quinta-feira, 18 de setembro de 2008

O dano do venezuelano


O Príncipe lesará somente aqueles dos quais tomará
as terras e as casas para dá-las aos novos habitantes;

e aqueles, os lesados, que representam
uma ínfima
parte de seu Estado,
achando-se dispersos e desvalidos,
jamais contra ele poderão conspirar.
Machiavelli, Nicoló, De principatu civile, p. 59.

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À raça humana o poder assume incontáveis designações, mas elas se reúnem num delta.

Assim é que ao nascermos o choro é a primeira manifestação, e o sorriso, a segunda.
Para vir o leite, basta um som estridente; ao carinho, uma bela carinha.
Nos primeiros passos aumentam as possibilidades de manipulação dos objetos.

O homem vai crescendo, e com ele, seus poderes.
O ponto máximo se concentra no exercício sobre tudo, e isso inclui a todos dominar.
Na rota evolutiva fulguram três preponderantes vetores. O primeiro, é animalesco, calcado na força bruta; o segundo, astuto, à sombra da riqueza; e o terceiro provém do conhecimento, mas nem por isso, ou quiçá até por isso, é constantemente desvirtuado, ou fraudado.
A meta suprema, o desafio do alcance exige que desprezemos avaliar os meios para alcançá-la. O poeta sublima:
"Tudo vale a pena quando a alma não é pequena."
Essa dimensão, porém,
per se é relativa, ainda mais se tratando de tão vaga abstração. Não são poucos os que se julgam à altura de se valer de dubiedades ou prepotências, desde que atinja o ideal compatível com a megalomania que sói lhes acompanhar.
O curioso é que quanto mais poder logra a humanidade, ou melhor, esses condutores, mais se precipitam atrocidades.
Quando as três preponderantes estratégias se concentram, assistimos as tragédias.

