sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A busca pela felicidade


Felicidade é uma gama de emoções ou sentimentos que vai desde o contentamento ou satisfação até à alegria intensa ou júbilo. A felicidade tem ainda o significado de bem-estar ou paz interna. O oposto da felicidade é a tristeza. Em linguagem comum, quando se diz 'estou feliz', está-se a utilizar o primeiro significado — o de emoção. Enquanto que se se diz 'sou feliz', se está a utilizar o significado de bem-estar.É difícil definir rigorosamente a felicidade,  e ainda mais difícil definir medidas desta.
Wikipédia
Se existe um porto pelo qual há preferência de escolha ele se localiza no Mar da Felicidade. O dilema é que ninguém sabe onde ele se localiza!
A ninguém é dado a capacidade de determinar o que faria alguém feliz. Costumamos apenas dizer que alguém é “feliz” quando consegue atingir seus fins. Depende, contudo, dos meios que utiliza, e mais ainda, que esses fins, se não forem esportivos, não determinem o fim de outrem.
BENTHAM,
por exemplo, utilizou justamente a quimera para obter um cômodo no Palácio. Seu exitoso e singelo apelo incitou milhares de adeptos, e ainda forma interminável classe dirigente pelo mundo afora:
“O único objetivo do governo deve ser a maior felicidade do maior número possível de membros da comunidade.”
Eis a mais perfeita falácia, o sofisma campeão introjetado no meio social.
"O centralismo tira da sociedade a sua iniciativa e a transformava em eterno menor de idade perante o Estado todo-poderoso." (VÉLEZ-RODRIGUEZ, R., Tocqueville em tempos de populismo, 21/2/2010)
Esta teoria imagina uma espécie de espectador imparcial que, por dispor de todas as informações, seria capaz de determinar, por um balanço de perdas e ganhos, qual a regra de maior utilidade - total ou média - para o maior número. É claro que o utilitarismo pode servir para justificar - em nome da justiça e por uma espécie de ardil do 'bem-estar geral' - qualquer sistema de opressão geral.
HAYEK, F., Os erros do socialismo - A arrogância fatal: 78.
RUSSELL (2008:103) não lhe perdoou:
"Há cem anos, viveu um filósofo chamado Jeremy Bentham, universalmente conhecido como um homem muito perverso."
As noções de plena satisfação ou de felicidade geral são desprovidas de significado. É impossível encontrar um padrão para comparar os diferentes graus entre diversos indivíduos.
O que cabe aos governos, isso sim, é permitir que cada cidadão persiga a realização de acordo com a personalidade, conhecimento, e aptidão que lhes são próprias. Nenhum governo do mundo pode propiciar felicidade a ninguém, nem mesmo se ela for condensada na matéria, no dinheiro - é que para tanto, ele causa a maior infelicidade justamente a quem produz esta riqueza, de maneira que a distribuição será efêmera, até por exaurir o produtor. Foi o que aconteceu na U.R.S.S., e de certo modo vem acontecendo entre nós, diante dos escorchantes impostos, juros, e taxas de câmbio artificiais.
Felicidade não é lógica propriamente, porque é impossível ser feliz na forma. Felicidade é um fenômeno histórico, circunstanciado, ambientado, sem regras fixas, sem ritos inamovíveis. É surpresa. É só momento. Felicidade extensa é monotonia. Por isto, diz o poeta popular, o amor é eterno enquanto dura. Cientificamente isto é besteira, porque não cabe na lógica. Mesmo assim, é real, porque a eternidade do amor está na sua intensidade necessariamente momentânea e por isso de vibração avassaladora, por vezes paroxista, não na repetição monótona, chata, quadrada de algo que se torna rito. A ciência, por razões de método, apreciaria que a felicidade se debulhasse na monotonia repetitiva, porque nada mais mensurável é captável do que isto. Mas aí teríamos de preferir ciência à vida.
DEMO, Pedro, Ciência, Ideologia e Poder, Uma Sátira as Ciências Sociais: 58
Há quem eleja desenvolver as potencialidades de seu próprio ego. Outras preferem ter consciência dos problemas de seus semelhantes, e sua felicidade consiste em proporcionar o que lhes carece. Apenas substituem o dilema. Satisfeitas as primeiras necessidades, imediatamente surgem outras, e mais outras. Existem os que desejam apenas a satisfação de seus apetites para a relação sexual, comida, bebida, boas casas e outros bens materiais. Não poucos optam pela vida beata, reservando a perfeição para depois da morte.
O refrão assegura que o dinheiro não traz a felicidade, mas a maioria acredita que sim. Desta maneira, quem possua duas camas, duas escovas-de-dentes, e duas casas tem que usufruir, obrigatoriamente, o dobro da felicidade daquele que tem apenas unidades.
Não por acaso a ataraxia epicurista recomenda a desistência em atingi-la plenamente. Contenta-se apenas em aproximações instintivas, mas emoções perturbam corretas avaliações. Para quem age arrebatado pela paixão, o objetivo parece mais desejável; portanto, o preço a ser pago tende a ser mais oneroso, o que turva sua pureza. Ademais, o ser humano não pode ficar a mercê de impulsos que mais urgentemente lhes exijam satisfação, sob pena de se ver transformado num fantoche de seus apetites. Por causa disso, orientais aconselham a renúncia completa a qualquer ação. Para esta cultura, a felicidade só pode ser alcançada pela completa extinção da vontade, de certo modo renunciar a vida, quando se faz perfeitamente passivo, indiferente, inerte como as plantas. O bem supremo é o abandono do pensamento e da ação. "Pela não-ação tudo pode ser feito", assegura-nos Lao Tzé. De fato, muitas vezes colhemos bons resultados apenas aguardando o desdobramento das circunstâncias; contudo, a natureza, no caso budista, e mesmo o aclamado DEUS, entre nosotros, greco-romanos, são insensíveis em relação à nossa existência, à felicidade de qualquer pessoa. Ademais, se radicalizada, a não-ação, a anulação de todos os desejos leva à extinção da raça humana, pela não procriação.
