sexta-feira, 7 de março de 2008

A miséria do Capital

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Proudhom zombava dessa distinção entre capital e trabalho. Ele acreditava que capital e trabalho não são dois tipos diferentes de riqueza; que toda a riqueza sofre um processo contínuo, passando de capital a trabalho e de trabalho a capital, ininterruptamente e que as mesmas leis de justiça que regulam a posse de um, deveriam regular a posse de outro.  (1) -
ELIMINAR A MOEDA pelo convincente método de repartição forçada das coisas - imprescindível via de acesso à engenharia econômico-sociológica marxista - exige, de plano, que o disparate só se imponha pelas lutas de classe, lutas fratricidas porque praticadas no interior das comunidades.
Condenando o comércio - uma atividade que sempre aproximou todos os povos - “porque movimentava a sociedade pelo dinheiro”, Marx e Engels formularam os arrazoados visando reconduzir a humanidade através de direção totalmente oposta ao dia-a-dia sócio-econômico, o que ele chamou de "história", incitando à revolta com aquilo que lhe serviu para angariar a legião de seguidores: a denúncia da nova escravidão - mais sutil - do poder econômico, do capital, da fábrica, sobre as pessoas. Como se o capital não fosse obra dos homens, e sua constituição não fosse proveniente do próprio trabalho.
Sofisma maior não conheço, mas até seria compreensível - naquela época ninguém conhecia tal termo: a primeira vez que apareceu a palavra Kapitalist foi justamente em 1848, no Manifesto Comunista.
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Marx & Hobbes
Ao girar apenas pelo eixo econômico, designando-o leito a sua operação, embora contraposto a Hobbes pela ruptura histórica, coisa que não era admitida pelo pai do Levithan, Marx projetou a técnica que propiciou o mais completo domínio do Estado, maior ainda do que aquele proposto pelo medroso inglês, sobrepujando todas maquinações, fossem as de Maquiavel, de Comte, Rousseau ou Hegel, mas a apregoada universalidade só seria possível pela aceitação, via convencimento geral, jamais pela força e isso ele deveria saber; mas ele também sabia, de antemão, que sua ciência era furada. Só à força bruta poderia ser impingida. Assim o foi.
O quartel-general, embora identificasse as classes sociais como um mal a ser dizimado, segundo orientação do patrono, segregou as “classes”, protegeu algumas, quanto mais não seja a classe (ou a falta de classe) dos seus líderes, a inteligentzia, a nomenklatura, corrupções hermeticamente operadas pelo grupelho.
O Estado capitalista, dito poder da minoria sobre a maioria, mudado para o Estado Bolchevista, soube erguer a notável ditadura invertendo o executor: em nome da maioria, a minoria “burguesa” foi aniquilada; e a “maioria", fácil conjecturar, fez-se em petit comitè, gang oficializada, a Glasnost. E sob o jugo da impessoalidade estatal, portanto da irresponsabilidade, o povo sofreu o flagelo inapelável. Os escravos-cidadãos soviéticos, poloneses, chineses, cubanos, húngaros, iugoslavos, africanos etc. experimentaram e muitos ainda sentem o amargor da criminalidade oficial. Foi essa indução ao completo domínio do Estado sobre o indivíduo que tanto desagradou Proudhom: a simples troca do senhor dono dos escravos para o Estado dono dos escravos faria o proletário ainda mais oprimido, sem ninguém a quem recorrer. Em carta de resposta a Marx, o francês, mais liberal do que nunca, foi incisivo e até mais profético que o candidato a libertador dos oprimidos:
Procuremos juntos, se o quiserdes, as leis da sociedade, mas por Deus, depois de havermos demolido todos os dogmatismos a priori, não pensemos por nossa vez em doutrinar o povo não nos tornemos chefes de uma nova intolerância, não nos estabeleçamos apóstolos de uma nova religião, seja embora a religião da lógica, da razão. (2)
O prognóstico marxista de um desenvolvimento sócio-econômico predeterminado tampouco logrou tapear Gurvitch:
