segunda-feira, 28 de abril de 2008

A essencialidade da interdisciplinaridade

O homem só muito lentamente descobre como o mundo é infinitamente complicado. Primeiramente ele o imagina totalmente simples, tão superficial como ele próprio.
NIETZSCHE, F., O livro do filosofo: 41
Interdisciplinaridade se realiza como uma forma de ver e sentir o mundo. De estar no mundo. Se formos capazes de perceber, de entender as múltiplas implicações que se realizam, ao analisar um acontecimento, um aspecto da natureza, isto é, o fenômeno dimensão social, natural ou cultural, veremos e entenderemos o mundo de forma holística, em sua rede infinita de relações, em sua complexidade.  Fundação Darcy Ribeiro, www.fundar.org.br
HÁ QUEM SUPONHA preencher a carência com a simples reunião de estudantes ou profissionais de diversas áreas: "Exercer a interdisciplinaridade é tecer um ambiente interativo, onde os participantes estão 'entrelaçados' pelos saberes que são capazes de produzir coletivamente." (www.unimes.br)

Com todo respeito que merece, até pela tentativa, ou pela consciência da parcialidade, tal interpretação faz-se um tanto pueril, ideológica pela dialética. Tratamos das ligações entre as disciplinas, não de participantes. A formulação interdisciplinar requer se observar o nexo causal, o elo de ligação entre os conhecimentos especializados, pouco importando os agentes. No caso da junção dos acadêmicos, o risco é se obter uma nova Babel, onde cada um tem sua língua, e não há nenhuma comum. Eis a definição adequada:
O espaço do interdisciplinar, quer dizer, seu verdadeiro horizonte epistemológico, não pode ser outro senão o campo unitário do conhecimento. Jamais esse espaço poderá ser constituído pela simples adição de todas as especialidades nem tampouco por uma síntese de ordem filosófica dos saberes especializados. (JAPIASSÚ, H., 1976: 74)
-A segmentação

Prescindindo da percepção mais abrangente, o trem epistemológico da Academia tem o shape desenhado para discutível desenvolvimento tecno-estratégico; não suporta, todavia, em nenhuma hipótese, o selo científico:
Nossa Universidade atual forma, pelo mundo afora, uma proporção demasiado grande de especialistas em disciplinas predeterminadas, portanto artificialmente delimitadas, enquanto uma grande parte das atividades sociais, como o próprio desenvolvimento da ciência, exige homens capazes de um ângulo de visão muito mais amplo e, ao mesmo tempo, de um enfoque dos problemas em profundidade, além de novos progressos que transgridam as fronteiras históricas das disciplinas.
(Lichnerowicz; cit. Morin, 2002: 13)
Alfred North Whitehead, (cit. Abbagnano: 69) na longínqua década de 1920, alertava:
A sistematização do conhecimento não pode fazer-se em compartimentos estanques. As verdades gerais condicionam-se umas às outras; e os limites da sua aplicação não podem ser adequadamentes definidos sem a sua correlação numa generalidade mais vasta.
Antecipando-se a Whitehead, J.H. Poincaré (p.89) tinha consciência: "As verdades só são fecundas se forem ligadas umas às outras."  O grande matemático francês ainda  expressou: "A ciência, por outras palavras, é um sistema de relações. Portanto, só nas relações se deve procurar a objectividade: seria inútil procurá-las nos seres considerados isoladamente uns dos outros." (Poincaré, J.H., cit. Abbagnano: 100)
Michel Serres (cit. Descamps: 103) arrola inestimáveis prejuízos acarretados pelo viés acadêmico:
As disciplinas foram fragmentadas e, ao se fazer isto, impediu-se o diálogo e a polêmica intercientífica. A física descobre agora a necessidade de conceber outras operações para melhor perceber a complexidade da matéria. As ciências contemporâneas progridem com a contradição: a partícula se manifesta ora como onda, ora como partícula. A pesquisa de ponta se acha obrigada a reintroduzir o observador na observação. Estes percursos casuais e aleatórios nos remetem a Cristóvão Colombo. Não foi traçando seu destino que ele descobriu a América.
Descobrimos a América, mas tapamos a ciência e sufocamos a sociedade, ao lamento de Werner Heisenberg (cit. Capra: 16.) e Ludwig von Mises (p.112): "A cisão cartesiana penetrou fundo na mente humana nos três séculos após Descartes e levará muito tempo para ser substituída por uma atitude realmente diferente diante do problema da realidade."
"O que ocorreu foi que as premissas tecnocráticas quanto à natureza do homem, da sociedade e da natureza, deformaram-lhe a experiência na fonte, tornando-se assim os pressupostos esquecidos de que se originam o intelecto e o julgamento ético."
Ao especializar o cidadão, a civilização o tornou hermético e satisfeito dentro de sua limitação; mas essa mesma sensação íntima de domínio e valia o levará a querer predominar fora de sua especialidade. E a conseqüência é que, ainda neste caso, que representa um maximum de homem qualificado - especialismo - e, portanto, o mais oposto ao homem-massa, o resultado é que se comportará sem qualificação e como homem-massa em quase todas as esferas da vida  GASSET, Ortega Y, A rebelião das massas: 56
-
O atraso de Einstein
O gênio
(cit. Pais, Abraham, Einstein viveu aqui: 271) apreciava advertir:
Não é suficiente ensinar a um homem uma especialidade. Através dela ele pode tornar-se uma espécie de máquina útil mas não uma personalidade desenvolvida harmoniosamente. A sobrecarga necessariamente leva à superficialidade.
Apesar da privilegiada consciência, o gênio também escorregou pelos labirintos de sua exclusiva disciplina. Pode até parecer pretensão, mas não me preocupa o rótulo, tampouco receio encetar qualquer apreciação mais ousada. Ambas podem ser facilmente corrigidas. À primeira, basta trocar o ângulo de visão. À segunda, apenas uma reavaliação.Por enquanto, não tenho dúvidas. Albert Einstein, depois do estupendo edifício que construiu, não sem antes implodir uma arquitetura secular, simplesmente não evoluiu! Ao contrário, não fosse as insistências de Niels Bohr, Max Planck, e depois de Werner Heisenberg e ainda de Erwin Shörendinger, o Grande Relativo ainda estaria negando o aval científico à Teoria Quântica, devido à incerteza quanto ao percurso do eléctron, pelo prosaico motivo: "Deus não jogava dados." Convencido de que Ele  não vinha ao caso, Einstein tentou, pelo resto da vida, a unificação da Física Quântica com a Relatividade. A civilização perdia a chance de ouro, a melhor cabeça que dispunha para efetuar o grande liame. À despeito do ceticismo quântico, ao cabo Einstein se encarregou de alertar, e de certo modo iniciar o programa atômico que desencadeou nas bombas aos japoneses.
A Quântica nada mais é do que condição e extensão da própria Relatividade. Nestes campos, nada havia para unir. Uma é prolongamento da outra, apenas. O que era mister tentar, e totalmente possível, era a reunificação das ciências outrora chamadas exatas, com as humanas, ou filosóficas. Ambas  se encontram apartadas desde Platão, e confirmadas a partir da ascendência da plêiade mecanicista, através de Copérnico, Galileu, Descartes e Newton, a Bacon, Hobbes, Rousseau, Hegel, Comte, Bentham, Mill, Sorel, Darwin, Marx, Freud e Keynes, apenas para citar alguns mais fulgurantes.
Eis a grande lacuna que poderia ter sido preenchida pelo Grande Relativo, caso ele se dispusesse a debulhar as obras de cunho filosófico, sociológico, econômico, e jurídico que já podia dispor, além das magnitudes de Spinoza e Hume, e da chatice de Kant que tanto lhe atraíram. Compreende-se, todavia. Assim como os vocacionados de modo clássico encontram dificuldades em tabuadas, raros são os pesquisadores matemáticos que se dispõem ao enfadonho (e muitas vezes contraditório) estudo da ciência pelo caminho das letras, tão cheias de entretantos e filigranas, não poucas vezes movidas por interesse exclusivo e imediatista dos seus preceptores. .