Muitos se referem a ideal infrutífero, porque real - ele se aloja dentro do ser. Neste caso, tudo seria atingível sem nada procurar. Mas apenas a consciência seria capaz de assegurar uma existência feliz, portanto prazerosa, isenta de dissabores e nefastas surpresas? De fato, o bom coração arrefece a ansiedade, e com ele intacto a gente pode vivenciar uma trajetória menos traumática. Tal conforto, todavia, mostra-se insuficiente, apenas condição, prerequisito para quem almeja a glória suprema da plena felicidade. Aliás, um coração hígido pode ser a causa, mas também a conseqüência do usufruto da felicidade:
"Um novo estudo publicado nesta quinta-feira na "European Heart Journal" mostra que as pessoas que são mais felizes, contentes e otimistas têm menos risco de ter problemas no coração." (O Globo, Estudo inédito mostra que emoções positivas e felicidade previnem doenças do coração, 18/2/2010)
E assim a mola, a alavanca, o motor continua aceso à cata do estreito ao delta. O apelo é de tal monta que, por infeliz paradoxo, cada vez há mais gente, em especial na classe dirigente, que quer obter a felicidade retirando-a dos outros.
Sugestões de auto-ajuda nunca foram tão evidentes. Não poucas atingem best-sellers, e per se evidenciam a generalidade da preocupação. Até hoje, contudo, não houve cientista, filósofo ou santo capaz de dimensioná-la. Somos unânimes na ignorância. Eis um assunto que rende milhões de frases, textos, poesias; e milhares de obras, todas com enorme potencial de sucesso, mas bastará apenas um instante infeliz para colocar tudo por água abaixo. Quem supunha ser um feliz vivente esquece até mesmo a razão de sua existência.
Ao vasculharmos publicações concernentes, podemos tomar ciência de ações ou até omissões que nos causam prazer, satisfação. As relativas conseqüências são sensacionais; portanto, efêmeras, tanto quanto a própria vida, que igualmente é limitada. Então diz-se que ela, a felicidade plena, absoluta, é simplesmente impossível. Ainda assim, seja homem, mulher, ou derivado, comunista, fascista, desregrado ou pastor, até loucos de todo o gênero tem no alvo seu único propósito. Por paradoxo, constantemente nos tornamos desnorteados.
Se no fim do carnaval restam as cinzas, se depois de bebermos vem a ressaca, se perdoados incorremos em novos erros, neste eterno vai-e-vem como destacar um polo em detrimento do outro?
Poderíamos encerrar o tema afirmando que não existe felicidade plena, tanto quanto inexiste pessoas perfeitas, nem eterno bem-estar. Todavia, ainda que meio utópico, inalcançável, o assunto no momento me apraz mais do que ficar retratando a avalanche de infelicidade proporcionada pela elite dirigente, e pela massa que lhe acompanha. Afinal, se de nossa aventura nenhum de nós sairá vivo, de que vale tanta seriedade?
Cansado de rasantes pelos transatlânticos sociais, por ora dedicarei minhas atenções planando através desses alísios, descompromissado com rumos, e com velocidades, apenas retratando as paisagens que vão naturalmente se sucedendo em meu parco raio de visão.
A melhor maneira de ser feliz é contribuir para a felicidade dos outros, diz-me CONFÚCIO, mas um sopro pode tanto representar um meio de ascenção, como um modo de apagar velas. Arrisco. Se algum quadro, pelo menos, propiciar satisfação, estarei plenamente gratificado. Se de nada servir, e até o contrário, tomar seu tempo, desculpe, mas nem isso será em vão - confirmará que você já possui a chave de seu paraíso.
Dois dias de navegação, pela proa surge uma caravela por demais acostumada com o trajeto. A felicidade lhe é companheira, porque não é chata, não é sempre a mesma. Diante da coincidência do encontro, e como a genialidade é irmã da simplicidade, encerro o período com a receita do seu comandante LUIS FERNANDO VERÍSSIMO, em Reabilitados, 21/1/2010:
Felicidade é quando o último canapé da bandeja sobra para você. É quando você sacode a lata — e ainda tem cerveja! É encontrar vaga no estacionamento depois de uma volta só. É o dentista telefonar para desmarcar a hora. E, ao contrário do que você sempre pensou, felicidade não é viver uma grande paixão, é ter alguém para coçar as suas costas.
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VELHO TEMA
Vicente de Carvalho

Só a leve esperança em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada,
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.
O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada,
E que não chega nunca em toda a vida.
Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos,
Toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim, mas nós não a alcançamos,
Por que está sempre apenas onde a pomos,
E nunca a pomos onde nós estamos.

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