek de Oliveira

primeiro foi Deputado Federal em 1934, na vigência do esquema fascista. Depois, foi constituinte de 1946,Prefeito de Belo Horizonte, Governador de Minas Gerais. Pela aliança PTB-PSD, partidos filhotes do Getúlio Vargas, (pai dos pobres e mãe dos ricos), Juscelino foi eleito Presidente da República em outubro de 1955, com 36% dos votos. O lançamento da candidatura do fascista Plínio Salgado lhe garantiu a vitória, por este enfraquecer, dividir os votos dos adversários. Jânio Quadros*, com o distintivo da Vassoura, o sucedeu, em 1961.Acusado e processado por corrupção, JK, o Pé-de-Valsa, teve os direitos políticos cassados em 1964.

JK, O Amigo da Onça?
Os diretores da revista O Cruzeiro queriam criar um personagem fixo e já tinham até o nome, adaptado de uma famosa anedota. (www.arcadovelho.com.br)
Em 15 de dezembro de 1959, JK criou a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, Sudene, para integrar a região ao mercado nacional, esta mesma pela qual Jader Barbalho enriqueceu, e por isso foi encerrada, de modo que seus arquivos sumiram. Por conta disso e após a sucessão de escândalos denunciados pela imprensa, especialmente a partir de 1999, Fernando Henrique Cardoso tratou de extingui-lo. Afinal, já estava por demais sobrecarregado com uma infinidade de deslizes, somados às maracutaias do SIVAN, PROER, privatizações, maxidesvalorizações, e a famosa compra de votos no Congresso, para alterar a Constituição em benefício pessoal, no ano anterior. Em maio de 1960, um mês após a inauguração de Brasília, Juscelino fez com que o Brasil obtivesse do FMI um empréstimo de 47,7 milhões de dólares para financiar o seu plano industrial — sobretudo, a indústria automobilística em São Paulo.

Os críticos de Juscelino Kubitschek frisam o fato de ele ter priorizado o transporte rodoviário em detrimento do ferroviário devido à indústria automobilística, o que teria causado prejuízos ou isolamento a certas cidades. A opção pelas rodovias é considerada por muitos danosa aos interesses do país, que seria melhor servido por uma rede ferroviária.


De fato, a expansão do crédito e as constantes emissões de moeda - para manter os investimentos estatais e pagar os empréstimos externos - provocaram crescimento da inflação e queda no valor dos salários. Em 1960, a inflação estava a 25% ao ano, subiu para 43% em 1961, para 55% em 1962 e chegou a 81% em 1963.

"A dívida externa aumentou 1,5 bilhão de dólares, chegando ao todo a 3,8 bilhões de dólares. Foi ainda agravada pelas altas remessas de lucros das empresas estrangeiras de "capital associado" e pelo consequente aumento do déficit na balança de pagamentos."
"O mandato de Juscelino Kubitschek terminou com crescimento da inflação, aumento da concentração de renda e arrocho salarial. Ocorreram várias manifestações populares, com greves na zona rural e nos centros industriais."

JK também foi acusado diversas vezes de corrupção. As acusações vinham desde os tempos em que ele era governador, e se intensificaram no período em que ele foi presidente. As denúncias se multiplicaram por conta da construção de Brasília: havia sérios indícios de superfaturamento das obras e favorecimento de empreiteiros ligados ao grupo político de Juscelino, além do fato de apenas a Panair do Brasil fazer transporte de pessoas e materiais. Na época, a imprensa chegou a dizer que JK teria a sétima maior fortuna do mundo, o que nunca foi provado. Durante a campanha de sucessão presidencial, as denúncias de corrupção contra JK foram amplamente exploradas pelo candidato Jânio Quadros, que prometia "varrer a corrupção" do governo de JK.
E Juscelino foi morar na Vieira Souto, em Ipanema, Rio de Janeiro, metro quadrado mais caro do país.

