Mais de dois mil anos já se passaram desde o dia em que Platão ocupava o centro do universo espiritual da Grécia e em que todos os olhares convergiam para a sua Academia, e ainda hoje se continua a definir o caráter da filosofia, seja ela qual for, pela sua relação com aquele filósofo. Todos os séculos da Antiguidade que se seguiram a ele ostentam na sua fisionomia espiritual traços da filosofia platônica (por mais metamorfoseados que estejam), até que por fim o mundo greco-romano se unifica sob a universal religião espiritual do neoplatonismo. A cultura antiga, que a religião cristã assimilou e à qual se uniu para entrar, fundida com ela, na Idade Média, era uma cultura inteiramente baseada no pensamento platônico. É só a partir dela que se pode compreender uma figura como a de Santo Agostinho, que traçou a fronteira histórico-filosófica da concepção medieval do mundo. JAEGER 2003: 581
.Em algum ponto perdido deste universo cujo clarão se estende a inúmeros sistemas solares, houve uma vez um astro sobre o qual animais inteligentes inventaram o conhecimento. Foi o instante da maior mentira e da suprema arrogância da história universal.NIETZSCHE, F.W., cit. MATOS, O., A polifonia da razão, 1997:134.
Há duas décadas fui convidado a elevado colóquio. Na minha primeira intervenção, tentei projetar o Século XX como aquele da suprema insanidade. Péssima idéia..Todos se sentiram atingidos; afinal, nascemos no ciclo. Incontinenti, o seleto grupo enveredou contra minha participação, capitaneado por lírica e afamada escritora gaúcha, Para ela os tempos recém passados não tinham sido assim tão padrastos, e tudo poderia ser assimilável. Tentei reargumentar, mas um alvo de deboche o que pode mais senão sair, de fininho, no máximo ruminando?
Ainda assim, disparei: a gente do XX propiciou memoráveis tragédias, começando já no primeiro lustro, na revolta do Encouraçado Potenkim. A dramática sucessão de episódios foi estupenda: o naufrágio da maior obra de engenharia de todos os tempos, justamente na viagem inaugural; a I Grande Guerra Mundial; a Revolução Bolchevique; a revolução socialista alemã; a década dos gansgters; a ascenção fascista; o crash de 1929; o massacre aos judeus; a revolução civil espanhola; a explosão do dirigível Hindenburg; a proliferação de invasões sobre países africanos e asiáticos; a II Grande Guerra Mundial; a guerra da Coréia; do Vietnã; a violência sobre húngaros e tchecos; dezenas e dezenas de golpes de estado em incontáveis países; o paredón; guerra de Cosovo; do Golfo; da Faixa de Gaza; do Canal de Suez; Chernobyl. É impossível a quem quer que seja dimensionar a quantidade de vítimas ocasionadas diretamente por esses episódios, que dirá outras consequências, inclusive vítimas que sequer ainda nasceram!
Ninguém me deu ouvidos, ao contrário. O que vi foi cara feia. Em hotel cinco estrelas, como falar de coisa triste? Todas as épocas contém prós e contras, e nessa o homem chegara até na lua. O que lhes interessava era discutir, no máximo, sobre temas econômicas; e no mínimo, a ventura da liberdade.
Pois o que expus tinha tudo a ver. Nenhuma daquelas funestas performances foi produto do liberalismo; e ainda é o maior álibi à vingança ambidestra romana: "Das muitas reflexões acerca do colapso do sistema neoliberal, três despontam com claridade." (Frei BOFF, L., O caminho mais curto para o fracasso. - www.adital.com.br, 15/4/2009)
"Em virtude dessa estreita associação entre o poder do Estado e a autoridade religiosa, o catolicismo, em toda a parte em que predominava, opunha-se a liberdade de consciência e as liberdades democráticas, com o apoio do braço secular do poder civil." (GUSDORF: 80)
O sistema neoliberal foi apenas tentado, por menos de década, e solapado, já por mais de três.