Em função dessa ameaça, constantemente tornada real, é que os modernos sistemas políticos criaram instrumentos para refreá-la.
Quando os três poderes se enfeixam em um, eis o tobogã adequado à bestialidade. A maior vantagem da democracia é torná-los de modo disperso, no fito de não serem suscetíveis ao deleite de um jockey. Não obstante, se caso algum aventureiro o logre, ela ainda enseja que nos livremos da maldição, sem necessidade de se recorrer a heróis. Não tem sido o caso, todavia.
* * *
Reparo nas escaramuças latinoamericanas. Como sempre, nenhuma é ideológica, não apresentam o menor embrião filosófico, mas todas oferecem a força primária. Nas venezuelana, boliviana e chilena há o remanescente das minas, e na argentina, a pujança do pampa. Porém, felizmente ou não, esses arroubos não contemplam a aplicação do conhecimento. É a truculência o elemento primordial; e o saque, o objeto. Ela é exercida em primeiro plano no caráter doméstico, no despojar dos filhos, mas tende a se estender além-fronteiras, porque não há criminoso que sacie sua sede, senão na morte.
Por que a subida ao poder é trivial sobre um povo atônito, disperso e semialfabetizado, o incauto prescinde de prudência, bastando-lhe satisfazer seus ímpetos. Se o conhecimento lhe fosse primordial ele saberia que seus arcaicos métodos já não fazem mais sentido: o caminho dessa estrada só oferece melancólico destino. É que Maquiavel, o diretor do sádico roteiro, programou-o sem variação, reservando um final execrável, de preferência trágico, aos seus astros principais, justamente para seu próprio deleite, e o da platéia, que, afinal de contas, é a que vem lhe garantindo o sucesso secular da bilheteria.
Se houver alguma dúvida, basta reprisar os preto-e-brancos dos Bórgia, dos napo leões, Bismarck, Lenin, Mussolini, Hitler, Salazar, de nosso nanico macaquito, e de seu seguidor, O Amigo da Onça.
Muitos aventureiros encetam a fatídica viagem ofuscado pelo brilho do ouro; porém não são poucos os que, depois de ocorrido o mais funesto, são taxados debilóides. De fato, isso sói acontecer. Alguém que tenha sofrido uma humilhação pode se por de Napoleão, com vistas a angariar maior respeito. O comum nesses casos é a vizinhança não compartilhar da posição, e dessa maneira o valente termina encarcerado.
Contudo, se em vez afirmar sua própria grandeza ele a propugne pela nação, ou agora até mesmo pelo continente, pode virar seu maior líder, mesmo que para um estrangeiro tal retórica seja digna de hospício. É o que nos deparamos, amiúde, nas cercanias.
* * *
Entusiasmado com as descobertas de jazidas de petróleo nas camadas pré-sal, Lula pretende usar a monumental estrutura da P-53 para lançar as bases de um projeto de poder. Lula, que desembarcou à 0h25min desta madrugada em Pelotas, ambiciona um governo que perdure além de seus dois mandatos. O combustível dessa hegemonia, raciocina o presidente, será o ouro negro que irá jorrar do fundo mar.
Zero Hora, 18/9/2008
A Venezuela, em que pese a exuberante localização, e seu belo povo, nunca foi além do diminutivo que lhe consagra. No fim do XIX a plêiade militar colheu a onda que assolava toda a América do Sul, fato que liquidou o regime federativo. Desde então houve o recrudescimento ditatorial, mas de modo mais drástico quando o mundo começou a valorizar o petróleo. Apenas na chegada dos anos sessenta aquele povo pode experimentar um regime civilizado, ainda assim por escasso período, como podemos constatar. Desde 1999 país mantém uma democracia para inglês ver. A caricatura é facilmente corrompível, mercê de um cast legislativo com dez dúzias de atores, em regime unicameral. São estes que designam o corpo do Poder Judiciário, de modo que os juízes devem fidelidade aos padrinhos. O inglês vê, se apavora, denuncia, e por isso é expulso:
O relatório da Human Rights Watch (HRW), divulgado em 18/9/2008 apresenta um balanço dos 10 anos de gestão de Hugo Chávez. Ele afirma que o governo "debilitou as instituições democráticas e as garantias de direitos humanos" neste período. Existe uma ausência de controle judicial, o que tem sido aproveitado por Chávez para aplicar políticas discriminatórias que limitam o exercício da liberdade de expressão dos jornalistas, da liberdade sindical dos trabalhadores e da capacidade da sociedade civil de promover os direitos humanos", disse José Miguel Vivanco, diretor da HRW, durante a apresentação do informe.
O Ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Nicolas Maduro por safadeza ou imaturidade, ou ambos, entendeu que essas notícias violam a Constituição do país, não os fatos, e expulsou o emissário para junto do embaixador americano, também recentemente banido. O jardim homenageia outro tipo de gente:
Uma praça de Caracas foi reservada em homenagem a Manuel Marulanda, líder e fundador das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) morto há seis meses. Um busto de guerrilheiro, obra de um artista dominicano, ornamenta a praça que foi construída em apenas duas semanas, localizados no bairro periférico 23 de Enero, bastião histórico da esquerda venezuelana e, há dez anos, do governo liderado pelo presidente Hugo Chávez.
(BBC/Br, 26/8/2008)
O partido que dá sustentação ao embuste foi criado há apenas dois anos. Na certidão consta "Socialista Unificado", mas trata-se de um travesti fascista, cuja lista de adesões importa na impressionante marca de cinco milhões de eleitores. O fenômeno acusa a farsa: o arranjo mal saiu do engatinhar.
O País apenas pro forma se encontra retalhado. Compõe-lhe vinte e três estados, porém calados. Todos seguem a cartilha central. A caserna toma alta percentagem dos frutos do trabalho e do capital das delimitadas nove regiões.
A Venezuela se anuncia República Bolivariana. Faze alusão ao reverenciado líder das independências, o que de certo modo é um alívio pela exclusão daquele outro que andava por aí, escoltando Fidel nos assaltos aos bancos centrais caribenhos, " mas sem perder a ternura", vê se pode!
Nada disso teria assim tanta importância para nosotros, macaquitos brasileños, até porque enquanto nós estamos voltados à África, nossos vizinhos miram a América do Norte; e em vez de samba, eles preferem as rumbas. E de esporte, são adeptos do baseball, uma prática meio militarizada, bem diversa do nossa lúdica paixão.
O mais grave, contudo, não é a disparidade dos costumes populares, uma vez que são as tradicionais diferenciações que perfazem o mosaico humano, tampouco o nefasto e devastador regime que lhes tem sobre seus queixos, mas a exportação dessa tecnologia para os países aqui de baixo, cujos governantes obtém na mediocridade o esteio para desfilarem garbosos sobre os pescoços das suas respectivas nações.
* * *
Ao ampliarmos o foco para o desdobramento político internacional, sobressaem-se duas fulgurantes curiosidades. Nos momentos em que se espraiaram os regimes totalitaristas, em nenhum deles, em algum momento, seus detentores evidenciaram qualquer temor do povo que esmagavam; mas nas democracias, sempre houve receio do clamor popular. Todavia, o que vemos? Um alto-coturno com verniz democrático, armado até os dentes, e com muito dinheiro extraído das riquezas de seu povo, a espalhar a corrupção e a safadeza nos lugares mais miseráveis, mas também em outros campos, porém dominados igualmente por miseráveis.
Hugo Chávez aprendeu a comandar milícias; e leva a gente no chicote, e se ri, e se jacta, e humilha, e divulga tudo isso como uma grande vantagem. Los macaquitos o seguem unânimes, na reedição da formatação do Eixo, desta feita uma jamanta com vários eixos, apta a transportar vultoso roubo. A designação de patrício já não se remete aos nacionais, mas aos colegas internacionais, novos e mais poderosos parceiros.*
Os governantes da América do Sul estão de fato inovando: colocam em risco suas pervertidas democracias, porque em nossa época a verdade vem na pole-position; mas ainda assim, não temem o povo: estabilizam-lhes a união dos exércitos e artimanhas.
Se por acaso seu próprio povo almejar desbancá-lo, ele poderá contar com milícias estrangeiras para se impor. Maior traição não pode haver, mas o que significa moralidade nesses países completamente tomados pela corrupção?
A participação supranacional é de fato inovadora:
Dois bombardeiros russos deixaram nesta quinta-feira a Venezuela de volta à Rússia. Os modelos supersônicos Tu-160 estavam realizando testes nas águas do Caribe a partir da Base Aérea El Libertador. O Tu-160 é capaz de carregar 12 mísseis de cruzeiro com ogivas nucleares ou convencionais e 40 toneladas de bombas.
(Folha de São Paulo, 18/9/2008)

