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No Congresso América 92 - Raízes e Trajetórias, a Professora Marilena Chauí condenava a formação política de nosso continente,porque lastreada no fortalecimento repressivo e violento do Estado, “único sujeito histórico e político do país”. -
A CONCEITUADA catedrática cita a característica dos regimes despóticos e demonstra como a mistura dos três poderes, veiculados originalmente em Montesquieu, enfeixam-se nas mãos de um pequeno grupo, mais moderno e mais “democrático”, substituto do déspota único, capaz de encarnar com maior eficácia uma arranjada “Vontade Geral”. Queixa-se: “Não se consegue desenvolver os ideais socialistas da justiça sócio-econômica, da liberdade e da felicidade, da cidadania participativa e da sociedade auto-organizada.” Tampouco qualquer arremêdo liberal:
“A 'vontade geral' tem sempre razão e, enquanto tal, está sempre espreitando a vida privada do cidadão soberano, por sobre seus ombros.” (Koselleck, Reinhart, p. 144)
A semelhança dessa vontade com o gosto dos inúmeros chefes latinos já fora detectado por ninguém menos do que o próprio “libertador” Simon Bolívar:
“Não podemos governar a América. Este país cairá infalivelmente nas mãos da multidão desenfreada, para passar em seguida às mãos de pequenos tiranos, quase imperceptíveis, de todas as cores e de todas as raças.” (cit. Minguet, Charles, Myrthes fondateurs chez Bolivar, 'Simon Bolivar', Cahiers de l'Herne, 1986, p. 117; cit. Gusdorf, G, p. 259)
Foi sempre mais cômodo a esta América, dos escravos, silvícolas e bandidos extraditados, dos católicos espanhóis e portugueses, “copiar” os sentimentos da matriz:
“O nacionalismo latino-americano é, como os cavalos e os jesuítas, ou como o Direito e o castelhano, uma importação européia.” (Mendoza, Plinio Apuleyo, Montaner, Carlos Alberto, Llosa, Alvaro Vargas, p. 207) Junto, veio o molde centralizador:
O monopólio, os privilégios, as restrições a livre atividade dos particulares no domínio econômico e em outros são tradições profundamente arraigadas nas sociedades de origem espanhola. Diante dessa situação, a reação espontânea de um chefe de governo, herdeiro da tradição mercantilista espanhola, será sempre a de intensificar controles, multiplicar restrições e aumentar impostos.Richard Morse, (Entrevista a Carlos Eduardo Lins da Silva, Folha de São Paulo, 11/10/92) ex-professor da Universidade de Yale, ex-diretor do programa latino-americano do Woodrow Wilson Center, Washington, referenda a teoria de que a colonização inglêsa teve aspectos de modernismo não aplicados pelos ibéricos. Morse ainda enfoca a peculiaridade climática vivida por Espanha e Portugal na época dos grandes movimentos político-científicos e lembra a permanência intocada que ficou a região diante da Reforma ou do Renascimento. Constata, ainda, que naqueles domínios não houve nenhuma revolução científica importante, ninguém equivalente a Hobbes ou Locke, ou mesmo a Rousseau, ou a uma revolução industrial. Em outras palavras: a região ibérica destoou da aceleração político-cultural do resto do continente. (O célebre professor, todavia, crê ser possível uma metamorfose, advinda da nova observação, “de enfoque globalizante ou holístico do mundo na Íbero-América.”)
(Idem, p. 126)
A rigor, o ostracismo no Renascimento foi até uma salvaguarda, se constatarmos que tal evento propiciou o brilho de notáveis impostores, entre os quais fulgura Maquiavel.
De todo modo, Gore Vidal junta-se aos diagnósticos, e atribui o desastre das Américas Central e do Sul ao espírito de um rei católico,
totalmente beato e totalmente não inteligente de nome Felipe Segundo, seguido de um estúpido regime que suprimiu culturas regionais, florescentes naturais, preenchendo o vazio de sua falta com os piores elementos da cultura arcaica, de mausoléu.O grande Simon Bolívar (Carta a um cavalheiro que tinha grande interesse na causa repúblicana na América do Sul (1815), cit. Mendoza, Montaner & Llosa, p. 36) discernira e profetizara:
(Idem, ibidem)
Enquanto nossos compatriotas não possuírem os talentos e as virtudes políticas que distinguem nossos irmãos do Norte, os sistemas inteiramente populares, longe de nos serem favoráveis, receio que virão a ser nossa ruína. Infelizmente essas qualidades parecem estar muito distantes de nós, na intensidade que se deseja; e, pelo contrário, estamos dominados pelos vícios que foram contraídos sob a direção de uma nação como a espanhola, que só sobreviveu em atrocidade, ambição, vingança e avidez.Vilela e Catão (O Monopólio do Sagrado; Correio do Povo, 5/11/1995, p. 21) completam o quadro. Com tais verdades, mais atuais do que nunca, encerramos o lamento do dia:
No Terceiro Mundo e sobretudo na América Latina a social-democracia é adotada por quase todos os partidos políticos. Sendo liberal, democrática em política e socialista, intervencionista em economia, promete mais do que pode dar (comportamento típico do populismo). De frustração em frustração, vacilante e inoperante diante da realidade que não consegue entender, procura enfrentar os problemas apenas pela via retórica e acaba gerando o desejo de intervenção, a fim de 'por a casa em ordem' (regimes militares). Essa alternância de militares e populista, ambos intervencionistas, tem sido a saga da América Latina e a grande causa de sua má performance econômica.Bem ensina Ferguson (p. 210), e com ela encerramos a escala:
"O poder de descentralização deriva do fluxo de novas idéias, imagens e energia para todas as partes do organismo político. Concentrações de poder são tão antinaturais e fatais como um coágulo de sangue ou um fio elétrico desencapado."
Veja:
A charla de Sauípe
Chávez-de-braço na América do Sul
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