domingo, 17 de janeiro de 2010

A pujança chilena

Nem dez milhões de chilenos hoje legitimam o candidato que um partido escolheu para presidir o país. O índice de abstenção será alto. Os defensores da democracia dizem que é decorrência do período de férias. Eu digo que por lá, como alhures, os políticos não tem feito por merecer maior respeito.
O voto não é obrigatório para quem não está registrado no Tribunal Eleitoral. Cerca de 30% do eleitorado e 75% da juventude votante não procederam a inscrição.
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Os últimos dados apontam PIÑERA com 50,9% dos votos; e FREI, 49,1%. .Para mim, trata-se de outro arranjo, no afã de tentar salvar a candidatura oficial, perdida de modo acachapante ainda no primeiro turno: SEBASTIÁN PIÑERA contabilizou 44,03% dos votos, contra 29,60% para EDUARDO FREI. Os números projetados visam emparelhar o cavalo-do-comissário. Veremos o quanto conseguirá.
A presidente MICHELLE BACHELET é tida a líder mais popular da A.L. Veículos propalam 81% de aprovação. Vejo a distinta senhora muito cordial, e nada afetada, mas perde para nós. LUÍS DA SILVA promete tirar o povo da m que ele próprio amontoa já há oito anos, e ainda assim apresenta maior cifra: 83%. Perde apenas para RICARDO MARTINELLI, do Panamá, primeiro colocado da lista, com 91%, e para MAURÍCIO FUNES, de El Salvador, com 88%. (Consulta Mitofsky. - Ag. Estado, 19/1/2009)
Todos provam o caráter fictício que rege os institutos, não de pesquisas, e sequer de consulta, mas de divulgação e marketing. HITLER talvez invejasse esta popularidade, mas nem JESUS CRISTO lograria tais patamares
Com 96% de aprovação popular, mais gente acredita em Lula do que em Deus. Só uns 7% dos brasileiros são ateus, segundo o IBGE. Com a margem de erro, humano, há um empate técnico entre o cara e O Cara de todos os caras. Como dizia o companheiro Bush, quem não está com ele, está contra ele.
MOTTA, Nelson, Crenças e crentes, setembro 2010.
Engraçada a invenção "desportiva" francesa, por muitas nações contrabandeada. Coisa do maniqueísmo dialético-cartesiano: os dois classificados ao round final são acompanhados pelos desclassificados, estes fiéis-de-balança da porfia derradeira, posição até mais confortável, rentável e poderosa. Eis uma evidente subversão da vontade popular, e inequívoco foco de negociatas, de acordos espúrios, e inconfessáveis. Mas apesar dos percalços políticos, tão comum no restante da América Latina, mas estranhos àquele povo desprovido de ambições hegemônicas, o Chile vai muito bem, sim senhor, graças à cultura e educação praticada por sua amável gente.
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A Nav's ALL cruzou os Andes no raiar deste verão. Um clima competitivo permeava o esporte e as  relações políticas, com a disputa presidencial. Entusiasmava os chilenos a virtual classificação para a Copa do Mundo.  Não sei se é costume, ou devido às especiais circunstâncias, mas avistava o pavilhão erguido em praças, prédios públicos, comerciais, até em residências. Lembrou-me do arraigado nacionalismo norteamericano, orgulhoso das horizontais. Tradicionalmente aguerrida, mas obscura, La Roja assimilou aprimorada técnica. Ora entusiasma o povo, até então meio avesso à prática bretã. Orgulhosamente a juventude envergava o encarnado fundo da estrela solitária, enquanto os bares mostravam o desempenho dos players em volume máximo..
Ouvia-se a vibração do heroísmo representativo por quadras de distância. Mérito do argentino MARCELO BIELSA, dono de uma personalidade marcante. Com certeza surpreenderá desavisados. Por ironia, os conterrâneos do vitorioso treinador, arquinimigos chilenos desde a disputa pelo Beagle, preferem MARADONA na boca do túnel. Por muito pouco já não entraram pelo cano, quase excluídos do derbie mundial.

