quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Cavalos do comissário

À parte as doutrinas particulares de pensadores individuais, existe no mundo uma forte e crescente inclinação a estender em forma extrema o poder da sociedade sobre o indivíduo, tanto por meio da força da opinião como pela legislativa. Ora bem, como todas as mudanças que se operam no mundo têm por efeito o aumento da força social e a diminuição do poder individual, este desbordamento não é um mal que tenda a desaparecer espontaneamente, mas, ao contrário, tende a fazer-se cada vez mais formidável. A disposição dos homens, seja como soberanos, seja como concidadãos, a impor aos demais como regra de conduta sua opinião e seus gostos, se acha tão energicamente sustentada por alguns dos melhores e alguns dos piores sentimentos inerentes à natureza humana, que quase nunca se reprime senão quando lhe falta poder. E como o poder não parece achar-se em via de declinar, mas de crescer, devemos esperar, a menos que uma forte barreira de convicção moral não se eleve contra o mal, devemos esperar, digo, que nas condições presentes do mundo esta disposição nada fará senão aumentar.
STUART MILL, J.,
La liberté, trad. Dupont-White: 131
O maior espetáculo da terra impressiona pela criatividade e riqueza dos detalhes, das fantasias, das musas despidas, dos carros alegóricos, ritmo e coreografias, da alegria espraiada por milhões de pessoas, de norte a sul do país. "Quem gosta de pobreza é intelectual", justificava o carnavalesco. No entanto, a tela é obrigada a dividir o efêmero multicolorido com paupérrimo preto-e-branco, mas nada intelectual, um dos mais deprimentes espetáculos da terra, totalmente despido, sim, mas de criatividade, cortesia dos dois candidatos mais citados à presidência da nossa res ex publica, ora privada, e muito fedorenta. Cosa Nostra. O cartaz proclama briga-de-galo.
A Charge do Jornal Após ataques de FH, tucanos sobem ao ringue e petistas reagem
Um contendor não é; e o outro, não canta: "Sou tímido e não me atreveria."
Cada partido compreende o que interessa à própria conservação não permitir que se esgote o partido concorrente. Tem mais necessidade de inimigos do que de amigos: só pelo contraste é que ele começa a se sentir necessário, a tornar-se necessário.
NIETZSCHE, F., Crepúsculo dos Ídolos: 39
"A comparação entre Serra e Dilma nos interessa. A Dilma tem projeto para o futuro, a oposição precisa apresentar o projeto dela. Em 2002, o povo queria mudança e ele [Serra] era o candidato da situação. Em 2010, o povo quer continuidade e ele é o candidato da mudança" (Líder do governo na Câmara, Dep. CÂNDIDO VACCAREZZA. - Folha de SP, 11/02/2010 )
"Se eles mostram o SERRA, que tem uma rica biografia, o PT mostra DILMA, que também tem." (BERZOINI, R., Presidente do PT, ao Estadão)
Então lá se foram os riquinhos atrás do Galo da Madrugada, este sim é galo.
Entre os trastes, porém, é difícil detectar contrastes:
O PSDB e o PT - e José Sarney, Collor de Mello, Democratas, you name it - simplesmente acabaram com qualquer espécie de oposição no debate político do país.
CUNHA, Martim Vasques da, As três soluções










