terça-feira, 30 de setembro de 2008

Dinheiro x Democracia 8: a festa da crise

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Então veio, parece, um sábio astuto,
o primeiro inventor do medo aos deuses...
Forjou um conto, altamente sedutora doutrina,
em que a verdade se ocultava
sob os véus de mendaz sabedoria.

Disse onde moram os terríveis deuses das alturas,
em cúpulas gigantes, de onde ruge o trovão,
e aterradores relâmpagos do raio aos olhos cegam.
Cingiu assim os homens com seus atilhos de pavor,
rodeando-os de deuses em esplêndidos sólios,
encantou-os com seus feitiços, e os intimidou –
e a desordem mudou-se em lei e ordem.
CRÍTIAS, tio de PLATÃO, e líder dos Trinta Tiranos em Atenas, após
a guerra do Peloponeso; cit. POPPER, Karl M., 1998, Tomo I, p. 158
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No primeiro quarto do XX, o aparecimento do fantasma bolchevique rendeu duas estupendas oportunidades. A primeira, no campo político, ensejou a ascenção dos governos totalitaristas. E a segunda, permitiu que esses governos, mercê da capacidade manipulatória, movimentassem toda a riqueza do mundo, representada pelo dinheiro, à contas redutos particulares. Tal proeza foi precedida de enorme recessão, justamente para preparar a enorme onda.
Em nosso quarto falta imaginação; talvez por isso haja tantos queridos para repetir a façanha. As chances são convidativas no cada vez mais acessível tabuleiro. Qualquer vilão pode chegar. O comparecimento é maciço. Não há Lenin, mas nem precisa tanta contundência: basta acenar com o etéreo, algum ente imaginário, qualquer binladen, uma chama-piloto seguida de algum efeito pirotécnico, para reacender o temor a todo o globo:
A atual crise americana
A crise americana é mais grave do que parecia há seis meses, disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista, em Nova York. O presidente também afirmou que o crédito pode ser reduzido no mundo inteiro. 'Já há sinais de pouco crédito no mundo porque não há segurança e ninguém quer liberar seus dólares'.
Desta feita, a rebelião no cuore capitalista não é proveniente dos operários, tampouco é religiosa, mas produto da combinação dos malvados chefes-de-família: eles se negam a pagar as prestações de suas casas! Seria uma greve-geral soreliana? Fascismo & sindicalismo: o papel de Sorel Mas nem maestro obteria um movimento tão allegro. Quem sabe ficaram pobres de repente? Desempregados no decorrer do ano? Só os pais-de-família? E apenas os que detinham imóveis, porque com os possuidores dos cartões-de-crédito, por exemplo, vai tudo azul, todos são fortes na América do Norte? E que aconteceria se tal filme se abatesse sobre aqueles infelizes adquirentes da casa própria? Os financiadores enriqueceriam só assumindo os imóveis por apenas percentual do valor hipotecado, e sem precisar devolver as parcelas quitadas? Não; essa é dura demais. É de amargar! Espelho, espelho imundo!! Como um gringo pode superar o magnífico valor coberto pelo nosso maior golpe do mundo*?
* * *
Maquiavel propugnou pelo extermínio em massa; Napoleão, só pela vizinhança.
Para Hobbes, Rousseau, Hegel, Darwin, Fichte* e Freud, qualquer indivíduo contém maldade, e todos concordam. Marx foi taxado de exagerado por impingi-la apenas à classe dos patrões, assim livrando os proletários. Hitler foi acusado de megalomaníaco por ser contrário: a sub-raça é que era responsável pelos desvios. No Brasil, Getúlio, o suicida, deu o golpe por causa da grande ameaça. Um exército subversivo varava dentro do mato. Os vinte brancaleones do imprestável Prestes se alimentavam com capivaras. Era um terror só. Gegê defendeu a cidadela. Deve ter sido mesmo um herói... Casualmente hoje é aniversário da denúncia do Plano Cohen. Em 30 de setembro de 1937, o General Góes Monteiro alarmou o povo, em cadeia de rádio nacional: os comunistas iam comer todas as criancinhas! Getúlio fechou o Congresso e decretou a Polaca, uma constituição totalmente fascista. Lograda a façanha, o mesmo General voltou a público para confessar a histórica mentira, assim por todos tolerada, e até venerada pela "democrática" eleição do impostor, embora não poucos testemunhem o processo de fraude desenvolvido pelo assecla militar. Ora "neste país", contrário ao paraíso, o diabo virou anjo. Nos anos de chumbo, era chumbo grosso para ele. Agora, dinheiro grosso, por mensalão. Os diabos foram anistiados, e são assim aquinhoados.
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Nietzsche se deu conta: a história ocidental produz uma permanente festa à fantasia, na qual os dogmas e as religiões do mundo comparecem vestidos de arlequim. Aderimos:
Contemporaneamente o mito vai se identificando com a ideologia política: é que o processo mitológico sempre coloca suas crenças a serviço de uma ideologia. Barthes, coincidindo com este entendimento, afirma que através do mito consegue-se transformar a história em ideologia.
(
WARAT, Luiz Alberto, Mitos e Teorias na Interpretação da Lei: 128)
A democracia, tal como vem sendo concebida, reduz-se a forma de governo. A artimanha consiste em induzir as pessoas a agirem de acordo com o feitor, sem perder a impressão de que suas ações estão em conformidade com suas aspirações:
"O mundo está cheio de injustiças, e aqueles que lucram com a injustiça estão numa posição de administrar as recompensas e os castigos." (RUSSELL, B., Ensaios céticos: 111)
O imposto de renda e o "direito" do trabalho, entre tantos, que não pararíamos mais de listar, foram instituídos, e assimilados depois de prévias e convincentes justificativas. Esses destaques foram conseqüências da perfídia marxista.Depois ficamos sabendo que E=Mc2, de modo que o materialismo não tem, sequer, objeto, mas o governo tem, e isso é o que interessa. O mito está edificado, e tudo fica como dantes, (ou até mais agigantado) no quartel dos dantes.
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Os EUA são pródigos em perseguir belzebús, mas antes criam suas vestes, como todo mundo: eles precisam aparecer na TV. Na década de vinte, os demônios se apresentavam com roupas de comunistas, anarquistas e alcoólatras:
A capital do país, Washington, tinha trezentos bares licenciados antes da Lei Seca: agora havia setecentos bares clandestinos, supridos por quatro mil fornecedores. Tudo isso era possível em função da corrupção total em todos os níveis. Assim, em Detroit, havia vinte mil bares clandestinos.
JOHNSON, P. : 174
Os gangsters gostaram do grand prix; e dizimaram a população. Na de trinta, o país começou a enfrentar o ex-aliado, anjo revoltado. Na de quarenta, a Cortina de Ferro desceu sobre o palco. A platéia não pode mais enxergar. Quando o maligno perdeu a graça, e encerrou o entedioso show, logo apareceram dois novos clones: um largou a bebida pela droga; o outro, pelo islamismo. A droga é de fato produto altamente rentável. Rende votos aos caçadores; rende muito aos traficantes, aos jornais, e justifica as altas somas envolvidas. O islamismo também. Bush amealha astronômica cifra para caçá-los. Enquanto isso, saqueia o quinto dos infernos e lhe retira o petróleo, desse modo contemplando seus investidores de campanha.
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Desde os primórdios do XX a maior parte dos investidores vem pelos meios de rodagem; pelo meio, entrou a rodagem da máquina de fabricar dinheiro, sem nada produzir. Isso quem ensinou foi Tio Sam, o da cartola; e quem tão bem implementa é o Brasil. Além de coelhos, abundam gatos, papagaios, tucanos, cobras, jacarés e macacos, por aqui.
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Os investidores de campanha no Brasil foram listados na pasta-cor-de-rosa. Ao assumir o impostor, ele tornou o futuro da cor, mas seus eleitores até hoje vêem a coisa preta.
As arrecadações de campanha constituem lêdo engano, o mais crasso dos equívocos: não são as empresas que estão contribuindo; elas só estão investindo. Quem paga o pato, e muito mais caro, será o modesto chefe-de-família omisso, ocupado exclusivamente em manter de pé sua residência. Por paradoxo, quanto mais lhe preocupa sua cama, ao redor da casa, depois da eleição, e agora até um pouco antes, vem o redemoinho para levá-la de roldão. Do couro é que sai a correia, já prenunciava o filósofo de plantão.
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No caso americano, parece haver rendimento instantâneo. O candidato republicano aos aposentos da Casa Branca já acusou Barack Obama de exorbitar na captação de recursos, mas parece que ele, sua grei e seus patrocinadores é que estão melhor se valendo do rateio; desta feita gigantesco, e de antemão.
Naquela década fatídica já havia assombração para justificar a magia, e assim as famílias americanas puderam nanar, embaladas em New Deal:
Estamos hoje no meio da maior catástrofe econômica – a maior catástrofe devida quase inteiramente a causas econômicas – do mundo moderno. Sustenta-se em Moscou a idéia de que é a crise final, culminante no capitalismo e que nossa ordem existente da sociedade não sobreviverá a ela.
KEYNES, John Maynard, cit. Strathern: 224

