segunda-feira, 7 de abril de 2008

Keynes: um Brasil de audiência

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O Estado Poder inverte a ordem dos fatores. Para ele, sua força é que confere liberdade e prosperidade aos cidadãos. Seu princípio prioritário é a autoridade. Ávido de tudo reger, sequioso de tudo regular, absorve e centraliza um número sempre crescente de atividades. Apoiando-se num aparelho tecno-burocrático, dirige, comanda, ordena. Sem ouvir, nem informar-se. Distante, com relação ao Parlamento e aos organismos intermediários; cheio de suspeitas diante das associações e das coletividades locais, e a arrogância no poder. O Estado-Poder mantém a Nação sob tutela. Para fazer a felicidade dos cidadãos a despeito deles, senão contra eles. Roger-Gérard Schwartzenberg 1

KEYNES se mantém na moda para todo o lado, para cima e para baixo.
Na falta de dinheiro para circulação, aumentam os juros. A razão é pueril: se o acesso ao crédito for civilizado, não haverá recursos disponíveis: as cédulas mais valiosas, as de cor azul, foram ao norte, e nadam combinadas com o azul das Antilhas.

No fim da Sapucai fulgura a Apoteose. Na manipulação financeira também. Depois da estupenda recessão, que nos custa record de desemprego, ora revivemos um new deal, denominado pac. Resta saber se ao cabo, como o original, contaremos com uma guerra monstruosa, para recuperar a Nação com os despojos dos inimigos. Contudo, ainda precisaremos vencê-la. É bom escolher um sparring bem esquálido.
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Escabrosas
Do fã-clube internacional de executivos e intelectuais seguidores do Maquiavel da Economia toma parte nosso renomado mestre caseiro Celso Furtado, economista, catedrático e ex-Ministro de vários setores. Foi taxativo ao apontar as principais crises do Brasil : “são a financeira e a social.”(2)
S.Exa. colheu o ensejo para reverenciar (!?) a inflação: “Ela desenvolveu grande parte do país” (3). Não deixa de estabelecer outra verdade o Vip (4) brasileiro: a inflação realmente desenvolveu parte do país, especialmente a dos especuladores financeiros e seus associados políticos.
Eduardo Mascarenhas confirma a predileção:

Inspirados por essas certezas keynesianas, desenvolvimentistas e social-democráticas - já amplamente consensuais - Estados Unidos, Itália, Espanha, França e Inglaterra, além de vários países latino-americanos, entre os quais o Brasil, apertaram o gatilho e dispararam políticas desenvolvimentistas, trabalhistas e sociais. (5)
No mercado americano o Brasil comprava café (?!) em grandes quantidades e completava o ciclo da corrupção. Tal “política” levou ao esgotamento das reservas cambiais. Providenciou-se, então, um rápido e “pequeno” empréstimo de 160 milhões de dólares, dos quais metade para pagamento das dívidas com os credores daquele mesmo país. A trapaça, naquele tempo, já era comum; e muito fácil. O agricultor, de credor passava a devedor.
O gatilho cobria o esbulho com tal naturalidade que governantes vinham a público dizer que o cometiam, mas não muito, só de vez em quando, como se dependesse da intensidade e extensão do delito a sua tipificação e conseqüente graduação penal. Exemplos pioneiros? Getúlio Vargas e seu sucessor, Café Filho. Ufana-se o último:
“Antes da minha investidura o Tesouro emitira, só num mês, 3 bilhões e 200 milhões de cruzeiros, devendo-se isto principalmente a crise de exportação do café. Nos dois primeiros meses de meu governo, a média de emissões foi de 1 bilhão de cruzeiros.” (6)
Para Lucas Lopes, Ministro da Fazenda de Juscelino, isso era desprezível:
“Os políticos brasileiros não acreditavam em inflação, acreditavam em obras bem feitas. Pouco se incomodavam se essas obras resultavam ou não de um processo inflacionário, de emissão de recursos”. (7)
Lopes foi contando:

Seguramente Juscelino era um político que complementava Vargas na sua formação. Vargas era um homem de espírito social, que dava a prioridade ao problema político e social, enquanto Juscelino era mais um formulador e executor de programas de desenvolvimento. Mas Juscelino dava todo o apoio à política social de Vargas no sentido de dar maior participação ao trabalhador, de criar mais empregos. (8)
O ex-ministro assombra-nos:

Eu não tinha a menor idéia de planejamento econômico no estilo moderno, implicando decisões macroeconômicas e monetárias. O planejamento no período em que trabalhei como planejador era o planejamento do Roosevelt, do Lillienthal, planejamento de obras e construções. (9)
Que coragem! Planejar como gastar, que excelente profissão. Mas donde tirar recursos ou como incrementar a produção, isso não era o mais importante para o Ministro da Fazenda do Brasil!
O importante era um Programa, um plano de metas, obras, investimentos. De acordo com Keynes, não havia necessidade de serem investimentos produtivos. Roosevelt ensinara – bastava gastar. E, de preferência, em armamentos! E o Brasil foi se armando. (Hoje, estamos armados até os dentes, com jatos, submarinos ancorados, muitas corvetas ( em que pese a Nau Capitânea ser um fiasco internacional. Tanques cruzaram a fronteira pelo Chuí, mas nada de invasão – foram importados pelo Brasil. A mais esplêndida importação, todavia, foi adquirida, e esquecida, do pistolereiro Chirac, o homem das sete bombas no Pacífico. Trata-se do esplêndido São Paulo, pobra santo, agora invocado à guerra e à corrupção. Mas a homenagem é para o estado natal do adquirente, como fora à JK. SP veio para fazer frente ao velho Minas Gerais, últimamente ancorado para magníficas festas, organizadas por grandes empresários e a sociedade mais requintada.) Provavelmente ele será útil à festas rave, ou a desfiles de escolas-de-samba em alto-mar, o que seria melhor idéia, até para divulgação de nossos hábitos.
Tudo pode ser coberto através de movimentações econômico-monetaristas. Tudo empresta consistência a conquista e manutenção do poder, no maquiavelismo justificante:

Por uma ironia da história, o democrata Juscelino teve sua eleição garantida por força de um 'contragolpe' militar, empossado em pleno estado de sítio, debelando rebeliões de oficiais da Aeronáutica no início e no fim de seu mandato. O exército desempenhou papel importante na política do Governo. E os militares executivos ascendiam aos cargos civis, formando com o Cap. Lúcio Meira, o Gen Ernesto Dorneles, o Gen Amauri Kruel, o Gen. Magessi Pereira, Brig. Guedes Muniz na legendária FNM, Brig. Henrique Fleiuss, Gen. Ernesto Geisel no CNP, Cel. Jarbas Passarinho na Petrobrás da Amazônia, Gen. Macedo Soares, Gen. Ururai Magalhães, Gen. Viana, Gen. Justino Alves, Cel. Edmundo Macedo Soares em Volta Redonda, Cel. Alberto Bittencourt nos Correios, etc. O Programa de Metas não impedia o atendimento prioritário das reivindicações militares por equipamentos e maiores salários, chegando ao cúmulo da compra do 'Minas Gerais' o famoso porta-aviões de segunda mão. 'Com o porta-aviões deixarei de ser inimigo da Marinha e ao mesmo tempo serei esquecido pelos partidários do Brigadeiro (Eduardo Gomes) que, de outra maneira, não me deixarão governar'.(10)
O Programa havia sido cumprido; mas o povo e o FMI estavam descontentes. O economista professor Eugênio Gudin também:
“A política de restrição de crédito seguida pelo Sistema de Reserva Federal foi duplamente infeliz, pois era diametralmente oposta ao objetivo da estabilidade internacional e de necessidade duvidosa a nossa economia doméstica.” (11)
A melhor saída recaiu em acelerar a máquina de fabricar dinheiro. Juscelino Kubistcheck assim justificou os gastos:

Durante 5 anos emiti 134 milhões de cruzeiros novos. Mas façamos um cálculo, para se compreender melhor a extensão dessas emissões. Naquela época, o Brasil tinha 60 milhões de habitantes. Isto quer dizer que toda aquela pletora de desenvolvimento representou, na realidade, o sacrifício de dois cruzeiros novos, em 5 anos, para cada brasileiro. Ou, reduzindo-se o prazo para maior realismo a simbologia numérica: o sacrifício foi de apenas 40 centavos anuais para cada habitante. Alguém seria capaz de fazê-lo por menos dinheiro? (12)
A questão não era só financeira, mas também filosófica, de princípio: precisava fazê-lo? Fosse quanto fosse, precisava sacrificar 60 milhões de pessoas por causa de um mísero ideal?
Brasília foi construída e um grande lago também; nele mergulham os patos, nossos irmãos.
Pegue o fio-da-meada:
A introdução de Keynes no Brasil
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Notas
1. O Estado Espetáculo, p. 320
2. O Estado de São Paulo, 5/6/1994, Agenda 95, p. 2.
3. Idem, ibidem.
4. Very Importand People, formador de opinião, personalidade muito importante.
5. Mascarenhas, Eduardo, p. 130.
6. Café Filho, Coleção Nosso Século, 1945/60, p. 200.
7. Lopes, Lucas, Memórias do Desenvolvimento, p.219
8. Idem, p. 147.
9. Idem,. p. 114.
10. Juscelino Kubischeck, Coleção Nosso Século, 1945/60, p. 204.
11. Gudin, Eugênio, cit. Peringer, Alfredo Marcolin, p. 126..
12. Juscelino Kubischeck, Coleção Nosso Século, 1945/60, p. 204.


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