Merecemos.
PT e PSDB não compartilham apenas a política econômica. Suas campanhas presidenciais compartilharam também os financiadores, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral. Dezenove empresas, a maioria delas com interesses no governo, investiram R$ 54,1 milhões na disputa eleitoral. O Banco Itaú, por exemplo, apostou igual em ambos os 'cavalos'.
www.claudiohumberto.com.br 6/4/2009
Os postulantes são velhos companheiros circenses. De mãos dadas entoavam o número das Diretas já, por eleições livres. O que apregoavam, todavia, não é possível - antes do povo, são seus partidários que lhes escolhem; e uma vez designados, buscam vedar a participação concorrencial. Vários partidos já foram cooptados, por certo não de graça.
Em 13 de agosto de 2005, a revista Época publicou entrevista com VALDEMAR DA COSTA NETO (PL-SP), o primeiro deputado a renunciar durante as investigações do escândalo do mensalão. Em foco, a reunião de 2002 que decidiu o apoio do PL (Partido Liberal) ao PT e a indicação de JOSÉ ALENCAR para vice de LULA.
O encontro se deu no apartamento do então deputado PAULO ROCHA (PT-PA), em Brasília. LULA estava presente. Depois de árdua negociação, durante a qual LULA discreto, se retirou a um aposento ao lado, fechou-se o acordo pelo qual o PT se prontificou a transferir R$ 10 milhões para o PL. em preço promocional. O PMDB deve alcançar melhor cotação. Relutantes e/ou nanicos, sofrem bombardeios, chantagens e sabotagens. É na cocheira que se decide o pleito. As eleições são indiretas. Candidatura avulsa, descompromissada com o corporativismo? Mas nem pensar!
"Se me fosse dado criar um sistema político do nada, faria um no qual a filiação a uma legenda não fosse quesito obrigatório para concorrer a um cargo proporcional ou majoritário. Só que a nossa realidade não é essa." (Hélio Schwartsman, Políticos em cana. Folha de S.Paulo, 18/2/2010)
Mas, dizia, ambos partidos de maior destaque se constituem por mútuas escoras.
O fato de eu, pessoalmente, gostar das críticas de FHC à candidata oficial e ao governo e de concordar com elas não me impede de reconhecer que o ex-presidente, queira ou não (e acho impossível que ele não reconheça isso), acaba colaborando com a estratégia petista.
AZEVEDO, Reinaldo,
FHC X LULA? NÃO! DILMA X CANDIDATO DA OPOSIÇÃO,12/2/2010.
Lembro do maquiavélico Pai-dos-pobres, e Mãe-dos ricos, o andrógeno parturiente do PTB e do PSD. A artimanha logrou espichar as falcatruas do Estado Novo por vinte anos além do colapso fascista. Foi preciso uma vassoura empunhada por um loquaz para varrer a enorme bandalheira. O que temos hoje? Desde a Nova República, malgrado curto lapso, quase os vinte anos de PT e PSDB se refastelando em mensalões. Nada mudou de lugar; exceto o prosaico "B'. *
Quando o PT assumiu o poder, seguiu ao pé da letra a receita de FHC - tanto nos acordos fisiológicos inevitáveis, quanto na tentativa de cooptação desses grupos barras-pesadas. A história ainda cobrará caro de FHC por ter institucionalizado o crime organizado no centro do jogo político brasileiro.
NASSIF, Luís, O sistema político brasileiro e o crime organizado. www.adital.com.br, 24/3/2009
De insignificante serventia, contudo, bem sei, é ventilar as falcatruas, que dirá tirar-lhes a máscara. Beira a ingenuidade lançar no rosto dos artífices a falta de moral. A imputação não lhes causa o menor impacto. Sentem-se até lisonjeados. O imoralismo chega a ser tão barato que qualquer um alardeia exercitá-lo, não titubeando demonstrar até mesmo o modus operandi.
Ora, concurso para garis tem milhares de candidatos, até mesmo doutores que buscam seu lugar ao Sol, na mais pura acepção. Não há certame com menos de três dígitos por vaga. No entanto, para um cargo que não exige sequer o nível médio, nem prática ou habilidade, e oferece um magnífico salário, cartão-corporativo sem limites, férias para onde quiser, levando a delegação que aprouver, sem estipulação de horário de trabalho, muito menos cartão-ponto, vale-transporte em transatlânticos voadores, moradia de graça no melhor palácio, assistência médica, hospitalar e dentária que preferir, sem nada pagar, naturalmente, vale-refeição com copa franca e vinho importado, viagens ilimitadas ao redor do mundo, entre 200 milhões apresentam-se apenas dois candidatos, sendo um ainda repetente, ex-exilado por conta própria, e a outra, neófita em política, ciência que pelos dotes que apresenta sequer passaria em vestibular, debutante em eleições, mera mandalete oficial? Algo me parece desconforme.
Boneca de ventríloquo? Nem sempre. Nenhum ventríloquo, a não ser por gozação, teria chamado Governador Valadares de Juiz de Fora duas vezes na mesma visita. Nem teria mencionado o ambiente como 'ameaça ao desenvolvimento', especialmente em Copenhague durante a conferência do clima. Também não teria respondido a uma repórter de forma truculenta, usando com ar de superioridade a expressão 'minha filha'.
KUNZ, Rolf, O show e o projeto de poder. - Estadão: 11/2/2010
N
Propala-se aos quatro ventos que vivemos numa democracia, que o povo pode escolher a cor que quiser, isto é, entre o preto e o branco. Na verdade o que está proposto é o cinza, a cor predileta, comum a esses pretensos digladiantes.
O falso contraste espelhado serve apenas para legitimar não um semi-plebiscito, mas na verdade um referendum, expresso que o eleitor ver-se-á diminuído, se não extinto, em favor do galo eleito e seus comissários.
Mas se a oposição se iguala ao governo petista nos métodos de rapina
do erário, como vai querer que o eleitor a escolha para o lugar deste?

