sexta-feira, 14 de março de 2008

O desvio do padrão-ouro

O colapso do padrão-ouro internacional foi o elo invisível entre a desintegração da economia mundial na virada do século e a transformação de toda a civilização na década de 1930. Polanyi: 36
TENDO como padrinhos o próprio Marx e o professor Keynes pelo lado da Economia; Augusto Comte, Hans Kelsen (1881-1973; o austríaco morou em Berkeley, Califórnia) e Benito Mussolini pelo lado do Direito, veio ao mundo introduzido pela supressão monetária o robusto filhote de proveta alcunhado New Deal; por completo, New Deal-Fair Deal, (Novo Pacto, Amistoso Pacto; ou um contrato social rousseauniano movido pelo ideal orgânico hegeliano, utopia inoculada no coração americano) a nacionalização de tudo quanto pudesse sê-lo. Os estados foram re unidos, convertidos em apenas um:
"O medo atingira o povo e a liderança seria entregue àqueles que oferecessem uma saída fácil, a qualquer preço. A época estava madura para a
da economia a serviço de um novo sonho americano...a solução fascista." (Polanyi: 275).
Cinco anos antes da quebra, investidores crédulos tomaram freneticamente empréstimo para entrar no mercado, e muitos eram sistematicamente iludidos por Wall Street... No início de 1929 o valor do índice de ações quase dobrou.. À medida que o preço chegava nas alturas, alguns deles em silêncio vendiam suas ações e embolsavam os lucros.
PARKER, S.: 34/44/46
O colapso da Bolsa trouxe a água fervente que desfiguraria a face econômica norteamericana. A retomada do ideal platônico se fazia perfeitamente justificável:
O grande acontecimento dessa crise do liberalismo econômico foi a eleição, em 1932, nos Estados Unidos, de Franklin Delano Roosevelt. Roosevelt, com seu New Deal, propôs uma verdadeira revolução: simplesmente a morte do Estado Liberal. Propunha um Estado inferente, gastador, que investe mais em obras públicas e assistência social do que dispõe em caixa e deixa para cobrir o déficit depois, com o dinheiro a mais que arrecadar numa economia aquecida pelos próprios gastos estatais. (Mascarenhas: 44)
Então Roosevelt, influenciado por Felix Frankfurter, pela Sociedade Socialista Intercongregada e por outros, fabianos e comunistas, maquinou uma revolução que colocou o país na senda que leva ao socialismo e, numa perspectiva mais distante, ao comunismo. Foi, contudo, a emenda do imposto de renda, levado em 1909, no Congresso americano, o início do socialismo. Então, o New Deal não foi uma revolução. Seu programa coletivista tivera antecedentes - recentes - com Herbert Hoover, durante a depressão; mais remotos, no coletivismo de guerra e no planejamento central que governaram os EUA durante a Primeira Guerra Mundial
Rothbard: 41
Sem pudor ou qualquer ética, os sanguessugas do novo Leviathan primeiramente dizimaram o couro da população:
"A grande retração de 1929-33 levou Franklin Delano Roosevelt à Casa Branca e armou o palco para o programa de compra de prata da década de 1930."
(Friedman: 242)

Os corretores haviam acumulado U$906 milhões em lucros, 'apesar da depreessão' isto é, nos anos entre 1928 e 1933. Como o Times astutamente noticiou, o governo havia sido beneficiário de alguns desses lucros... Whitney havia se apropriado do dinheiro da Bolsa, quando era seu presidente, e dos clientes também, inclusive órfãos e viúvas.. A Comissão de Títulos e Câmbios instalada foi entregue a Joseph Kennedy, um doador da campanha de Roosevelt, e dessa forma obteve o posto.
PARKER, S., O crash de 1929: 382/5
Em seguida, as portas de Wall Street foram cerradas. Dentro se dividiram os despojos:

A grande depressão reduziu as poupanças pessoais de US$4,2 bilhões em 1929 a uma descapitalização líquida de US$600 milhões em 1932 e reduziu os ganhos retidos das firmas de negócios de US$16,2 bilhões para menos de um bilhão.
Pipes, 2001: 183
Havia muito mais em jogo, pois, além da burla ideológica:

Os grandes banqueiros e industriais emergiram nessa época. Firmas de Wall Street - como Belmont, Lazard e Morgan - com apenas 15 anos de existência ocupavam lugar de destaque na economia. Os tempos modernos da legislação para as práticas de comércio começaram em 1934.
Gleiser, I.: 211
No mesmo tempo havia uma fuga em massa dos capitais, rumo à Grã-Bretanha e Europa.
"Em 1929, as despesas federais para todos os bens e serviços montavam a 3,5 milhões de dólares; em 1939, eram de 12,5 bilhões." (Galbraith, 1968: 251)
Não fossem os despojos alemães e japoneses, os EUA estariam atolados numa dívida incomensurável, provavelmente um tsunami que levaria a um colapso mundial, ainda mais se somada a onda que hoje aflige o colosso.
.
O embate com Einstein

CONQUANTO NÃO fosse economista, muito menos psicólogo ou vidente, Einstein (1981: 97) não aprovava a teoria keynesiana:
É necessário impedir as flutuações do valor do dinheiro e, para isto, substituir o padrão-ouro por uma equivalência com base em quantidades determinadas de mercadorias, calcadas sobre as necessidades vitais, como, se não me engano, Keynes já propôs há muito tempo. Pelo emprego deste sistema, poder-se-ia conceder uma certa taxa de inflação ao valor do dinheiro, contanto que se considere o Estado capaz de dar um emprego inteligente àquilo que, para ele, representa um verdadeiro presente. As fraquezas de seu projeto se manifestam, em meu entender, na falta de importância concedida aos motivos psicológicos. O capitalismo suscitou os progressos da produção, mas também os do conhecimento, e não por acaso. Sem dúvida sou pessimista demais a respeito das empresas do Estado ou comunidades semelhantes, mas de modo algum creio nelas.
Keynes (cit. Bodanis: 228), sem argumento, preferiu taxar o Grande Relativo de "garoto judeu malcriado, sujo de tinta”.