O discernimento era oportuno:
E como se desce, desse mundo de ironia e razão e veridicidade, ao reinado do sábio de Platão, cujos poderes mágicos o elevam muito acima dos homens comuns, embora não tão alto que dispense o uso de mentiras ou despreze o triste mercado de cada curandeiro, a venda de feitiços, de encantamento e criadores de raça, em troca de poder sobre seus concidadãos! PEREIRA, J.C., Epistemologia e Liberalismo - Uma Introdução a Filosofia de Karl R. Popper: 153
Todos, disse TODOS aqueles dantescos episódios somente se precipitaram graças à esta visão estereotipada da ciência, da filosofia, educação, cultura, da religião, e da política, o arquétipo de valores, enfim, que se abateu de modo indelével, por isso devastador, sobre o Ocidente. Existe, pois, o Fio-de-Ariadne:
Por sua doutrina da similaridade entre Esparta e o estado perfeito, tornou-se Platão um dos propagandistas de maior sucesso do que eu gostaria de chamar ‘o Grande Mito de Esparta’, o perene e influente mito da supremacia da constituição e do modo de vida espartanos. POPPER, KARL, 1998, T. I: 54
O império romano continua flamante, em coligação com a impostura. O preconceito mantém o caráter social; e por conseguinte, de cada um. Resta saber de que modo subsiste, o grau de incidência, se íntegral, ou parcial. O alerta é de emergência. O choque será brutal.
A civilização oriental, e os indígenas costumam advertir seus filhos: a realização maior do ser humano se encontra na simbiose com a natureza, no usufruto da vida, puro e simples.
A civilização greco-romana foi iludida a buscar felicidade através do poder - sobre a natureza, sobre as coisas, sobre os animais, e, por fim, sobre o próprio homem, o semelhante.
Nós gostamos das delimitações, das classificações, das hierarquias, das identidades claras. O essencial do esforço ocidental é afinal de contas nos traçados de fronteiras. Trata-se sempre, para nós, de esclarecer os contornos de uma idéia, de um objeto, de um projeto, de uma ato. Nós nos esforçamos de estabilizar esses contornos e de operar escolhas. Por exemplo: entre o verdadeiro e o falso, o justo e o injusto, o homem e a natureza, os fiéis e os infiéis. O movimento profundo, na Ásia, é exatamente o contrário: trata-se de apagar as barreiras, as distinções, de dissolver ou de afastar o sujeito fechado, o conceito que resiste, as aparentes contradições que bloqueiam o movimento. Último objetivo: a fusão com o Todo, a inserção imediata em um real fluido e movediço. Chegar a esse estado onde todas as fronteiras param ou se apagam, viver nessa indistinção suprema, tal seria a sabedoria.
www.expressaototal.blogspot.com/2008/01/espiritualidade-asitica.html
Embora a mágica de esporádicos trechos incólumes, nosso retilíneo, desrespeitoso e por tudo grosseiro caminho passou por cima de tudo, abalando todos os sistemas, sejam vegetais, minerais ou animais, e mormente os políticos, jurídicos, econômicos, científicos, filosóficos, sociais e pessoais:
Podemos julgar uma filosofia por seus frutos. A visão reducionista-mecanicista-materialista cultivou inúmeras dicotomias, cismas, fragmentações, alienações: alienação de si (o vácuo espiritual) e, por conseqüência, dos outros; alienação da natureza (autômatos não podem sentir muito por outros autômatos - se somos apenas máquinas, podemos muito bem nos apoderar do máximo possível, conquistar e explorar a natureza por completo); a dicotomia entre conhecimento e valores, meios e fins, mente e matéria, universo de matéria e universo de vida, entre ciências e humanidades, entre ricos e pobres, industrializados e de Terceiro Mundo, entre gerações presentes e gerações futuras.
LEMKOW, A.: 15
Nesta semana de rememoração do infortúnio do Titanic, ocupar-me-ei em delinear a plataforma dessas tantas desventuras: onde foi riscado o fogo do rastilho, sua velocidade, abrangência, onde encontrou microondas, macacos, papagaios e ultimamente outras aves bicudas, prontos a executá-la. De plano, indico: no reexame das teorias e fatos, idéias e formas, para tomar o jargão da perfídia grega, elemento que impulsionou o insensato tour, resplandece o leitmotiv do egoísmo, da mesquinhez, da torpeza e crueldade.
O que estou tentando mostrar é que a ciência, por causa do seu método e de seus conceitos, projetou um universo no qual o domínio da natureza ficou ligado ao domínio do homem e que ela favoreceu esse universo – e esse traço de união tende a tornar-se fatal para esse universo e seu conjunto.
MARCUSE, Herbert, Uma ciência sem domínio?; P. Seuil, 1970; cit. CHRÉTIEN: 212
Precede-lhe o medo introjetado, do trovão e da epidemia, do ladrão e traficante, da extinção da propriedade privada em prol do abstrato coletivo gerado e gerido por um único artífice, invasões e chacinas, guerras frias e quentes, estratégias, ações e reações, provocações e salvações.
