segunda-feira, 3 de março de 2008

O Momento da Destruição Criativa

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A companheirada apostólica positivista não teve a oportunidade de tomar ciência do Princípio da Incerteza; muito menos lograram supor a desordem instalada na física quânticam,  Edge of Chaos. Eles não alcançaram 1944, tempo no qual o austríaco Erwin Schröding constatava as evoluções espontâneas pela biologia molecular, por isso os perdoamos.

Entre eles, nenhum supôs que o determinismo estaria “excluído do Universo na escala eletrônica”, onde equações não são tão exatas e não se consegue assinalar o movimento de um corpúsculo, senão por probabilidades. Eles não imaginaram, ou não se interessaram em observar, que hierarquias rígidas e burocráticas são estéreis à criatividade. Não tinham consciência de que qualquer evolução, seja das estrelas, das formas biológicas ou da própria consciência é fruto, justamente, de uma “desordenada” ação na diversidade, assim explicada por Koestler:
Observa-se uma formação, de âmbito universal, para o desenvolvimento espontâneo de estados de maior heterogeneidade e complexidade. A evolução passa da unidade para a diversidade, criando a ordem da desordem, ideando pautas onde antes não existiam. Este princípio criador onipresente é tão fundamental para a vida como seu antagônico, a segunda lei da termodinâmica, o era para a matéria inanimada. Princípio segundo o qual tudo é tão necessário à parte como esta o é para o todo, numa recíproca interação. (1)
Nos jazigos, eles não puderam receber a nova lição:
Economistas redescobrem o trabalho de Joseph Schumpeter, que falou da 'destruição criativa' como necessária ao progresso. Numa tempestade de tomadas de controle acionário, alienação de bens, reorganizações, falências, deslanches, joint ventures e reorganizações internas, toda a economia está adquirindo uma nova estrutura que é anos-luz mais diversa, ágil e complexa do que a antiga economia das chaminés. (2)
O que se torna intolerável é permanecermos na perfídia. O vento vem doutro lado. Mudemos a posição das velas. Ouçamos o tempestivo conselho de Ilya Prigogine: “Ao lado da mecânica clássica simbolizada pelas leis, pelo determinismo, devemos nos tornar capazes de entender o aleatório”. (3)Verifiquemos, ao fim, a confirmação do fim da era do comando centralizado, ditatorial, hierárquico, ordenado, como queriam os estrategistas positivistas:
“As cidades hoje não são mais que redes, terminais de linha de metrô, auto-estradas, lugares onde o espaço é amplamente abstrato. A proliferação das imagens à distância leva ao desaparecimento de qualquer centralização.” (4)O Cavalo de Tróia não engana mais:
Entre nós, o sintoma mais típico e persistente desse atraso é a confusa expectativa de que há uma espécie de 'força superior', o 'Estado', capaz de distribuir a todos os bens desejáveis deste mundo: emprego, salários altos, bem- estar - em suma - 'felicidade geral da nação'. Qualquer jornal que se pegue ao acaso revelará, enxertadas, notas de fundo populista, 'progressista' e nacional-corporativista que não mudaram nestes 30 anos passados, exceto que agora a encarnação do Satã a ser exorcizada não e mais o 'neocolonialismo' e sim o 'neo-liberalismo'. Só quando o público impuser ao Estado um profundo respeito pelos contribuintes e quando as fantasias de onipotência da burocracia forem contidas (e punidas) é que alcançaremos afinal o liberalismo. (5)
* * *
Vivemos a era da comunicação digital e do pensamento analógico. A linearidade, a cronologia, a obediência tornam-se insignificantes diante da vertiginosa seqüência de imagens virtuais:
Surge um grave perigo quando esse hábito de manipulação com base em leis matemáticas é estendido ao nosso trato com seres humanos, uma vez que estes, diferentemente do cabo telefônico, são suscetíveis de felicidade e infortúnio, de desejo e aversão. Seria, portanto, lamentável que se permitisse que hábitos mentais apropriados e corretos para o trato com mecanismos materiais dominassem os esforços do administrador no plano da construção social. (6)
