sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Democracia, que sequer inglês vê

As corporações centralizadas e autoritárias têm fracassado pela mesma razão que levou ao fracasso os estados centralizados e autoritários: elas não conseguem lidar com os requisitos informacionais do mundo cada vez mais complexo que habitam.
FUKUYAMA, F., 2002: 205
Democracia pressupõe governo do povo, não de parte do povo.
É óbvio que a unanimidade jamais pode ser alcançada, mas o pressuposto não exige a divisão do povo como se fosse gado apartado, ou massa gravitacional, cujo peso pode ser aferido em mera balança.
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Conceitos, objetivos, o próprio conhecimento percorrem meandros que nenhuma entidade verticalizada sói acompanhar. Não por acaso, principalmente no Brasil, a cada década os partidos trocam suas denominações. Seus quadros, contudo, permanecem sob o domínio dos mesmos profissionais, praticamente em caráter vitalício, donos de exclusivo objetivo. O anonimato das greis lhes permite auferir incomensuráveis dividendos:
O comerciante está convencido de que a lógica é a arte de provar à vontade o verdadeiro e o falso; foi ele que inventou a venalidade política, o comércio de consciências, a prostituição dos talentos, a corrupção da imprensa. Sabe encontrar argumentos e advogados para todas as mentiras, todas iniquidades. Somente ele nunca se iludiu sobre o valor dos partidos políticos: julga-os todos igualmente exploráveis, isto é, igualmente absurdos...
PROUDHON, P.-J., Filosofia da Miséria, Tomo I: 351.
O suborno antecipado é a maior causa da corrupção endêmica.
A arrecadação do PT, PSDB, DEM e PMDB explodiu em 2008 com doações recebidas de empresas que exacerbaram, no ano passado, o mecanismo usado para ocultar a identificação dos reais financiadores dos candidatos a cargos públicos.
Folha, 3/5/2009
Tal prática só é viável por meio da corporação, que a tudo encobre, e a todos implica; portanto ninguém é penalizado.
Quando o PT assumiu o poder, seguiu ao pé da letra a receita de FHC - tanto nos acordos fisiológicos inevitáveis, quanto na tentativa de cooptação desses grupos barras-pesadas. A história ainda cobrará caro de FHC por ter institucionalizado o crime organizado no centro do jogo político brasileiro.
NASSIF, Luís, O sistema político brasileiro e o crime organizado. www.adital.com.br, 24/3/2009
O flagrante é por demais saliente para ser desdenhado, mas não há o menor movimento para elidi-lo. O critério de eleições através dos partidos está de tal modo impregnado que não há país, e nenhuma gente que conceba diferentemente.
Se pela democracia e perante a lei que a regula todos são iguais, por qual razão cargos eletivos são prerrogativas exclusivas dos militantes?
O Judiciário exige técnica de interpretação, por isso seus quadros são preenchidos pelas "pessoas jurídicas". O Legislativo, contudo, aquele que formula a lei, pode ser tomado por analfabetos, desde que constantes das listas dos partidos. Maior non sense, ainda, é entregar a diletantes a chave do incomensurável cofre confiado ao Executivo. As atividades dos tres poderes são totalmente distintas. Se ao Executivo convém uma equipe homogênea, a instituição do segundo turno, de novo uma importação da cartesiana francesa, permite o apoio de vários partidos ao favorito, em troca de cargos, fato que per se já elimina o maior apelo. Quanto ao Parlamento, se por acaso seus integrantes forem apenas porta-vozes da disciplina partidária, como sempre é o caso, é trivial concluir que em vez de parlare, seus integrantes na melhor das hipóteses vão se digladiare, enrolados no prefabricado maniqueísmo.
"Cada partido compreende o que interessa à própria conservação não permitir que se esgote o partido concorrente. Tem mais necessidade de inimigos do que de amigos: só pelo contraste é que ele começa a se sentir necessário, a tornar-se necessário." (NIETZSCHE, F., Crepúsculo dos Ídolos: 39)
Na França, desde 1789, ou se era vermelho ou branco, padre ou leigo, burguês ou socialista, reacionário ou progressista. E entre os dois grupos inimigos, as pessoas se estripavam, cortavam-se em pedacinhos, insultavam-se, desprezavam-se.
Na pior, o vermelho e o branco agem de modo orquestrado e combinados, sob a batuta de seus respectivos maestros.
Apesar de o povo francês ter-se adiantado mais do que os outros na conquista de seus direitos, ou melhor dito, de suas garantias políticas, nem por isso deixou de permanecer como o povo mais governado, mais dirigido, mais administrado, mais submetido, mais sujeito a imposições e mais explorado de toda a Europa.
Tendo em vista o tamanho do bolo arrecadatório, é trivial concluir:
Sempre que penso nas alianças e disputas na política libanesas, me lembro do filme'O Poderoso Chefão'. Inimigos se tornam aliados, antigos amigos passam a se matar e, após inúmeras baixas, todos se sentam à mesa para definir a nova divisão do poder.
