sexta-feira, 29 de maio de 2009

O Carma Ocidental - 42. Pastor do pasto-verde


.O reino da França foi um dos raros Estados europeus que se recusaram, de modo obstinado, a reformar-se segundo as exigências do novo espírito iluminista. Houve soberanos esclarecidos nas Alemanhas, Áustria, Rússia, Itália, na própria Espanha e em Portugal, mas não em Versalhes. GUSDORF, GEORGES, As Revoluções da França e da América: 38
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O chefe deve mostrar constantemente o caminho ao povo, que não conhece sua verdadeira vontade; deve fazê-lo ver as coisas como elas são – ou como devem lhe parecer. ROUSSEAU, J. J., Contrato Social, cit. KOSELLECK, R: 142

Como pilotos cujos instrumentos de navegação às vezes falham, os líderes fazem vôos cegos com alarmante freqüência. CLEMENS, JOHN K.: 106
EUGEN WEBER, da UCLA para a nossa TV Senado (17/4/2001),  liquida com a tartufice:
Talvez soe bem, mas na verdade o homem não nasceu livre. Nasceu como uma frágil criança de peito. Sem a proteção dos pais, sem a proteção proporcionada a esses pais pela sociedade, não teria podido sobreviver. Liberdade na sociedade significa que um homem depende tanto dos demais como estes dependem dele.
"Como um meio adequado para a consecução de determinados fins, ensina Platão, é permitido ao governo do Estado ideal servir-se de ‘certas mentiras sadias’.” (KELSEN, 1998: 168)

Rousseau não receia reconhecer que lhe aconteceu mentir e mentir muito, quando estava na sociedade dos seres vivos, mas uma coisa é mentir, negando a verdade e ofendendo a justiça - e a recordação da pobre Marion persegue Rousseau durante cinquenta anos - outra, o prazer da imaginação, que não prejudica ninguém.
CHATÊLET, vol. II: 274
"Rousseau, o primeiro homem moderno, idealista e canalha numa só pessoa; que necessitou de ‘dignidade’ moral para aguentar seu próprio aspecto; doente de vaidade desenfreada e de desmedido autodesprezo." (NIETZSCHE, 2002: 108)
“Mas a admiração pelo legislador - por aquele que, ‘assumindo a iniciativa de fundar uma nação, deve sentir-se capaz de mudar a natureza humana’ chega até Rousseau.” (BOBBIO, N. 1992:56)
Para Rousseau, como para outros edificadores da Cidade Ideal do Racionalismo desarvorado, o legislador é responsável por tudo. É um deus ex-machina. Algo que será como Napoleão, que pretendeu representar o novo César e o novo Augusto do cesarismo imperial francês.
PENNA, O.M. 1997: 366
Evidente per se, são esses maviosos ditames platônicos, erigidos sobre a plataforma do patrício DESCARTES, e elevados desse modo à máxima potência que consagram os descalabros do mundo ocidental:

A filosofia política moderna acha sua primeira forma sistemática em Hobbes; mas seu germe vital está em Maquiavel, de quem Hegel foi - não preciso lembrar - um grande admirador. E uma história que tem no Príncipe sua revelação, no Leviathan seu símbolo e - podemos também acrescentar, na vontade geral de Rousseau sua solução ideal, não podia deixar de ter como conclusão o deus-terreno de Hegel.
Segundo SCHWARTZENBERG (1978: 13) ROUSSEAU acompanha de perto a MAQUIAVEL ao “tolerar” o indivíduo quando extraordinário, mitológico, restrito às duas funções: “legislador”, para fundar o Estado e lhe fornecer suas leis e “ditador” para garantir sua sobrevivência. “Puro Platão, estendido à Maquiavel!"
O homem "capaz de mudar a natureza humana" via no Secretário um “grande republicano obrigado pelos tempos a desdenhar seu amor pela liberdade. Fingia dar lições aos reis, mas educava des grandes aux peuples.”
Para FELLIPO BURZIO (cit. GRAMSCI, A.: 133), a interpretação de ROUSSEAU em vez de justificar moralmente o maquiavelismo, na realidade projeta um “maquiavelismo ao quadrado: o autor do Príncipe não só daria conselhos sobre fraudes mas também com fraudes” à desgraça daqueles que o seguiram!
No “Plano Para a Constituição da Córsega” o genebrino reivindica para o Estado o patrimônio da Nação, tributando à propriedade privada todo infortúnio, motivo pelo qual dever-se-ia extingui-la.
A falsidade do argumento se espatifa no insólito: os ingleses haviam tomado e abandonado a Córsega por duas vezes: dava mais trabalho conservá-la do que dela obter valia. (JOHNSON, 2002: 14)
Nela não havia propriedade, nem privada, nem pública; só impropriedades, mas Rousseau apostava que a ilhota “assombraria a Europa.” De fato, ela assombrou, não por sua constituição, nem pelo diminuto povo, mas por um filho dali fugitivo.
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A Revolução Francesa produzira um impacto galvanizado sobre os vizinhos europeu, desencadeando as idéias utópicas que reinaram soberanas nos séculos XIX e XX." (ZBIGNIEW BRZENSK, A desordem, in Veja 25 anos - Reflexões para o futuro: 67)
A estupidez ainda vara o EspaçoTempo como se fosse luminar. Republicanos tupiniquins adoram os adereços:
Quatorze de Julho - A data de hoje, que a República Brasileira comemora solenemente incluindo-a no seu calendário de festa nacionais, tem alta significação para o espírito de liberdade que domina a civilização contemporânea. Quaisquer que fossem os erros e os excessos que se seguiram a grande conquista de 1789, a histórica já consagra o estupendo legado que a humanidade recebeu dessa grande revolução, - o início da transformação política de todas as nacionalidades modernas, o berço fecundo de onde frutificou a semente generosa de todas as liberdades.
O Estado de São Paulo, ed. de 14/julho/ 1895; republicado em 14/julho/ 1995
Ainda bem que não comemoramos o 17 de outubro, da Bolchevique, descendente direta.
Pois enquanto a Inglaterra partira, há séculos, (desde 1215) às soluções verdadeiramente democráticas; e quando os EUA proporcionavam ao mundo verdadeiras lições de cidadania e civilidade, os franceses e vizinhos, incluindo-se a Rússia e a África, Cuba, China, Alemanha, Itália, Brasil, Espanha, etc., etc, mergulharam no desespero e no desalento, prelúdio dos perversos domínios:
Examinarei, pois, o sistema do mais ilustre desses filósofos, J.J. Rousseau e mostrarei que, transportando para os tempos mais modernos um volume de poder social, de soberania coletiva que pertencia a outros séculos, este gênio sublime, que era animado pelo amor mais puro a liberdade, forneceu, todavia, desastrosos pretextos a mais de um tipo de tirania.
CONSTANT
, BENJAMIN, Da Liberdade dos Antigos Comparada a dos Modernos, tradução de textos escolhidos de Benjamin Constant, por GAUCHET, MARCEL Org., paper Assembléia Legislativa do RS, 1996.
“Embora Rousseau nunca tenha previsto algo como revolução, muito do terrorismo jacobino revolucionário de 1793-1794 foi executado em seu nome.” (MERQUIOR: 28)
A rica França, a tonta Alemanha, a hibernada Rússia, a folclórica Itália, e los valientes espanholes e TODOS os latinos foram aquinhoados, desde então, com inúmeras perturbações, guerras civis e internacionais, ditaduras e constituições de toda índole, justamente na esteira do carma:

Embora as leis e as condições de produção da riqueza possuam mesmo caráter das verdades físicas, a distribuição é apenas uma questão de instituições humanas. As coisas estando disponíveis, a humanidade, individual ou coletivamente, pode fazer com elas o que quiser. A sociedade pode sujeitar esta distribuição de riqueza a quaisquer normas que ela invente.
MILL, J. S., cit. HAYEK, F.A., p. 127; tb. cit. HUGON, P.: 160.

Era uma questão tanto de sobrevivência quanto de política: uma panacéia que, pelo voto do trabalhador e pela transformação radical do Parlamento, proporcionaria ao trabalhador muitos assados, muito pudim de ameixas e cerveja forte, com três horas de trabalho diário.
RUDE, GERGE: 196.

Faça a conta dos regimes que nos levam a codificar com um gesto nossas paixões do momento. Compensamos nossa inconstância através de visões eternas logo gravadas no mármore. Nossas revoluções passam primeiro pelo tabelião. Conseqüência: quinze Constituições em cento e oitenta se sucederam na França depois da Convenção: Diretório, Consulado, Primeiro Império, Restauração, Cem Dias, Restauração, Monarquia de Julho, II República, Segundo Império, III República, Vichy, de Gaulle, IV República, V República, ufa!
MITTERRAND, FRANÇOIS,
Aqui e Agora: 90


O Folclore


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