[Marx] deveria reconhecer que as relações entre os degraus ou as camadas da realidade social que distinguira, também elas eram totalmente variáveis e que sua hierarquia, enquanto forças dinâmicas da mudança, se alterava sem cessar conforme os tipos de sociedade. Somente assim teria evitado a cilada do 'determinismo econômico' no qual finalmente caiu.” (3)
Complementa o competente autor:
As sociedades globais atuais compõem-se duma pluralidade quase infinita de agrupamentos particulares: famílias, comunas, municipalidades, departamentos, regiões, serviços públicos, Estados, seitas, congregações, ordens religiosas, conventos, paróquias, igrejas, sindicatos, operários e patronais com suas federações e confederações, cooperativas de consumo, de venda, de produção, sindicatos de iniciativa, caixas de segurança social, classes sociais, profissões, produtores, consumidores, usuários, partidos políticos, sociedades científicas e de auxílio, equipes esportivas e de turismo e assim ao infinito.Todos esses grupos se entrecruzam e se limitam, se unem e se opõem, se organizam e permanecem inorganizados, ora formam blocos maciços, ora se dispersam. A trama da vida social sob o aspecto macrossociológico não é menos complexa que sob o aspecto microssociológico, permanecendo caracterizada por um pluralismo inextricável. (4)
Marx & Comte
O “cientificismo social”, seja positivista ou socialista, coloca o povo a serviço do sistema de poder e controle. Ambos guardam a mesma razão:
“Há uma coincidência entre Comte e Marx, pois aquele via na sociologia e na política positiva o coroamento sintético de todo o edifício da ciência positiva.” (5)
Roszac também percebeu os liames e as semelhanças:
“Marx é veiculo da inflexibilidade da realpolitik do século XIX, misturada com a sinistra insensibilidade do darwinismo social e com um insolente ateísmo positivista.” (6)
Há quem o ponha direto na oficina do fascismo, como Pereira:
A mecânica social marxista obedece a mesma estrutura lógica da mecânica fascista, ambos tomam os homens como peões num tabuleiro de xadrez, peões que podem não só ser sacrificados, como também ter seu sacrifício 'racionalmente' defendido e justificado. (7)
Marx & Bacon
Marx agravou o erro de muitos, entre os quais o do “pai do materialismo inglês” (8) - o fim do pensamento e o começo da ação, a operação de domínio e modificação forçada da natureza. O companheiro Marx aprovou a originalidade baconiana, ampliada a possibilidade da translação dessa magnífica ciência ao campo social, a partir da dialética de Hegel. Numa das Teses sobre Feuerbach propôs:
“Os filósofos tem se limitado a interpretar o mundo de maneiras diversas; trata-se de transformá-lo.” (9)
E completou:
“O ser que já iniciou a apropriação da natureza por meio do trabalho de suas mãos, do intelecto e da fantasia, jamais deixará de fazê-lo e, após cada conquista, vislumbra já seu próximo passo.” (10) O próximo passo é para trás, impulso de coice.
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Marx, Galileu & Newton
O leitmotiv marxista, nítido e pretensamente viável, requer a quebra da tradição em todas as formas, notadamente as manifestações patrióticas. Mister o conseqüente torpedeamento da história, para daí se efetivarem as alterações patrimoniais. A ótica é nublada. William Henry Chamberlin lhe arrasa:
O método do materialismo histórico de Marx não consegue explicar as óbvias diferenças entre povos que se encontram na mesma fase de desenvolvimento econômico. Não toma em consideração fatores vitais como a raça, a religião e a nacionalidade. Não leva em conta a imensa importância da personalidade humana. É duvidoso que um único acontecimento histórico possa ser corretamente interpretado de acordo com essa teoria. (11)
A égide exata chegava ao cúmulo filosófico, insensatez materialista extremada, analogia do relógio dado corda:
“O socialismo científico abordou a sociedade da mesma forma que Newton abordou o comportamento dos corpos celestes, investigando suas imutáveis 'leis de movimento'. (12)
A dimensão é dogmática, limitada, determinista porque mecanicista, por tudo parcial e preconceituosa. Tenta vislumbrar, pelo viés sócio-político, o código matemático absoluto, pretensão que fez tantos naufragarem no mar das ilusões.