A presença de Schumpeter
Numa época em que o mecanicismo imperava nas ciências físicas, mas não só nessas, também nas jurídicas e econômicas, o filósofo-economista liberal Joseph Schumpeter propunha o método de desenvolvimento econômico com base nas recém conhecidas teorias da relatividade, do caos e da quântica. Para ele os EUA sairiam fortalecidos se da destruição daquela engenharia econômica calcada no mecanicismo fasciostóide flagrantemente corrupto, eivado de trapaças, houvesse uma nova criação. Mas se ninguém entendia sequer o que Einstein dizia, como identificar a cientificidade de um transplante? A quem interessaria tal "especulação"? Quem sensibilizar-se-ia com um mero e obscuro tcheco?
O estratagema concorrente não tinha o compromisso, mas era infinitamente prático:
O sucesso de Keynes foi tão devastador que a teoria econômica de Schumpeter foi pouco notada em sua época. Durante os anos 20 e 30, Keynes recebeu 200 citações em artigos publicados por outros cientistas, ficando em primeiro lugar. Já Schumpeter, no mesmo período, recebeu somente 22, ficando em 18º na classificação. (Gleiser, I: 171).
O desvio
A genialidade keynesiana foi ironizada pelo colega de Cambridge, ninguém menos do que B. Russell (cit. De Masi, 2001: 94):
A Alemanha e a Áustria repudiaram a totalidade de suas dívidas internas por meio da inflação. A França reduziu o franco a um quinto de seu valor, repudiando dessa forma quatro quintos de toda a dívida pública computada em francos. A libra esterlina hoje não vale mais que três quartos de seu valor original em ouro. Os russos disseram francamente que não pagariam suas dívidas, o que foi considerado um crime: o calote respeitável exige uma certa etiqueta.
Os ingleses perceberam os riscos da manipulação. Exigiram que os meios de pagamento voltassem a ser balizados pelo ouro. Aí foi a vez de Keynes (cit. Skidelsky: 39) protestar:
"Winston Churchill, ministro das Finanças, fez a libra esterlina voltar ao padrão-ouro equivalendo a US$4,86 em 20 de abril de 1925. Ele imediatamente atacou a decisão num panfleto memorável ‘As conseqüências econômicas do Sr. Churchill’."
O ataque de Keynes provinha de outra explícita razão:
"Não me oferecem comida nem bebida – nem consolo intelectual nem espiritual... [o conservadorismo] não leva a lugar." (Skidelsky: 60)
Do outro lado do Atlântico lhe esperava tudo, e muito mais: numa só tacada o ouro de propriedade dos cidadãos seria confiscado, e abolido o padrão; junto, uma maxi desvalorização que enriqueceu apaniguados. A manobra fora projetada pelo Maquiavel da Economia:
"A ‘Carta aberta’ de Keynes a Roosevelt, em 1933, parecia, escreve Herbert Stein, “uma carta de um professor ao pai muito rico de um aluno muito obtuso.” (Skidelsky: 20)
O “pai” entendeu o recado:
A desvalorização, por Roosevelt, do dólar em termos de ouro, em 19 de abril de 1933, eliminou a breve vantagem competitiva britânica. Em 4 de julho de 1933, ele [Keynes] declarava que ‘o presidente Roosevelt está magnificamente certo’, quando Roosevelt arrasou com a Conferência Econômica Mundial de Londres denunciando todos os planos para estabilizar as moedas como ‘fetiches dos ditos banqueiros internacionais’.
(Skidelsky: 116/7)

O Estado de bem-estar era um ardil político: uma criação artificial do Estado, pelo Estado, para o Estado e seus funcionários. É um eco irônico da democracia de Lincoln de, por e para ‘o povo’. Quando seus bem escondidos, porém crescentes, excessos e abusos no governo central e local foram revelados recentemente, havia se passado um século de defesa falaciosa.
Seldon: 60
O destino da locomotiva, e por decorrência, dos vagões, de toda sorte, estava selado:
Mesmo na década de 1940 não faltaram críticas a Keynes, mas os governos gostavam da natureza prática de sua mensagem. Nos Estados Unidos da década de 1930, (o ardil do New Deal) foi uma inspiração acerca daquilo que os governos pareciam estar aptos a fazer para salvar a economia nos casos de depressões profundas.
Ormerod, 1996: 131
  Ao espanto de Schumpeter, Tio Sam fora tapeado. 
A despeito de três grandes reveses - em 1920, 1928 e 1937-8 - Keynes aumentou seu ativo líquido de 16.315 libras em 1919 para 411.238 - equivalentes a 10 milhões de libras em valores atuais - quando morreu.
Skidelski: 35
__________
Nota
1. Mises, L., Uma Crítica ao Intervencionismo: 21


Nenhum comentário:

Postar um comentário