Felizmente não são poucos os que reconhecem, até se penitenciam. Sir James Lightill foi dos mais célebres:
Hoje em dia todos nós estamos profundamente cônscios de que o entusiasmo que nossos precursores tinham em relação aos feitos maravilhosos da mecânica newtoniana levou-os a fazer generalizações nesta área de previsibilidade, na qual de modo geral talvez tenhamos tendido a acreditar, antes de 1960, mas que hoje reconhecemos que era falsa. Queremos nos desculpar coletivamente por haver confundido o público instruído em geral, fazendo-os acreditar em idéias sobre o determinismo de sistemas que satisfazem as leis de movimento de Newton, as quais, a partir de 1960, foi provado serem incorretas. (7)
O mundo foi e ainda deve ser muito governado pelos mortos, pelo sobrenatural, até pela fusão EspaçoTempo, pela simultaneidade dos eventos constatados a partir da Teoria da Relatividade, mas Einstein chegou a aconselhar que os estudos sociológicos se abstivessem de “criar a obsessão do passado.” (8) Recordemos o também admirável Thomas Paine:
A vaidade e a presunção de governar além da sepultura é a mais ridícula e insolente de todas as tiranias. Cada geração é, e deve ser, competente em todos os propósitos que as circunstâncias exigirem. São os vivos e não os mortos, que devem ser obrigados. As circunstâncias do mundo estão continuamente mudando e as opiniões dos homens também mudam. Como o governo é para os vivos e não para os mortos, apenas os vivos tem algum direito sobre ele. O que pode ser pensado certo numa situação é achado inconveniente noutra. Em tais casos, quem decide, os vivos ou os mortos? (9)
É tempo, pois, do mundo voltar a ser pensado e usufruído por quem nele permanece. Os mortos tiveram sua vez, quando vivos. Muitos aproveitaram para se auto-aniquilarem. Hoje é clara a existência e a variabilidade das relações. O conhecimento só pode ser acessado por aproximação. O cientificismo positivista corre por trilho obsoleto, vulgar e prejudicial, utilizado apenas por saudosista desvairado, príncipe ou educador perdido no tempo. Sua árvore genealógica informa: é filho do conhecimento empírico-determinista-cartesiano-newtoniano, tio-avô do nazi-fascismo. Sua vida pregressa deveria ser o bastante para conservá-lo junto aos cadáveres que outrora lhes desenharam as asas. A “física social”, flagrada com a luz da mesma ciência exata que lhe deu carona, nada mais é do que incomensurável engodo, impingido à ignorante gente por forte condicionamento filosófico e tecno-social, espremido goela abaixo por governos e pedagogos, generais e sentinelas do tal “cientificismo”. Sua trajetória, porém, foi definitivamente abalada. O míssil acionado por Einstein, de passagem, arrancou o capuz que escondia o artificialismo. Com ele encerramos essas duras críticas:
Não me agrada absolutamente a tendência 'positivista' ora em moda (modishe), de apego ao observável. Considero trivial dizer que, no âmbito das magnitudes atômicas, são impossíveis predições com qualquer grau desejado de precisão e penso que a teoria não pode ser fabricada a partir de resultados de observação, mas há que ser inventada. (10)
Se com objetos predições são inviáveis, que dirá com gente.
Temos muito o que inventar e fazer. Mais ainda, o que desmanchar e varrer.

da moderna Economia

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Notas
1. Koestler, Arthur, cit. Goytisolo, Juan Vallet de, p. 73.
2. Schumpeter, Joseph, cit. Toffler, Alvin e Toffler, Heidi, p. 74.
3. Prigogine, Ilya e Stengers, Isabelle, cits. Descamps, Christian, p. 105.
4. Baudrillard, Jean, Simulacro e Real, cit. idem, p. 65.
5. Campos, Senador Roberto, Do Estado gendarme ao Estado babá. - Zero Hora, Porto Alegre, 19/11/1997, p. 24.
6. Russel, Bertrand, cit. Fadiman, Clifton org., p. 266.
7. Cit. Coveney, Peter e Highfield, Roger, p. 242.
8. Einstein, Albert, cit. Pais, Abraham, Einstein viveu aqui, p. 270.
9. Paine, Thomas, Os Direitos do Homem, p. 34 e seguinte.
10. Einstein, Albert, cit. Popper, Karl, A Lógica da Pesquisa Científica, p. 52
5.

2 comentários:

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