A conversa era a respeito das faladas grandes fortunas de certos políticos. E o môço (vinte e poucos anos, função técnica numa autarquia, rapaz sério), disse com convicção, na defesa do ex-Presidente:
- Mas êle não tinha precisão de roubar para ficar rico! Só a companhia X, sua protegida especial durante o govêrno, deu-lhe de presente 40% das ações!
Rachel de Queiroz,
O Cruzeiro - 18 de julho de 1964
-
Agora, porém, que os nossos amigos estão tomando conta deste País saqueado (a expressão é do Presidente da República) e tratam de reerguer o que virou ruína, e tentam recuperar o que não caiu por terra, e se empregam a caçar os facínoras fugitivos, e iniciam o processo dos grandes criminosos. (idem,
4 de julho de 1964)
Com a palavra, o ex-Presidente:
- Considera que a inflação pode ser utilizada como instrumento de progresso?
- Os técnicos informam que o desenvolvimento econômico se faz com a importação de capitais estrangeiros ou com sacrifício de um povo. Êsse último foi o caminho seguido, por exemplo, pels Estados Unidos. Sacrifício provisório, representado pelos ônus que recaem sôbre todos que anseiam por viver uma nação mais rica e mais livre.
(O que não é verdade. Além do surto inflacionário
(A introdução de Keynes no Brasil), o Presidente Bossa Nova contraiu o vultoso empréstimo junto ao FMI, legando ao seu amado povo, logo chamado matéria-prima, uma dívida bilionária.)
Depois de exercer a Presidência, modificou-se sua maneira de encarar o povo brasileiro?
- Para melhor. A matéria-prima é formidável. Com ela pode-se fazer um grande país.
O sacrifício foi mesmo monumental, e boa parte dele foi jogado no mar, na esdrúxula aquisição de um porta-aviões:
De que vale afirmar que êle, o Brucutu dos verdes mares de Iracema ou da sede permanente na Guanabara (quanto mais tempo ficar parado, melhor), passará a ter número nas listas telefônicas e será, inevitávelmente, um prolongamento da Ilha das Cobras?
1 milhão e 625 mil toneladas de trigo.
- 8.660 caminhões nacionais.
- 13.000 km de estradas de rodagem.
- 30 meses de salários de tôdas as professôras do Brasil.
- 52 milhões de sacos de cimento.
- Duas usinas siderúrgicas com a produção anual de 120 mil toneladas de lingotes.
- Duplicar os investimentos da Petrobrás.
- Aumentar em 70% todo o patrimônio do parque ferroviário brasileiro.

- 12 estaleiros idênticos ao japonês que está sendo montado aqui.
- Valor idêntico a todos os empréstimos fornecidos às estradas de ferro pelo BNDE de 1953 a 1957.
- Manter a Universidade do Brasil durante 10 anos.
- Importar 80 mil toneladas de papel de imprensa.
- Adquirir 2.600.000 toneladas de fertilizantes.
- Importar 29 mil tratores para agricultura.
- Construir outra Brasília.

(David Nasser, O Cruzeiro - 31 de outubro de 1959 )
Féliz hc gostava da comparação. Suspendeu a importação de veículos por microempresas, sob o argumento de que o Brasil não tinha dinheiro para importar carros. Então abriu o parque para diversas montadoras virem se aventurar por aqui. Até elas começarem a produzir, os investidores do ramo automobilístico da campanha do p$db se lavaram de vender suas bugigangas, além de firmarem milionários contratos de fornecimento exclusivo à frota oficial por isso renovada.
Não obstante, Féliz adquiriu um moderno substituto daquele Brucutú dos verde mares de Iracema. O valor dessa transa jamais foi revelado, sequer perguntado. Por mais equipado, mais moderno, e muito maior, o São Paulo deve te custado o dobro do que o Minas Gerais, isso se não foi dação em pagamento pela Copa do Mundo, entregue Delivery ao fornecedor J. Chirac.
Não estaria O Amigo da Onça ora de cabelos brancos, e ondulados, porque sem brilhantina?

Aprecie o complemento:
O desenvolvimento de Keynes no Brasil - I
________
Notas
*
Jânio renunciou no mesmo ano, para voltar glorioso à vida publica muito tempo depois:
Em 1985 elegeu-se prefeito de São Paulo pelo mesmo partido, derrotando o candidato situacionista senador Fernando Henrique Cardoso (PMDB) e o representante das esquerdas, deputado federal Eduardo Suplicy (PT). A vitória de Jânio Quadros contrariou os prognósticos dos institutos de pesquisa e contradisse as avaliações segundo as quais o ex-presidente era tido como um nome "ultrapassado" no novo contexto da política brasileira emergente do processo de redemocratização e da campanha das Diretas Já. Fernando Henrique Cardoso, que era o favorito nas pesquisas, chegou a tirar uma foto, que foi publicada pela Revista Veja, sentado na cadeira de prefeito de São Paulo. O que levou Jãnio, a tomar posse com um tubo de inseticida nas mãos, declarando: "Estou desinfetando a poltrona porque nádegas indevidas a usaram" [11]. (Wikipédia)

1. O Estado Espetáculo, p. 320
2. O Estado de São Paulo, 5/6/1994, Agenda 95, p. 2.
3. Idem, ibidem.
4. Very Importand People, formador de opinião, personalidade muito importante.
5. Mascarenhas, Eduardo, p. 130.
6. Café Filho, Coleção Nosso Século, 1945/60, p. 200.
7. Lopes, Lucas, Memórias do Desenvolvimento, p.219
8. Idem, p. 147.
9. Idem,. p. 114.
10. Juscelino Kubischeck, Coleção Nosso Século, 1945/60, p. 204.
11. Gudin, Eugênio, cit. Peringer, Alfredo Marcolin, p. 126..
12. Juscelino Kubischeck, Coleção Nosso Século, 1945/60, p. 204.

Um comentário:

  1. Muito bom este blogue, visita e comenta no meu.

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    um abraço

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