PINTO, José Nêumanne, Do novo panetone à pizza de sempre?.
Ambos condenaram a ditadura, propugnando pela liberdade; porém, a desconsideram, em prol da interferência maciça do Estado. Dizem que é para o bem do próprio povo, e assim logram ressonância.
“Por isso, um príncipe cauteloso deve conceber um modo pelo qual os seus cidadãos, sempre e em qualquer situação, percebam que ele e o Estado lhes são indispensáveis. Só então aqueles ser-lhe-ão sempre fiéis.” (MAQUIAVEL, N., O Príncipe:15)
Primeiro, sangram a população; depois, apresentam os band-aids.
"Lula distribuiu recursos públicos a um amplo elenco de empresas, atraindo boa parte do empresariado, e a todo o movimento sindical. E fez isso com base nos inéditos ganhos de arrecadação, frutos da atividade econômica." (SARDENBERG, C.A., Juros estão caindo, 11/2/2010)
O estudo da sociedade é tão precioso porque o homem é
muito mais ingênuo como a sociedade do que como indivíduo.

NIETZSCHE, F., Vontade de Potência - Parte 2: 276
As taxações vem se avolumando gradualmente, sobrecarregando direta e subreticiamente os orçamentos comercial e familiar, conquanto aumenta o contingente improdutivo voltado a arrancar os reais de quem produz. Cada prato de comida custa o dobro a qualquer trabalhador; mas quando ele ganha um, apenas um, dá-se por satisfeito, e venera o dadivoso:
Algumas famílias deverão receber até R$ 1.900. Isso porque Serra lançou o programa Novo Começo, que, além do auxílio-moradia, destinará R$ 1.000 para que famílias atingidas pelas chuvas comprem móveis e outros objetos perdidos. 'Se depender de mim, ele será presidente', afirmou a dona de casa Alessandra Fernandes, 33, após receber seu cheque. Para Fernando Neves, ex-ministro do TSE, a entrega dos cheques não configura infração à legislação eleitoral 'desde que não haja pedido de voto'. A prática se configura como 'atividade de governo', diz ele.
Folha de São Paulo, 13/2/2010
O pior ainda acontece com aquelas empresas que se julgam privilegiadas em abiscoitar algum subsídio. Mercê da avalanche de gravames municipais, estaduais, e federais, e da maior taxa de juros do mundo, suas operações, e a comercialização de seus produtos são pelo dobro encarecidas. E por causa da atrofia monetária, do real sobrevalorizado pela escassez, pelo enxugamento através dos depósitos compulsórios em mais de 30% do que era para estar irrigando a produção e o mercado, os clientes aos poucos viram passantes.
"No acumulado dos últimos 12 meses, a produção industrial tem retração de 8,9%, o que configura o pior desempenho da série histórica. O setor de bens de capital foi o mais afetado... com redução de 25,7% na produção." (Folha de São Paulo, 2/10/2009)
Mas se o bondoso governo reduz um percentual de dígito sobre algum especial produto industrializado, o sindicato patronal lhe coroa o maioral.
Não conheço ditador, até mesmo os mais radicais, que não apele à demagogia, ao afago da massa que objetiva se impor; que dirá um travestido democrático. O povo aplaude, vibra só em imaginar a salvação. Na quase eterna desventura, ou com mais forte apetite, é da melhor conveniência esta permanente e segura possibilidade de ganhar aquele prato sem esforço, luta, dúvida nem risco. Cabe ao rebanho apenas escolher a mola que julga mais potente para fazer funcionar a portentosa máquina que lhe conduzirá ao prometido pasto-verde. O ideal se apresenta claro, e de graça; contudo, tal qual horizonte, ele jamais é atingido.
Um homem vota em um partido e permanece infeliz; ele conclui que era o outro partido que traria o período de felicidade e prosperidade. No momento em que estivesse desencantado com todos os partidos, já seria um homem idoso, à beira da morte. Seus filhos teriam a mesma crença de sua juventude, e a oscilação contínua.
RUSSELL, Bertrand, Ensaios céticos: 121.,
Letras pintadas até de vermelho e preto divulgam: Brasil, um país de todos. Portanto, não é de ninguém. Está à disposição. Quem chegar primeiro, se adona. O novo jockey poderá inovar ainda mais: em vez do "O Estado sou eu", O Estado é meu. Não perca: Quem manda neste país é o meu paiO mecanismo da representação política ardilosamente montado visa apenas a conquista, legimação, usufruto e manutenção do poder. Weasel, a doninha, é capaz de sugar o ovo sem quebrá-lo. A casca vai ficando oca, e ninguém nota.O eleitor sucumbe na massa, ao deleite do pizzaiollo. O resultado desta tendência será fatal. A sociedade continuará vivendo para o Estado? A espontaneidade social ficará violentada mais uma vez. E o homem, para a máquina do Governo? Novas sementes não podem frutificar no costumeiro mar-de-lama. E quanto ao próprio Leviathan, esta máquina que nada produz, mas apenas conduz, que torna o cidadão azeite de seu prato, depois de sugar a medula da sociedade, de saciar sua fome momentânea, um lapso não lhe tornará esquálido, enferrujado como toda a máquina, ainda mais cadavérica do que qualquer organismo vivo?
