sexta-feira, 14 de agosto de 2009

O papel (ão) do Estado


Percorri laboriosamente o texto, embora ele me parecesse um absurdo. Como quer que fosse, todas essas idéias me pareceram uma especulação desvairada, talvez perdoável por faltar aos gregos o necessário conhecimento empírico. Não obstante, entristeceu-me ver um filósofo da agudeza crítica de Platão sucumbir a tais fantasias.
HEISENBERG, W., 1996: 17
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Uma ilusão geral constitui uma força social, que serve potentemente para cimentar a unidade e a organização política de um povo, como de uma inteira civilização.
MOSCA, Gaetano, Scritti politici Teorica dei governi-elementi di scienza política vol. II, 633; cit. RÊGO, W.D.L.: 88
Sempre me intrigou o fato de uma verdade ser inoportuna. Pois ninguém a suporta. Novelas televisivas recebem maior atenção do que os próprios membros da família. Para mim, é a consciência que determina o ser; para ele, contudo, parece ser a inconsciência o melhor meio de vida.
Certa ocasião ouvi sábio conselho: se não quisesse ser protagonista, que ficasse na platéia; mas que não ousasse falar, muito menos puxar a fantasia dos atores, sob pena de ser expulso até da assistência. Disse-me, ainda, que persona significa máscara. Senti-me despersonalizado.
A mistificação, a ilusão, a magia, as promessas, a vida eterna sói melhor confortar a humanidade do que a crueza de tentar minimizar o flagelo. Para fugir da dor, valem as drogas, as religiões, os filmes, e novas eleições. Dizem que por elas se depura a democracia, e só tal esperança é forte para fazer o rebanho continuar a produzir a lã, enquanto não é carneado.
A massa se rege por sentimentos, emoções, preconceitos, como a psicologia social já demonstrou exaustivamente. A opinião das massas formando a opinião pública será por conseqüência irracional. Não se iluda o publicista democrático a esse respeito, cunhando a expressão agora uso corrente no vocabulário político da propaganda: o ‘estereótipo’, ou seja o ‘clichê’, a ‘frase feita’, a idéia pré-fabricada, que se apodera das massas e elas, numa economia de esforço mental, como diz Prelot, aceitam e incorporam ao seu ‘pensamento’, entrando assim a constituir a chamada ‘opinião pública’.
BONAVIDES, P.:459.
É certo que ninguém pauta sua vida a partir do mapa platônico, até por desconhecê-lo, mas é a corroída mentalidade do primeiro secretário que molda nossa civilização, estabelecendo seus cânones: valores, moral, e até o sentido da existência.
Quase que invariavelmente, todas as modernas
áreas do conhecimento tiveram lume na Grécia Antiga.

MEISTER, L.F., A evolução do pensamento econômico - www.webartigos.com.br
O conhecimento serve tanto ao seu mero usufruto, como ferramenta de conquista. O poder inebria. Fazer fogo, encanta. Vencer uma porfia, ter êxito na caça, glorificar-se, eis o norte de quem se julgava centro do Universo.
Legislo tendo em vista o que é melhor para todo o Estado; coloco
justamente os interesses do indivíduo num nível inferior de valor.

PLATÃO, A República; cit. POPPER, K.: 123.
'É preciso que o Estado governe em acordo com as regras de ordem essencial', diz Mercier de la Rivière, 'e então deve ser todo-poderoso'. Segundo os economistas, o Estado não deve unicamente comandar a nação, também deve formá-la de uma certa maneira; cabe-lhe moldar o próprio espírito dos cidadãos, enchê-lo com certas idéias e fornecer ao seu coração certos sentimentos que julga necessário. Na realidade, não existem limites aos seus direitos nem ao que pode fazer; não reforma simplesmente os homens, quer transformá-los; talvez, se o quisesse, poderia fabricar outros! 'O Estado faz dos homens tudo o que quer', diz Bodeau. Esta frase resume todas suas teorias.
TOCQUEVILLE, A, O Antigo Regime e a Revolução: 157
Os admirados espartanos se notabilizaram por essas duas peculiaridades: competição & vazio intelectual.
Ela requer domínio sobre o adversário, daí se incluindo as guerras, e o conforto na morte do competidor. Para tanto, mister conjugar todas as forças:
“Toda a política dos filósofos se resume em por a onipotência do Estado ao serviço da infalibilidade da razão, a fazer da razão pura uma nova razão de Estado”. (SOREL, ALBERTO, L'Europe et la Revolution Française, T.I, Cap.II; cit. PRELOT, MARCEL, Vol. II: 293)
Sua "razão" é diametralmente oposta a do cidadão:

Brasil pagará R$ 19 bi por submarinos franceses que França e Otan não usam

O Brasil está manchado pela corrupção em todos os níveis. No Senado, virgem! Vige a censura e ditadura. Estudantes hoje foram detidos pela Polícia do Senado, constrangidos, ameaçados, e degradados por três horas.
O Estado, por mais corrupto que seja, e como o são!, ainda assim se põe diapasão de moral; de justiça; de valor; de ciência; de realização; de religião; e por fim, de sociedade.
A única forma de constituir um poder comum, capaz de defender a comunidade das invasões dos estrangeiros e das injúrias dos próprios comuneiros, garantindo-lhes assim uma segurança suficiente para que, mediante seu próprio trabalho e graças aos frutos da terra, possam alimentar-se e viver satisfeitos, é conferir toda a força e poder a um homem, ou a uma assembléia de homens, que possa reduzir suas diversas vontades, por pluralidade de votos, a uma só vontade. (...) Esta é a geração daquele enorme Leviatã, ou antes - com toda reverência - daquele deus mortal, ao qual devemos, abaixo do Deus Imortal, nossa paz e defesa.
HOBBES, THOMAS, The Leviathan, cap. 17.

Essa confortável pregação foi paulatinamente consagrada, e adotada na íntegra pelos grandes condottieres:
A sociedade grega e romana se fundou baseada no princípio da subordinação do indivíduo à comunidade, do cidadão ao Estado. Como objetivo supremo, ela colocou a segurança da comunidade acima da segurança do indivíduo. Educados, desde a infância, nesse ideal desinteressado, os cidadãos consagravam suas vidas ao serviço público e estavam dispostos a sacrificá-las pelo bem comum; ou, se recuavam ante o supremo sacrifício, sempre o faziam conscientes da baixeza de seu ato, preferindo sua existência pessoal aos interesses do país.
TOYNBEE, Arnold J.:196
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As principais características do indivíduo no grupo são, portanto, o desaparecimento da personalidade consciente, o domínio da personalidade inconsciente, a orientação de pensamentos e sentimentos em uma só direção mediante a sugestão e contágio, a tendência à realização imediata de idéias sugeridas. O indivíduo não é mais ele mesmo, é um autômato destituído de vontade. Ademais, pela mera participação num grupo, o homem desce vários degraus na escada da civilização.
LE BON
cit. KELSEN, HANS, A Democracia: 315
O debilóide e a companheirada sulamericana deliram:
O estado docente é a expressão reitora do Estado venezuelano na educação, em cumprimento de sua função indeclinável e de máximo interesse, que se materializa nas políticas que regem a educação como direito humano universal e dever social fundamental, inalienável, irrenunciável, e como bem público.
Os cidadãos reduzidos a bem público: eis a radicalização da bestialidade platônica.
A lei altera totalmente o sistema de ensino venezuelano, da pré-escola à universidade, para cumprir a tal "Doutrina Bolivariana". Piada. O ideal é adequar o ensino a "princípios socialistas", transformando as escolas em centros de reunião das comunidades sob a supervisão de pessoas pagas pelo governo, este subrogado na capacidade de definir as carreiras que os estudantes universitários deverão seguir.
"O que se está aprovando é uma lei habilitante educativa, que dá toda a reitoria da educação, mediante regulamentos, ao presidente da República." (Dep. Fed. da Venezuela, Ismael García, 14/8/2009)
Em outros tempos, se dissessem a um homem que, ao recusar-se a reconhecer a autoridade do Estado ele ficaria à mercê dos ataques de homens perversos - inimigos internos e externos - e que teria que lutar sozinho sujeitando-se a ser morto em combate, sendo portanto vantajoso suportar algumas dificuldades em troca de proteção, ele poderia acreditar, já que os sacrifícios que viesse a fazer pelo Estado seriam apenas pessoais e lhe garantiriam pelo menos a esperança de uma vida tranquila numa Nação estável. Mas no momento em que não apenas os sacrifícios parecem ter se tornado mil vezes mais penosos, mas os benefícios parecem ter desaparecido, é natural que os homens tenham chegado à conclusão de que a submissão à autoridade é algo totalmente inútil.
TOLSTÓi, L., O Reino de Deus está dentro de Vós, cit. WOODCOCK, G.: 189
Não por acaso, pois, RICHARD FEYNMAN (O significado de tudo: reflexões de um cidadão cientista: 14) assim abria suas palestras: :
“Não há praticamente nada do que vou dizer esta noite que não pudesse já ter sido dito pelos filósofos do século XVII.”
Para encerrá-las, o pesquisador de Los Alamos trocava o “vou dizer” por “eu disse“; e praticamente repetia as concepções de LOCKE & SMITH:
Nenhum governo tem o direito de decidir sobre a verdade dos princípios científicos nem de prescrever de algum modo o caráter das questões a investigar. Também nenhum governo pode determinar o valor estético da criação artística nem limitar as formas de expressão artística ou literária. Nem deve pronunciar-se sobre a validade de doutrinas econômicas, históricas, religiosas ou filosóficas. Em vez disso, tem para com os cidadãos o dever de manter a liberdade, de deixar os cidadãos contribuírem para a continuação da aventura e do desenvolvimento da raça humana. Obrigado.

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