A Rússia ofereceu US$ 1 bilhão para o governo da Venezuela comprar armas de companhias bélicas russas. O anúncio foi feito pouco antes do encontro desta sexta-feira entre os presidentes Hugo Chávez e Dmitri Medvedev na cidade de Orenburgo, perto da fronteira com o Cazaquistão, no último dia de visita do presidente venezuelano à Rússia.
Desde 2005, a Venezuela já negociou mais de US$ 4,4 bilhões com a Rússia na compra de jatos, helicópteros e 100 mil rifles Kalashnikov.
(Idem, 26/9/2008


O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, afirmou, em entrevista exibida pela rede de televisão russa Vesti 24, que a América Latina precisa estreitar laços com a Rússia para reduzir a influência norte-americana e manter a paz na região. A entrevista foi ao ar no momento em que uma esquadra da marinha russa estava prestes a sair em direção à Venezuela.

(Estadão, 21/9/2008)
Gracinha. Como se o velho blefe ainda pudesse ser convincente. Pois se juntarem todos os países da América Latina, e tantos quantos mais quiserem, não tem arsenal, nem tecnologia, nem nada que possas enfrentar o gigante. É só blefe, mesmo, cachorro latindo. O que não será inédito, com certeza, a não ser que se quebre um tabú secular, é o fim dessa peça. Acelerar-lhe-á a velocidade dos novos ventos:
Lester Thurow se utiliza desta imagem potente para invocar cinco forças econômicas que, como afirma, moldam o nosso mundo material, seja ele econômico, seja político. Para ele, essas cinco forças são: o fim do comunismo; mudanças tecnológicas para uma era dominada pela inteligência humana; uma demografia inédita e revolucionária; uma era multipolar que desconhece qualquer tipo de dominância econômica, política, ou militar por qualquer nação.
(Raimar Richers, prefácio de Thurow: 7)
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* Em 30 de setemrbo de 2008, reuniram-se no meio do mato os titulares das nações latinoamericanas. Precisamente Manaus sediou o encontro ultrareservado. Lula almoçou com Chávez e com os presidentes da Bolívia, Evo Morales, e do Equador, Rafael Correa. Por certo nenhum interesse de suas nações estava em jogo, além dos pessoais. É uma barbaridade ao que estamos submetidos. Não há como nada acabar bem. Nem para nós, muito menos para os atores de Maquiavel.
* Passados apenas quatro dias, assim se retribuiu a engalanada recepção:
"O presidente do Equador, Rafael Correa, ameaçou neste sábado, 4, nacionalizar um campo da Petrobras se a empresa brasileira não acelerar a renegociação de seu contrato. 'Cuidado! Se demorar demais, nacionalizo esse campo e eles (Petrobras) vão embora do país', pressionou Correa durante o seu programa no rádio. 'Aqui, ou se cumprem as exigências do país ou se vão', avisou.
(Estadão)
O contrato vem desde a gestão do ultrasuspeito FHC. Só podia!

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