CHACRA, G., Diário do Oriente Médio http://blog.estadao.com.br/blog/chacra
E o povo, que pensa poder escolher, que presume que este poder emane de si, é fragorosamente enganado por este verdadeiro conto-do-vigário, mas não encontra solução.
"Se a Dilma for consagrada candidata, ela é que vai ter escolher o vice junto a base aliada. Se eu já escolhi uma candidata imagina escolher o vice." (Presidente L. da Silva, O Globo, 10/9/2009)
E nem encontrará.
Constitui um lugar-comum histórico relacionar o surgimento do nacionalismo moderno com a Rev. Francesa. A afirmação é válida, no sentido de que a Revolução Francesa evoluiu para uma espécie de totalitarismo democrático devido ao seu culto do povo sem restrições, o primeiro a instituir algo como o serviço militar universal, 'uma nação as armas'.
LUCKÁCS, John, O Fim do Século 20: 226
MAX PLANK, o célebre articulador da Teoria dos Quanta, tinha a maior dificuldade que sua propositura fosse digna de respeito. O quântico sentenciou: uma nova teoria só tem chance de êxito na morte dos opositores. Nem assim. Os reacionários vem se sucedendo, já por meia dúzia de gerações.
Seria por demais arriscado alterar o modo eleitoral de uma Nação? Mas o que pode ser mais infeliz do que seus cidadãos estarem completamente envoltos numa armadilha na qual sequer recebem a luz do Sol? É-lhes necessário, apenas, supor que o Sol existe, e que não só é possível, como imperativo proceder uma guinada, sob pena de na negritude vivida o homem ser confundido como animal, e a antropofagia virar costume geral. É o que está acontecendo, com records de crimes de todo o matiz, os quais já não temem, sequer, aproximar-se dos cômodos dos próprios alienados governantes.
Dez homens armados fecharam o túnel que liga os bairros de Botafogo e Copacabana, na zona sul do Rio, no início da noite desta quinta-feira (3), por volta das 18h30, para assaltar motoristas.
Folha, 4/9/2009
* * *
Para The Economist a exploração das reservas pré-sal pode se transformar em uma 'maldição'. O dinheiro gasto hoje e não poupado ou investido, inchará ainda mais um Estado cujos gastos equivalem a 36% do PIB, comparado com 20% do México. A proposta de criação da Petro-Sal, também preocupa. Em tese, ela deveria ser uma entidade pequena, composta por técnicos. Na prática, ela pode inchar, especialmente se controlada por políticos que podem abarrotá-la de aliados. "Qualquer um que esteja acompanhando os recentes escândalos de corrupção no Congresso brasileiro sabe que os legisladores do país são capazes deste tipo de desastre", afirma o artigo inglês, publicado hoje, 4/9/2009.
O Brasil pode ser laboratório de muitas inovações, mercê de sua larga extensão geográfica, consubstanciada pela nominal divisão federativa, cuja peculiaridade, se efetiva, permitir-lhe-ia adotar diferentes constituições.
Ter mais liberdade melhora o potencial das pessoas para cuidar de si mesmas e para influenciar o mundo, questões centrais para o processo do desenvolvimento.
DAWKINS, R: 369
Aliás, a democracia sendo poder do povo, deveria ser encetada pelo povo do respectivo rincão:
Sem dúvida, o universo inteiro podia ser pensado como se desdobrando ou se expressando em ocorrências individuais. E dentro dessa visão global que se torna possível acomodar as sincronicidades como eventos significativos que emergem do coração da natureza.
GLEICK, JAMES, Chaos, cit. LEMKOW, ANNA,: 216
Se por acaso algum estado lograr melhor solução, sempre caberá a opção de outros segui-lo. Ao contrário, se a União enveredar por obscuras ruelas, como sói acontecer, não há possibilidade de ninguém escapar.
Incrível a letargia generalizada, nela incluindo os luminares da Nação, se é que ainda resta algum. Apenas um MAQUIAVEL (O Príncipe) pode explicar tanta falta de imaginação:
A humanidade em geral sente-se inclinada a pôr os pés sobre as pegadas e imitar as ações dos outros. Um homem inteligente deve sempre seguir no rastro desses ilustres personagens cujas ações são dignas de serem imitadas: assim, se não puder igualá-las, pelo menos, em certa medida, assemelhar-se-á a elas.
Urge reencontrar a integridade:
É uma questão que atualmente deve ser reconsiderada, tendo em vista que a fragmentação já se espalhou completamente, não apenas na sociedade, mas especialmente em cada indivído; e isso conduz a um tipo de confusão generalizada da mente, que por sua vez cria uma série infinita de problemas, interferindo com a nossa clareza de percepção de maneira tão grave a ponto de bloquear nossa capacidade de resolver a maioria deles.
BOHM, D.,
Totalidade e ordem implicada: 17


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