sexta-feira, 23 de maio de 2008

A presença de Thomas Hobbes

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Hobbes, que havia freqüentado assiduamente a corte fazendo-se passar por matemático (mesmo que pouco soubesse dessa disciplina) se desgostou ali, regressou à Inglaterra nos tempos de Cromwell e publicou uma obra muito malvada, de título muito raro: The Leviathan. Sua tese principal era de que todos os homens atuam devido a uma necessidade absoluta, tese apoiada, aparentemente, pela doutrina dos decretos absolutos, doutrina de geral aceitação nesses tempos. Sustentava que o interesse e o mêdo eram os princípios fundamentais da sociedade.¹
OS ESTÓICOS  derrubaram o mito da tribo orgânica espartana. Para Sêneca, o ser reflete a alma; portanto, é o que possui valor. Foucault navegou pelo tempo:
Pode-se dizer que, em toda a filosofia antiga, o cuidado de si foi considerado, ao mesmo tempo, como um dever e uma técnica, uma obrigação fundamental e um conjunto de procedimentos cuidadosamente elaborados. (2)
Com o descobrimento, entretanto, desaparecia essa filosofia; e com ela, o indivíduo.
Os portugueses monopolizaram o comércio das Índias Orientais durante cerca de um século, e só indiretamente e através deles é que as outras nações europeias conseguiam enviar ou receber bens desse país. Quando os holandeses, no início do século passado, começaram a intrometer-se, os portugueses outorgaram todo o comércio das Índias Orientais a uma companhia exclusiva. Os inglêses, franceses, suecos e dinamarqueses seguiram todos este exemplo, de modo que nenhuma grande nação europeia se beneficiou ainda da liberdade de comércio para as Índias Orientais. (3)
Foi Maquiavel, maior que Cristóvão Colombo, que descobriu o continente sobre o qual Hobbes pôde edificar sua doutrina. STRAUSS, Leo, Direito Natural e História, tradução francesa de Monique Nathan e Éric de Dampierre. Paris, Plon: 1954:192
No ambiente leviatânico vieram as primeiras formações mercantilistas - dádivas do soberano a seus amigos e parentes; e, graças aos privilégios, a Companhia Inglêsa das Índias Orientais pode fincar sua administração no seio da Índia, açambarcando o imenso território como se fosse propriedade, aventura de duzentos anos. A Companhia da Baía de Hudson colonizava o Novo Mundo; a Companhia de Plymouth seguia-lhe os passos; a Companhia de Londres formava o quarteto de maior realce:
"Políticas mercantilistas para promover o comércio exterior do reino à custa dos rivais, especialmente os holandeses, começaram à época de Cromwell e tiveram prosseguimento com Carlos." (4)
Morada de Felipe II, o exuiberante  Monastério de San Lorenzo de El Escorial. 
A Espanha levava a vantagem inicial pelo domínio da inesgotável fonte da América Latina. Não necessitavam seus governantes muita criatividade para tratar do ingresso de divisas no País, exceto para enganar e depois dizimar incas e aztecas. Felipe II, O Torturador, mantinha fortíssimo controle sobre o comércio e a agricultura. Preocupava-lhe a alimentação do enorme contingente requisitado à Invencível Armada. Foi quando um grande retrógrado e sofista da ciência política inglêsa suspirou batizado de Thomas Hobbes (1588-1679), para crescido dar paternidade ao Estado Leviathan. No dizer de Bobbio, a peça foi “o maior filósofo político da Idade Moderna, até Hegel”. (5)
Robert Nisbet quase concorda: “poucos são os escritores que tiveram maior influência do que Hobbes no desenvolvimento do moderno Estado centralizado.” (6)

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As contribuições dos cidadãos inglêses para com a Coroa, mesmo com a avalanche de argumentos bélicos, eram controladas, restritas pelo Parliament; assim declarava a Petição de Direito, de 1628, mas a brasa da tirania reascendeu pelas mãos do segundo Stuart, Carlos I. O déspota sabia como sugar recursos provenientes do suor alheio, contornando o poder legislativo ao revigorar leis obsoletas, multas por descumprimentos e tungas diversas, especialmente as ship moneys.
Thomas Hobbes havia nascido de parto prematuro, quando da aproximação da armada espanhola à costa britânica. O rebento era fruto de um “vigário de pouca cultura e temperamento violento, que desapareceu em Londres quando Hobbes ainda era criança”. (7)
O filho do vigário cresceu em Oxford, para depois ser estigmatizado por outras atrozes coincidências: embora amigo íntimo dos Stuart (pelo menos se passava com tal) e até tutor de Lord Cavendish, presenciou a conspiração de Poudres, em 1605; o assassinato de Henrique IV, (1610) em Paris; as execuções de Strafford e Laud, a derrota naval de Naseby (1645); por fim, estava presente na execução do próprio “amigo” Carlos I (1648), para a ascensão do encomendado Cromwell. Eis a razão de sua marcante covardia:
“Hobbes justifica racionalmente o poder absoluto, a partir duma concepção puramente materialista da natureza do homem, egoísta e perseguido por fobias.” (8)
Carl Schmitt não deixa por menos: Hobbes foi, claramente, precursor do totalitarismo; e liga-o com Maquiavel, Vico, Nietzsche e Sorel - ídolo e mentor intelectual de Mussolini. (9)
Joseph Viatoux confirma e acrescenta:
“A doutrina do Estado de Hobbes é a mesma doutrina do Estado totalitário contemporâneo.” (10).

O grave dano social cartesiano

Veja, ainda:
A má temática de Thomas Hobbes
A pobreza metodológica de Thomas Hobbes
O liame de Thomas Hobbes
A dialética epiléptica de Thomas Hobbes
A perene atualidade de Thomas Hobbes

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Notas
1. Brett, R. L., La Filosofia de Shaftesbury y la estetica literaria del Siglo XVIII, p. 14.
2. Foucault, M. Resumo, p. 122.
3. Smith, Adam, Inquérito sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações, p. 748.
4. Wills, John E., p. 230.
5. Hegel, W. e Hobbes, T., cits. Bobbio, Norberto, A Teoria das Formas de Govêrno, p. 107 e 119.
6. Nisbet, Robert A., Hobbes, T., cits. Bobbio, Norberto, Thomas Hobbes, p. 154.
7. Russel, Bertrand, 2001, p. 273.
8. Hobbes, Thomas, cit. Chevallier, Jean-Jacques, As grandes obras políticas de Maquiavel a nossos dias, p. 19.
9. Schmitt Carl, cit. Prelot, Marcel, vol II, p. 266.

10. Viatoux, Joseph, cit. idem, p. 263

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