Os grandes banqueiros e industriais emergiram nessa época. Firmas de Wall Street - como Belmont, Lazard e Morgan - com apenas 15 anos de existência, ocupavam lugar de destaque na economia. Os tempos modernos da legislação para as práticas de comércio começaram em 1934.
GLEISER, I.: 211
Roosevelt e os investidores da campanha limparam os cofres repletos de ouro, colocando papel em seu lugar. Preocupados que a longo prazo tudo iria ruir alguns correligionários interpelaram o mágico britânico. A resposta foi enfática, numa frase inesquecível:
"A longo prazo estaremos todos mortos!" Sobre o caráter de Keynes
Coincidentemente, este que antecipara a catástrofe, soube aumentar seu patrimônio pessoal: de 16.315 libras, logrou 411.238 - equivalentes a 10 milhões de libras em valores atuais - quando morreu. (Idem: 35)
Estamos explicados?
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A propalada crise americana é apenas fruto da ganância de alguns maiores banqueiros daquele país, e de resto espalhados pelo globo, em associação com os governos fascistas que tem se instalado da América Latina, àquela do norte; da Rússia à Itália, e alhures, mais ou menos maquiados. Não por acaso, os bancos envolvidos são os mesmos que especulam em mercados de capitais. Por lá tem aquela instituição com nome de pirata. Geralmente é ela quem agita o pano vermelho, para enfiar sua espada. Embora suas garras se estendam até ao fim-do-mundo, isto é, até no Brasil, sua interferência doméstica, contudo, é bastante restrita, encerrada na Wall Street. Como os valores daquele country são de tal magnitude que não cabem em nenhuma bolsa, fica óbvio e patente que tais anúncios visam, apenas, o estouro da boiada, para o cowboy laçar o boi que lhe apraz.
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Tudo isso só acontece por um bizarro fator: em que pese a democracia repartir o poder político em três, e os EUA até pelas terras, divididas em vários estados, o poder financeiro, a capacidade de manipular a moeda é prerrogativa do jockey, em qualquer lugar do mundo. Tal privilégio tem ressonância não só na destinação dos impostos recolhidos, como do próprio aparelho produtivo, afinado por seu diapasão.
Especialmente depois de Keynes o dinheiro subverte qualquer tradição, e bem o sabemos: o poder absoluto corrompe absolutamente. Portanto, é trivial concluir: ou a civilização minimiza o quase irredutível tirano, ou ela própria acabará em maus lençóis.
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* Para Johan Gottlieb Fichte (1762-1814) a educação deveria ter por objetivo destruir o livre arbítrio, de modo que as crianças, depois de deixarem a escola, fossem incapazes, pelo resto de suas vidas, de pensar e agir de maneira diversa daquela que seus mestres teriam desejado.
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À distração:
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2 comentários:

  1. Este blog continua sensacional, tem selos pra vc la no meu blog, passe lá

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  2. Kharhan,
    Comovido com tão bondosa manifestação. Muito grato.

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