sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Breves considerações sobre Anarquia

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Uma colméia é a perfeita imagem de uma ‘anarquia cósmica’, isto é, uma perfeita ordem e harmonia sem nenhum governo externo; o sem governo (anarquia) se refere a um fator extrínseco, mas o governo (autarquia) está dentro de cada abelha. É a consciência apiária que governa e, por isto, não há necessidade de uma organização externa. ROHDEN, H.: 81
A implantação de um sistema social anárquico, isto é, desprovido de hierarquias, de um ordenamento valorativo, sempre seduziu brilhantes mentes. Não foram, não são, e por certo nunca serão poucos os que se apaixonam pelo tema. Tal anseio encontra respaldo no próprio caráter do ser humano, um animal que por inteligente, pode elaborar suas próprias conjecturas, e por isso não lhe conforta que outra cabeça o comande, nem mesmo alguma semelhante. Concordo. Porém, infelizmente ou não, ocorrem diversos poréns. Faremos uma pequena digressão, antes de tentar demonstrar sua inconveniência científica, e a inviabilidade, não só lastreada na experiência, mas na própria natureza, e na ciência que nos faz compreendê-la.
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O primeiro marcante movimento que quebrou o elo hierárquico, até então calcado na força bruta, foi o cristianismo. O Império Romano já não tinha sustentação, nem pela força, nem pela riqueza, nem pela imensidão que pode amealhar. Roma veio com o cristianismo, manteve e até ampliou espetacularmente o seu alcance, em vigor até hoje!
O condão do amor quebrou a simetria imperialista, mas compôs outra em seu lugar, dando destaque ao maior de todos os ícones.
Anarquia mesmo se sucedeu na famosa Revolução Francesa. O resultado recaiu na segunda e mais dantesca ditadura já presenciada pelo mundo, de tal intensidade que posso estabelecer suas marolas até a Segunda Guerra Mundial.
Antes dela, a Inglaterra de certo modo promoveu a sua quebra hierárquica, porém mais civilizada. Era para inglês ver. Os ingleses se impuseram pelo mundo, sob o crivo de seus reis; portanto, da ordem hierárquica.
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Marx constatou que o mal provinha do dinheiro, e das nações que o instituíram. Indicou o remédio radical: fim das nações, e com ela o fim dos patrões; junto, os fins do comércio e do leito pelo qual transcorria, o dinheiro. Apenas pelo fato de apontar o inédito norte, já se vê que Marx merecia status especial; portanto, hierarquicamente superior, fato que se confirmou na ascendência da Nomenklatura. Não há necessidade de maiores delongas.
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A democracia supôs que o poder sendo do povo, e por ele exercido, trouxesse a igualdade, e portanto, a anarquia, se a entendermos como todos serem indistintos, pelo menos perante a lei, ou na hora do voto. Todavia, não há regime mais hierárquico do que este, que exige que o povo escolha por quem quer ser governado, visto que ela é exercida por representantes. Portanto, mercê da força popular, a hierarquia fica fortalecida, solidificada de tal modo que as gentes nem podem mais voltar atrás, depois da besteira de escolhê-los.
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A ordem hierárquica mais natural, naturalmente provém da numerologia. Ela considera o distintivo matemático: a maioria sobrepuja a minoria, que dirá a individualidade. Quem possui a soma de capital, acompanha-lhe  poder real:  "O poder excessivo do setor financeiro é o motivo pelo qual o mundo chegou à crise atual." (RUSSELL, Bertrand, O Moderno Midas, 1930/2002: 69)
O caos e a anarquia conduzem à ordem; por isso são efêmeros, e de certo modo irreais. A impositura, ou, pior, a impostura conduz à revolta, e dela sobrevém a anarquia, e isso se faz real. Ironicamente, a inaptidão do governo, no brinquedo dos Escravos de Jó, proporciona o maior estouro da boiada já visto pelas últimas gerações.
Como é possível, em face da ampla centralização do poder político e econômico, evitar que a burocracia se torne todo-poderosa e arrogante? Como proteger os direitos do indivíduo e, com isso, assegurar um contrapeso democrático ao poder da burocracia? EINSTEIN, A., Escritos da maturidade: artigos sobre ciência, educação, religião, relações sociais, racismo, ciências sociais: 137
Eis o desafio jamais atacado; portanto, nunca solucionado.
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A nossa própria natureza, ao cruzar o EspaçoTempo, oferece uma ordem hierárquica. Embora desprovido de quantificação, de valoração, de ideologia, ou de metafísica: o presente sobrepuja o pretérito, e faz-se ponte ao futuro. Eis uma ordem difícil de se eliminar.
Para tentar identificar o ritmo do BioRitmo há quem prefira reverenciar o passado, algum momento preponderante, não discuto aqui esta certeza, mas constato a disposição hierárquica que a postura dispõe. Por outro lado, existe quem passe a vida plantando, como demagogicamente se referiu o vigarista Guevara, mas neste caso, igualmente, ao relegar ao futuro a possibilidade da plena felicidade, o falso comunista automaticamente escolhe a prioridade; e, como tal, a ordem hierárquica.
Não obstante, em que pese a natureza evoluir de modo aparentemente caótico, há uma espécie de ética que permeia a simbiose entre o espaço e o corpo, o decurso do tempo e a trajetória sideral, de modo que as diferenças, sejam quais forem, se adequam de modo hierárquico.
E a luz das estrelas, ao tangenciar um corpo astrofísico, procede um contorno devido ao efeito gravitacional, de maneira que obedece a imposição do presente.
A diferença fundamental, que deve ser a razão primeira da propositura anárquica, em vez das disposições hierárquicas, muitas vezes confundidas com aristocráticas, ou elitistas, é que a ordem natural não requer nenhuma força; mas a ordem política, social, jurídica e a econômica que nos são impostas, somente podem ser introjetadas, aceitas e praticadas a manu militaire.
Desse modo, não é propriamente pela anarquia que propugnam seus maiores ventiladores, senão que pela ausência de comando, que é quase o mesmo, mas não é o mesmo, e o resultado também é divergente.
Enquanto a ordem hierárquica político-social é garantida pela baioneta ou pelo direito, a ordem sócio-natural provém da opção do agente, tendo em vista a interação:
"Onde quer que vejamos vida, de bactérias a ecossistemas de grande escala, observamos redes com componentes que interagem uns com os outros de maneira tal que toda a rede regula e organiza a si mesma." (CAPRA, F. 1996: 176)
"A superioridade dos sistemas auto-organizadores é ilustrada pelos sistemas biológicos, em que produtos complexos são formados com uma precisão, uma eficiência, uma velocidade sem iguais." (BIEBBRACHER, C., NICOLIS, G. e SCHUSTER; Self Organizations in the Physico-Chemical and Life Sciences; Relatório EUR 16546, European Commission, 1995; cit. PRIGOGINE, I.: 75)
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Seria possível a civilização produzir essa ordem hierárquica natural, assim se adequando à evolução universal?
A resposta é positiva. Muitas civilizações tangenciaram a hipótese, com inegáveis vantagens.
O elemento que mais danificou as relações emergiu com rótulo de defensor. A partir de então, o homem se tornou não lobo do homem, mas escravo do homem que detém o poder.
Antigamente o poder vinha pelas armas. Ora o poder se evidencia pelo dinheiro. Em nosso tempo, parece flagrante que ele será desbancado pelo conhecimento. Cabe a China desferir o tiro de misericórdia àquele agonizante mito pelo qual tantos sinos ainda se dobram.
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A manhã primaveril emerge fascinante. Desculpe o devaneio, se assim entender.
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