Tal qual Galileu, Descartes, Bacon, Copérnico e Newton, Marx examinou equivocados princípios às “matemáticas” conclusões. Na tela, a medida exata do capital representado pelo dinheiro e pelos contados bens materiais:
Marx, enquanto materialista, enquanto alguém que advoga que toda a realidade e matéria, porém não apenas isto, que toda a realidade e matéria obedece a leis que são absolutamente determinadas não apenas é materialista, como também determinista, isto é, crê ser possível compreender a realidade de tal forma que, uma vez descoberta suas leis, poderíamos antecipar seu futuro desenvolvimento e O Capital tem a pretensão de ser a obra que descreve o desenvolvimento das leis econômicas da sociedade moderna. (13)
O pseudo modernismo científico poderia ter durado apenas meio século. Se E=Mc2, o marxismo é desprovido, a priori, de objeto. Sua produção foi, no mínimo, negligente com inúmeras outras importantes peculiaridades da vida Por Deepak Chopra percebe-se que a montagem de Marx é que é “ideológica”:
Sintetizando, posso dizer que a conclusão fundamental dos estudiosos do campo quântico é que a matéria-prima do mundo não é material, as coisas essenciais do universo são não-coisas. Toda a nossa tecnologia baseia-se nesse fato, que faz cair pode terra a atual superstição do materialismo. (14)-
O abandono do "Livro Maldito"
Complementariedade não é o mesmo que dialética. Talvez por isso Marx tenha desistido de completar O Capital, depois de dezessete anos de trabalho, fato de incomensurável importância, praticamente desconhecido:
“Joachim Reig (Introdução à tradução espanhola de E. von Bohm Bawerk sobre a teoria da exploração de Marx , 1976) afirma que Marx, depois de tomar conhecimento das obras de Jevons e Menger, abandonou O Capital." (15)
O Primeiro-Ministro da Espanha, Felipe Gonzalez, comunga da idéia:
“Hoje, vivo e pensador inteligente, Karl Marx não seria marxista. As esquerdas tem de conviver com a realidade de mercado e abandonar o radicalismo”. (16)
Nem hoje, nem quando vivia:
“Talvez por isso Marx tenha declarado, no fim da vida: 'Eu não sou marxista'.” (17)
No início da vida, ele e Engels tratavam O Capital como “livro maldito”. (18)
De fato, Marx o desenvolveu como um “verdadeiro pesadelo”. (19)
Os ingleses se livraram de conhecê-lo ainda por vinte anos, até traduzi-lo. (20)
Como qualificar um trabalho que "nasce maldito" e termina negado pelo próprio autor?
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Notas
1. Cit. Tucker, Benjamin, Socialismo Estatal e Anarquismo, 1888; cit. Woodcock, p. 135.
2. Proudhom, J., cit. Chevallier, Jean Jacques, p. 284.
3. Gurvitch, G., cit. Goldman, Lucien, p. 46.
4. Idem, p. 84.
5. Japiassú, Hilton, Nascimento e Morte das Ciências Humanas, p. 78.
6.. Roszac, Theodore p. 108
7. Pereira, J.C., p. 140
8. Definição de Engels F., Do Socialismo Utópico ao Socialismo Cientifico, p. 8.
9. Na décima-primeira.
10. Marx, Karl, O que Marx Realmente Disse, Teses sobre Feuerbach, p. 22.
11. Marx, Karl, cit. Chamberlin, William Henry, cit. Downs, Robert Bingham, p. 109.
12. Roszac, Theodore, A Contracultura, p. 108.
13. Marx, Karl, cit. Pereira, Julio Cesar R., Epistemologia e Liberalismo - Uma Introdução a Filosofia de Karl R. Popper, p. 134.
14. Chopra, D., Criando Prosperidade-A Consciência da Riqueza no Campo de todas as Possibilidades: 19
15. Hayek, Friedrich August von, Os erros do socialismo - Arrogância Fatal, p. 199.
16. Gonzalez, Felipe, quando de sua visita ao Brasil. - Jornal do Comércio, Porto Alegre/12/1996, p. 2.
17. Henderson, Hazel, cit. cit. Capra, F., Sabedoria Incomum, Conversas com pessoas notáveis, p. 206.
18. Engels, F.; Marx, Karl; cits. Downs, Robert Bingham, p. 100.
19. Idem, ibidem.
20. Idem, p. 101.

2 comentários:

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