Falando nisso, justamente no instante que elaboro este artigo, nas cercanias do canal, na passagem de Drake, distante uns 300 kms a sudeste de Ushuaia, a argentina  cidade do fim-do-mundo, precipita-se outro terremoto, este um pouco acima dos seis graus da escala Richter. Ainda não se tem notícia de vítimas. Também neste momento novo terremoto, de mesma intensidade, atinge Papua Nova Guiné, no Pacífico. Cruzes! Tucufum!.Mas o vizinho vai bem, sim, porque há muito independe da politica.."O modelo econômico usado durante a ditadura de Pinochet permanece em vigência no Chile", constata LUIS FERNANDO AYERBE, professor de História e Relações Internacionais da Unesp.Pois o modelo citado contou com a colaboração direta do candidato PIÑERA, na assessoria ao Ministro HERNAN BUCHI, oriundo da famosa escola liberal de Chicago. A Economia assim viaja em céu de ALLmirante. Segundo o Estadão de SP, trata-se da nação mais próspera entre os sul-americanos. A média do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) chileno de 2004 a 2007 foi superior a 5%. O país do Pacífico também é o detentor do maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da América Latina, com 0,878, ocupando a 44ª posição no ranking que engloba 182 países.
Ser da esquerda é, como ser da direita, uma das infinitas maneiras que o homem pode escolher para ser imbecil: ambas, com efeito, são formas da hemiplegia moral. ORTEGA Y GASSET, A rebelião das massas: 14
Para o embaixador do Brasil no Chile, MARIO VILALVA, os chilenos ultrapassaram esta dicotomia. Concordo, sem ressalvas. AYERBE também. Os preços são talvez os mais civilizados que se conhece, tanto quanto as taxas de juros, e a carga tributária, esta sendo paulatinamente reduzida. Quiçá também pela equalização cambial, muitos bens e serviços, se comparados aos brasileiros e argentinos, são fornecidos por cerca da metade dos dólares cobrados em nossos rincões.
Tratados de livre comércio, assinados desde a década de 2000 com os Estados Unidos, União Europeia, República Popular da China, Japão, Coreia do Sul, entre outros, asseguram oportunidades para que diversas empresas internacionais propiciem excepcional desenvoltura tecnológica e financeira ao country, algo que se espalha ao continente porque plataforma de entrada ao mercado latino-americano.
A construção civil encontra-se sobre forte expansão através de complexos de apartamentos, casas, inúmeros condomínios e edifícios comerciais. Pobre PABLO NERUDA, relegado em  parcas visitas à sua nada criativa residência da colina litorânea.
Os chilenos adquirem petróleo, automóveis, ônibus e aparelhos celulares dos brasileiros. Em troca fornecem cobre, salmão, frutas e o famoso vinho.
O Chile encanta. A educação de sua gente, a bela paisagem salpicada de flocos, os generosos campos irrigados pela abundante geleira, os picos dos Andes, a orla entrecortada, uma rica arquitetura, diversificada, erguida com plantas arrojadas e primorosos materiais, cidades bem planejadas, isentas de tráfego pesado, uma juventude sadia, que ainda namora pela infinidade de parques e jardins, restaurantes e hotéis com produtos e serviços de qualidade superior, a proliferação de educandários e universidades que excedem as padronizações religiosas e burocráticas, tudo torna o país destacado da mediocridade que assola nossa América.