Aventuras “ferrocarris-ideológicas” conduzem a humanidade a esse rumo de Marte, digo, da morte, às covas comunitárias, onde jazem empresas e cidadãos, massacres coletivos logrados por convocações tributárias e financeiras realizadas pretensamente na defesa de ideais, mas efetivadas por simples ambição do alheio, vileza camuflada na fé quase religiosa que hábeis condutores bem sabem incutir, no fito de captar seguidores de suas doutrinas de espoliação total... Evidentemente, não podemos julgar o ocidente como réu, para daí submetê-lo a pesada condenação diante dos nefastos desígnios impingidos à grande parcela da humanidade, para não dizer a toda; não. Além de inócuo, antes de tudo temos o dever de tentar compreender motivações e peculiares circunstâncias, até de tempo e lugar, realidade e conhecimentos predominantes.O approach procede uma interpretação gradualmente aproximativa, viajante do próprio fio que o liga; mas, quando perfila as lógicas e razões condicionantes dos movimentos das massas, sobressaem-se os grandes equívocos cometidos por nossos ancestrais, bem como a caducidade de suas incontáveis versões, porém todas com a mesma raiz, por bizarro ainda utilizadas; e o que é pior - até procuradas. A permanência desses pré-fabricados é que se torna indesculpável.
Essa "sociedade" chegou no ápice, ponto de início de seu merecido declínio. Ao compreendermos seu torpes e estéreis motivos, estaremos aptos a ajudar na sua imediata extinção. Chegaremos mais próximos da reorganização e de um reacomodamento natural, paradoxalmente. lançando um cocktail desintegrativo nesse desenrolar pseudocientífico, ferros da direita e da esquerda que compuseram os trilhos à passagem da loco motiva sócio-política. Parando ou rompendo com o determinismo oriundo deste pretérito mecanicista, egoísta e opressor, poderemos alcançar mais rapidamente a readaptação, arejada e transparente, a perfazer um tecido social condigno com a época e as aspirações de cada um de nós. Voltando-nos ao real, por que acontecido, restar-nos-á explicá-lo e abandoná-lo, para tomarmos os tapetes mágicos de nossos próprios sonhos, permitidos e queridos por uma nova ordem (ou desordem), múltiplo anseio de ver e viver o mundo mais harmonicamente integrado e desenvolvido. Estacionado o velho trem, retirada a carga, poderemos optar por pequenas, ágeis, versáteis e ecológicas naves, individuais ou não, mas definitivamente em consonância com a complexidade e leveza cósmica. Nosso EspaçoTempo permite que as urgentes alterações sociais assumam a velocidade propícia. O espectro dos meios de comunicação, ampliados espetacularmente a partir das noções sobre as disponibilidades energéticas, rompe limites, predispondo a simultaneidade e a democracia da informação. Todos podem se integrar no mesmo instante, sem ninguém perder sua personalidade. O efeito é radical. Cada um torna-se elemento multiplicador, sopro direto no velame do nosso habitat espacial. E com o crescente vento pode ser içada, junto ao mastro padrão, a vela mestra constitucional que lhe deva ser peculiar: suficientemente forte para não se rasgar por sofismas; enxuta, para não arrastar a inércia e eficaz para não obstaculizar, considerando sempre e o máximo possível, a relatividade do universo de cada ser, de cada cidadão. Assim são pautadas a Teoria da Relatividade e a Teoria Quântica; destarte prima a Filosofia Liberal. O insight (para nós, exciting...) torna-se facilitado pelo espoucar de incontáveis manifestações, adjacentes em todos quadrantes do mundo, numa (r)evolução espontânea mas imprevisível, por não seguir nenhuma predeterminação; condensada, porque consistente; e geral, porque livre, despido de superstições, e desprovido de discriminações, tão sem preconceitos quanto a luz do dia. Reconhecido e expresso por escritores, cientistas, educadores, místicos, músicos, poetas, intelectuais e administradores voltados a redimensionarem “produção e comércio” (teoria aplicada à prática), o impressionante e crescente movimento evolui equalizado; alastra-se por frutos distintos daqueles gerados às duas grandes árvores que, longe de permitirem sequer a sombra, assombraram o mundo, uma à esquerda e outra à direita, determinismos conceituais que multiplicaram e repartiram as desgraças até a queda do muro. Mais do que nunca, é possível atingir suas subterrâneas e camufladas bases pseudo-científicas, raízes de onde emanaram as ervas daninhas e o podre odor suavizado nas gotas dos seus falsos ideais.
