quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O stress e a medicina

O mêdo constitui a base do dogma religioso, bem como de muitas outras coisas na vida humana RUSSELL, Bertrand, Porque não sou cristão: 57
A boa Medicina trata o ser humano, e não a doença
HIPOCRATES
A oração de Hipócrates é impactante; porém, contrária aos objetivos dos criadores de Deus. Se Ele é hegemônico, ela é impossível - o mal precisa existir..
Mas eu não deixarei de tocar, em minha física, em várias questões metafísicas e particularmente nesta: que as verdades matemáticas, as quais chamais de eternas, foram estabelecidas por Deus e dele dependem inteiramente, assim como todo o resto das criaturas. Não receai, peço-vos, garantir e publicar em toda a parte que Deus é quem estabelece estas leis na natureza, assim como um rei estabelece leis em seu reino.  DESCARTES, Carta à Mersenne,1630.
Incrivelmente a teologia vem assim pautando quase todas academias, como se houvesse algum resquício de lógica, de racionalidade além da mesquinhez,  do egoísmo desmedido de seus inventores. A Medicina só podia escorregar por suas veredas.
Racional deriva de ratio, dividir. O apelo simétrico, contudo, restringe a possibilidade de um conhecimento abrangente, e por isso mais eficaz.
A viciosidade peculiar do racionalismo é que ele destrói o próprio conhecimento que possivelmente viria salvá-lo de si próprio, ou seja, o conhecimento concreto ou tradicional. O racionalismo serve apenas para aprofundar a inexperiência a partir do qual ele foi originalmente gerado.
FRANCO, P., cit. GIDDENS, A.: 39
Segmentos acadêmicos per se são excludentes, e o exercício medicinal ainda requer especialização hipertrofiada, método supostamente mais preciso. Ao tirar de foco movimentos periféricos, o investigador desdenha vetores mais remotos, em geral responsáveis pelo objeto no qual se detém.
Na rotina diária, nem sempre percebemos que tudo que existe é de certa maneira controlado por forças e interações invisíveis aos olhos. Nossa própria existência, do nascimento até a morte, é influenciada por essas forças. Elas controlam as menores partículas subatômicas e as grandes galáxias a bilhões de anos-luz de distância.
OLIVEIRA, A.,
Depto Física, Univ. Fed. de S. Carlos - http://cienciahoje.uol.com.br/133058
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Até o advento das fundações científicas, as doenças eram combatidas por sacerdotes, curandeiros, feiticeiros, bruxos e alquimistas. Julgava-se que a invocação ao espírito seria forte para extirpar o sofrimento mais intenso da humanidade. DEUS, principalmente, sempre foi invocado, e até hoje, a julgar por inúmeros depoimentos, parece ter nesta tarefa sua principal função. Então, quando a peste assolava pelas pradarias, os sacerdotes convocavam o povo para se reunirem nas rezas. Como resultado, a praga se disseminava a plena velocidade.
Quando COPÉRNICO e GALILEU demonstraram que não tínhamos assim, tanta importância para Ele, que não éramos mais o centro do Universo, mas que DEUS havia composto o monumental como engenheiro, com tudo melimetricamente calculado, em perfeito ordenamento, o homem, à Sua imagem e semelhança, também partiu a tudo calcular. A concepção da natureza elaborada pelo Grande Arquiteto do Universo, portanto uma máquina perfeita, tornava tudo previsível. Para DESCARTES, (Regras para direção do espírito) não apenas os vegetais e os animais, mas também o próprio corpo humano seriam máquinas.
E deveras se podem perfeitamente comparar os nervos da máquina que vos descrevo aos tubos das máquinas destas fontes; os seus músculos e os seus tendões, aos outros diversos engenhos e molas que servem para as mover; os seus espíritos animais, a água que as movimenta, de que o coração é a nascente e as concavidades do cérebro são as aberturas.
DESCARTES, cit. ALQUIÉ, Ferdinand, Galileu, Descartes e o Mecanismo: 66
Nem foi assim, tão original: ANDRÉ VESÁLIO (cit. HENRY, John: 38), em 1543, já havia proposto o De humani corporis fabrica. O trilho bem servia à nova loco motiva: “A analogia com a mecânica animal tinha por efeito reduzir o maravilhoso, negar a espontaneidade do existente e garantir a ambição de uma dominação racional no curso da vida humana.” (CANGUILHEM, G., Ètudes d'histoire et de philosophie des sciences: 221; cit. DESCAMPS, C.: 91)
A gravidade do sulco cartesiano agravou o equívoco, e a humanidade se precipitou pela verêda:
A partir dessas considerações, podemos então nos questionar como a filosofia de Descartes influenciou as concepções de saúde e doença, na medicina moderna, e que ainda hoje se mantém imperativa nos sistemas de saúde.