A reunificação
Era o que vaticinava John Dewey (p. 205):

Quando a filosofia vier a cooperar com o curso dos acontecimentos e tornar claro e coerente o significado dos pormenores diários, a ciência e a emoção hão de interpenetrar-se, a prática e a imaginação hão de abraçar-se.
O notável epistemólogo Edgar Morin (2002:35) bem sabe donde provém o grande equívoco: "Paradoxalmente, são as ciências humanas que, no momento atual, oferecem a mais fraca contribuição ao estudo da condição humana, precisamente porque estão desligadas, fragmentadas e compartimentadas."
A visão reducionista-mecanicista-materialista cultivou inúmeras dicotomias, cismas, fragmentações, alienações: alienação de si (o vácuo espiritual) e, por conseqüência, dos outros; alienação da natureza (autômatos não podem sentir muito por outros autômatos - se somos apenas máquinas, podemos muito bem nos apoderar do máximo possível, conquistar e explorar a natureza por completo); a dicotomia entre conhecimento e valores, meios e fins, mente e matéria, universo de matéria e universo de vida, entre ciências e humanidades, entre ricos e pobres, industrializados e de Terceiro Mundo, entre gerações presentes e gerações futuras. (Idem: 118)
Não é barato seu preço:

Acredito, e muita gente acredita como eu, que todo o ensino de nível universitário (e se pos­sível de nível inferior) devia consistir em educar e estimular o aluno a utilizar o pensamento crítico. O cientista 'normal', descrito por Kuhn, foi mal ensinado. Foi ensinado com espírito dogmático: é uma vítima da doutrinação. Aprendeu uma técnica que se pode aplicar sem que seja preciso perguntar a razão pela qual pode ser aplicada (sobretudo na mecânica quântica). Em conseqüência disso, tornou- se o que pode ser chamado cientista aplicado, em contraposição ao que eu chamaria cientista puro.(Popper, Karl, A ciência normal e seus perigos. www.consciencia.org)
Urge (pelo menos tentar) reverter:
O trabalho da UNESCO nesse campo identificou muitos problemas capitais [...] Um quarto problema é comum aos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Quase todos atuais programas de formação são setoriais ou disciplinares, e não tratam das complexas interações entre pessoas, formação, meio ambiente e desenvolvimento. Esse é um desafio considerável na formação da próxima geração de cientistas, que precisará ter a penetração interdisciplinar adequada para enfrentar tais problemas.
(Mayer: 137/8.)
Eis uma razão deste blog.

O grave dano social cartesiano

Aprecie, ainda:
A amplitude interdisciplinar
* O gap de Einstein

Um comentário:

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