O problema é ao mesmo tempo distinguir os acontecimentos, diferenciar as redes e os níveis a que pertencem e reconstituir os fios que os ligam e que fazem com que se engendrem, uns a partir dos outros.
FOUCAULT, Michel, Microfísica do poder: 5
Diante da enorme gama de informações e ferramental de nossa época, o problema é passatempo. Juntamo-nos às boas novas na expectativa de compartir um usufruto sensitivo de maior proximidade com o paraíso sempre contado, o qual temos a pretensão de vislumbrar sua silhueta, ironicamente, através da mesma aridez científica que outrora o ofuscou. A nova ordem, que parece desordem, brota nem toda expressa por números ou códigos comportamentais (posto que infinitamente mais ampla), mas faz-se também legal e legítima, cientificamente correta e apreciada. Trata-se de uma reversão por convergência, sem dialética, mas por Somalética, uma postura quântica, dialógica pela qual a ética não se fratura:
O novo Individualismo – a serviço do qual, quer queira, quer não, está o socialismo – será a harmonia perfeita. Será o que o Grego buscou, mas não pôde alcançar completamente, a não ser no plano das Idéias, porque tinham escravos, e os alimentava; será o que a Renascença buscou, mas não pôde alcançar completamente, a não ser no plano da Arte, porque tinham escravos e os entregavam à fome. Será completo e, por meio dele, cada homem atingirá a perfeição. O novo Individualismo é o novo Helenismo.
WILDE, O.: 86
À tonalidade das observações, apropriamo-nos das palavras de ALBERT EINSTEIN: “Se, no que se segue, eu vier a expressar minhas idéias um tanto dogmaticamente, será apenas em nome da clareza e da simplicidade.”
Consigno, todavia, a ressalva: diferentemente do gênio, não apresento, de modo direto, novas idéias - a composição é menos escrita por mim, muito mais pelos vultos; mas atirei-me na possibilidade de uni-las. Eis o puzzle, ao gosto de POINCARÉ, FOUCAULT, BACHELARD e MORIN, de quebra em fractais, nesta semana, neste mero blog.
Até amanhã.
O carma ocidental - 1. A razão da religião
________ * Origem no sanscrito. Significa, de certa forma, causa e efeito. O condicionamento do destino. Comumente ela é utilizada no sentido negativo, ou de cobrança, sofrimento. É uma designação muito antiga, vinda dos Vedas, doutrina milhares de anos mais velhas que o judaísmo e o cristianismo. Qualquer situação individual ou mundial provém do encadeamento de causas e condições geradas pelos seres humanos de existência em existência", diz o Dalai-Lama, o mais alto sacerdote do budismo tibetano, no livro Sábias Palavras. (Ed. Bertrand Brasll).
Neste dia de homenagens aos antepassados, em especial àqueles que tivemos o privilégio de compartir alguns momentos, enviamos nossa repórte...
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Conexões Epistemológicas
Matéria sem espírito não tem sentido. Espírito sem matéria não é sentido.
O carma
Até o Renascimento, o Ocidente praticamente desconhecia Platão. Alguns manuscritos gregos, contrabandeados de Constantinopla, mudaram o cenário. Entre eles, levados a Florença em meados de 1430, estava nada mais nada menos do que a obra completa de Platão.
"Apreciei o original que versa sobre os paradigmas das revoluções do século XVIII. Concordo com suas disposições e recomendo à edição." Embaixador Oswaldo de Meira Penna
ReVerSão (1997)
"CESAR RAMOS é para ser lido com calma e atenção. Assim como eu li FRITJOF CAPRA e BERTRAND RUSSELL, por exemplo. É um trabalho fantástico [...] Aprendi muito e me identifiquei muito com ele. Aplaudo sua visão multifacetada, crítica e culta, no melhor sentido. É uma cultura que não precisa se exibir para se mostrar culta. Estudantes brasileiros têm muito a aprender com esta obra. Trabalho de peso e importância e, por isso, está guardado aqui em meu arquivo especial como fonte de referência permanente." CLEMENTE NOBREGA - Físico Nuclear e Consultor Empresarial. Consultor das revistas EXAME e VOCÊ. Autor dos Best-Sellers: Em busca da empresa quântica e Supermentes.
Atrás fica o porto. O vento enfuna as velas. Acolá se estende o tenebroso mar. Meus marinheiros, Companheiros de batalhas e vigílias... Vinde amigos: Inda é tempo de buscar um mundo novo! Albert Einstein
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