Ediara Rabello Girão Rios , Senso comum, ciência e filosofia - elo dos saberes necessários à promoção da saúde
Dessarte, até hoje há quem desse modo nos descreva, compostos por uma espécie de sistema hidráulico, irrigado por “tubos” capazes de encaminhar a constante circulação dos fluidos. Nas artérias e nas veias, nestes “tubos”, circula o sangue. O trânsito é movido pelo motor denominado coração. Contração e dilatação produzem a pressão e impulsionam o movimento pelas artérias, tudo baseado em ações mecânicas de trações e inchamentos.
O raciocínio quantitativo tornou-se sinônimo de ciência, e com tal sucesso que a metodologia newtoniana foi transformada na base conceitual de todas as áreas de atividade intelectual, não só científica, como também política, histórica, social e até moral. GLEISER, Marcelo: 164
A natureza funcionaria de acordo com o dimensionado padrão, e tudo no mundo material podia ser explicado em função da organização e do movimento de suas partes. Todavia, a identificação dessa partes, e de suas causas, foi paulatinamente se tornando cada vez mais complexa. Diante da chuva de incidentais, de dados inexplicáveis, o segmento haveria de se repartir ainda mais, na faina da especialização, tornando o erro, que já era grave, monumental. Sem dúvida é justamente esta faina, ironicamente, que conduz a disciplina aos labirintos, como de resto as acadêmicas em geral. Ao fomentar a especialização e desprezar o conhecimento abrangente, todavia, tal trem epistemológico tem conotação própria de dinâmica desenhada para rápida intervenção, e contribui para o desenvolvimento tecno-estratégico; não suporta, todavia, o selo científico.
A medicina é prima-irmã da matemática. A própria designação médica nos remete à medição. Somente é suscetível de medida o que se torna aparente. Talvez por isso os médicos sejam quase unânimes em apontar causas físicas como fatores preponderantes que precipitam a "doença invisível" denominada stress. A lista é longa, mas se presume que eliminando pelo menos parte, ou de preferência toda, o vivente possa se colocar inacessível à mazela. Os doutos recomendam atividades e abstinência de inúmeras práticas, entre as quais despontam o lazer, em conjugação com atividades físicas. A vida sedentária prejudica o ordenamento vital, tanto quanto o consumo de álcool e fumo. A maioria dos estressados de fato apresentam esses chamados vícios; porém, estes não são causas, e sim conseqüências das mentes fracionadas.
É esse o erro de Descartes: a separação abissal entre corpo e a mente, entre substância corporal, infinitamente divisível, com volume, com dimensões e com funcionamento mecânico de um lado, e a substância mental, indivisível, sem volume, sem dimensões e intangível, de outro; a sugestão de que o raciocínio, o juízo moral e o sofrimento adveniente da dor física ou agitação emocional poderiam existir independentemente do corpo. Descartes pensava que o calor fazia circular o sangue, que as finas e minúsculas partículas do sangue se transformavam em espíritos animais, os quais poderiam mover os músculos. Porque não censurá-lo por uma dessas noções? A razão é simples: há muito tempo que sabemos que ele estava errado nesses aspectos concretos, e as perguntas sobre como e por que circula o sangue receberam já uma resposta que nos satisfaz completamente. O mesmo não sucede com as questões relativas à mente, ao cérebro e ao corpo, em relação as quais o erro de Descartes continua a prevalecer. Para muitos, as idéias de Descartes são consideradas evidentes por si mesmas, sem necessitar de nenhuma reavaliação.
DAMÁSIO, Antônio R.: 113
Isso foi de certo modo superado. Atualmente os profissionais avaliam efeitos psicossomáticos, de modo que os diagnósticos contemplam a maior gama de disfunções. Por isso o nível de stress é medido pela pressão sanguínea, mas do tratamento se encarregam os psiquiatras.
Qual a margem de êxito na eliminação do fantasma por esses profissionais? Mínima.
Não sei se o senhor adivinhou a ligação secreta entre A Questão da Análise Leiga e O Futuro de uma Ilusão. Na primeira, quero proteger a psicanálise dos médicos; na segunda, dos sacerdotes. Quero entregá-la a uma categoria de curas de alma seculares, que não necessitam ser médicos e não podem ser sacerdotes. FREUD, em carta a PFISTER; cit. revista Piauí:11/ 2010

A quem caberia, então, tratar essas cisões que estendem os pensamentos por vetores frontais, cada qual puxando as cordas para si, até rebentá-las? A resposta ofereço com a segurança do fio-de-ariadne.  a cura do stress e em grau máximo da esquizofrenia somente é possível através do entendimento da Filosofia, sua formação, extensão, certezas e  principalmente seus enganos, cátedra estranha à à Medicina, e de resto à maioria dos profissionais, mesmo os proclamados superiores..
A cultura do stress
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