O Estado de bem-estar era um ardil político: uma criação artificial do Estado, pelo Estado, para o Estado e seus funcionários... Quando seus bem escondidos, porém crescentes, excessos e abusos no governo central e local foram revelados recentemente, havia se passado um século de defesa falaciosa.
SELDON: 60
O que lhe restará a não ser devorado pelos vermes, sucumbindo como tantos gigantes?
Para quem ainda alimente alguma esperança, quem porventura tenha permanecido incólume aos desvairios que já ultrapassam em dobro os sete anos de vacas-magras, basta conferir a virtualidade do negro prenúncio nas performances paralelas e recém passadas, e outras tantas mais ou menos distantes.
Portugal é a bola da vez em termos de volume proporcional de déficit. Como isso será feito no regime democrático? Eu não tenho a mínima ideia. É certo que essas sociedades passarão por processo de empobrecimento rápido. O fracasso dessas experiências é o fracasso da social-democracia, ou seja, da promessa igualitarista, incompatível com a prosperidade econômica. Estamos chegando a um tempo em que a realidade econômica se imporá de forma inexorável sobre a alucinação política que assumiu a hipótese de que seria possível suprimir a lei da escassez e que parcela crescente da população poderia viver sem trabalhar.
CORDEIRO, Nivaldo, Valores invertidos
12/2/2010
“O Brasil é feito para nos matar e não para nos fazer viver” (CARDOSO, Pedro, ator, sobre a injustiça social vigente no país. 13/8/2009 - http://emkt.pavazine.com) .
A polis vem perdendo a característica de um conjunto de casas habitáveis, para servir de estádio ao ajuntamento civil, campo demarcado em prol do "serviço público". São centenas de milhares de trabalhadores convocados para preencher cargos estapafúrdios, isto apenas no último exercício, acompanhados por milhões de portadores de bolsas de variadas grifes.
"Mais de 40 mil candidatos às eleições de 2006 e 2008 eram beneficiários do programa Bolsa-Família, segundo auditoria do Tribunal de Contas da União." (www.claudiohumberto.com.br - 5/5/2009)
O buraco-negro ocasionado por tal bolsão fatalmente embolsará o futuro da Nação.
"Todo gasto corrente que o Estado faz reduz a capacidade da economia de produzir bens e serviços. Em outros termos, se o gasto público não for eficiente, o mesmo está diminuindo o bem-estar de toda a sociedade." (WILHER, Vítor, Homens providenciais versus instituições, 12/2/2010)
"O governo não é capaz de tornar o homem mais rico, mas pode empobrecê-lo." (MISES, L., Uma Crítica ao Intervencionismo: 21)
O comissário quer tudo para si. Infelizmente:
Nunca o brasileiro deveu tanto. Entre cartões de crédito, cheque especial, financiamento bancário, crédito consignado, empréstimos para compra de veículos, imóveis - incluindo os recursos do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) -, a dívida das famílias atingiu no fim do ano passado R$ 555 bilhões. O valor é quase 40% da renda anual da população, que engloba a massa nacional de rendimentos do trabalho e os benefícios pagos pela Previdência Social.
Estadão, 15/2/2010
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*Pessoal parece andar pegando carona na Nav's ALL. Bemvindos:
Pelo lado mais perigoso da política, há a flagrante tentativa de retomar um obsoleto 'estado forte' com seu fascismo disfarçado de pai dos pobres (e mãe dos ricos), sua absurda ineficiência e sua centralização que, governo após governo, inventa esses ladrões do nosso dinheiro que ficam — apesar do protesto hiperelegante da OAB — no comando da máquina que eles mostram não ter honra para gerenciar! A própria lei impede sua punição!
DAMATA, Roberto,A sina da coluna: fim de festa,19/2/2010



Um comentário:

  1. Querido Cesar ,o sábado de crônica no Blogger Jornalismo Antenado começou cedo esta semana. E a cronista da vez sou eu mesma que resolvi expressar em prosa algumas reflexões a respeito do momento que vivemos em nosso país. Espero você lá! Um super beijo e bom carnaval.
    Márcia Canêdo
    http://www.dihitt.com.br/noticia/vamos-nos-permitir-1

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