Não se vê mendigos. As ruas parecem hospitais, de tão limpas. Santiago é organizada. Exibe merecedora fama de ser a melhor capital da América do Sul para se viver. Um segrêdo? Ela não conserva um governo específico para se encarregar da sua administração.
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Diversas autoridades dividem a responsabilidade, em mais de trinta comunas. Isso enseja a participação de todos, e minimiza as possibilidades da corrupção. Não por acaso lhe acompanha decrescente índice de criminalidade. Aliás, é um assunto que não interessa. Jornais sequer logram matéria.
O aeroporto está localizado na comuna de Pudahuel, no noroeste da cidade, a 13 km do centro. Possui sua própria administração, através de capitais privados. Não exibe a imponência de um Galeão, Guarulhos, ou mesmo de um Salgado Filho, mas o número de atrasos e cancelamentos de vôos é baixíssimo.
A menos de hora de automóvel aguardam várias e famosas estâncias de esqui, incluindo a mais moderna da América (com a maior pista de esqui do hemisfério sul) - Valle Nevado, El Colorado, Farellones e La Parva. Um pouco mais afastada, ao norte, Portillo está a aproximadamente três horas da cidade. Valle Nevado e Portillo também são resorts, com toda uma infra-estrutura hoteleira, gastronômica e de lazer. Esquiadores despencam vislumbrando o magestoso vale, terreno fértil de abundantes safras e divinos vinhos. Um suave aroma permeia a mais pura atmosfera. Algumas das mais importantes e tradicionais vinícolas do Chile estão localizadas bem próximas, nos Vales do Maipo e Aconcágua. Grande parte delas possui reconhecimento e prestígio internacional. Entre as inúmeras vinícolas, se destacam a Concha Y Toro, Santa Rita e Undurraga.



Resort San Afonso Del Mar
100 km, à sudoeste de Santiago.
Sua piscina, a maior do mundo,
tem mais de 1 km de extensão.
Espelha a pujança chilena.

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Os chilenos valorizam a orla.
Nem falo da pesca.
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,Fazendo frio ou calor, basta-lhes um pouco de Sol para estenderem os pés, descalços ou não, sobre a pouco fina areia. Vê-se bandos e mais bandos, completamente vestidos, a transitar na areia, sorvendo a maresia e sendo saudado por uma infinidade de pássaros litorâneos.
As crianças costumam praticar um esporte ultradifícil e inapropriado ao terreno: hóquei. A participação é mista. As meninas se juntam a competir com garra e valentia.
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No sul encontramos as mais belas geleiras e picos de neve, em cidadelas nas quais encontramos inúmeros resorts abarrotados de turistas nacionais e estrangeiros.
No inóspido norte o Atacama se preparava à vibração pela passagem do Rally Dakar.
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No rumo do oriente, em meio ao Pacífico,
localiza-se a Rapa-Nui (ilha grande),
Te pito o te henúa (umbigo do mundo),
com Mata ki te rangi (olhos fixados no céu).
A Ilha da Páscoa é Património Mundial da UNESCO.
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O território vulcânico tem forma triangular. É o pedaço de terra mais isolado do mundo, no limite da Polinésia Oriental. As evidências dão conta: os insulares de eram típicos polinésios.
.Algumas estátuas foram deslocadas para ao continente, ao alcance da apreciação de todos. Embora pequenina e distante, é notável sua influência na formação genética e cultural do povo, assim equilibrando os hábitos pouco recomendáveis do carma ocidental.
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Via-de-regra o chileno se mostra cordial, hospitaleiro, solidário e respeitoso. O sistema de transporte público, especialmente na metrópole, funciona com eficácia e credibilidade. O metrô atende grande parcela, enquanto modernos ônibus conjugados deslizam na superfície. Os trens são de "velocidade-alta" e elétricos. Atingem 140 km/h. Em Santiago existem mais livrarias do que farmácias. Presumo que a cultura possa contribuir para evitar a doença, e assim de antemão dispensar alguns afazeres farmacêuticos.
A estrutura política reserva ao Executivo a capital, mas o Legislativo se intala em Valparaíso, cidade portuária localizada a pouco mais de cem kms. de Santiago, vizinha da preciosa Viña del Mar. Procurei, mas não encontrei notícias de corrupção. O afastamento geográfico entre os poderes parece salutar, efetivo. No mínimo dificulta a promiscuidade.
Em Viña o Brasil iniciou a memorável caminhada rumo ao segundo título mundial de futebol. O estádio Sausalito, instalado em aprazível parque, conserva todas as características daquele longínquo 1962, inclusive em suas cores. Quiçá pela gloriosa passagem, brasileiros são sempre bemvindos, e até admirados por toda aquela gente simples, mas não simplória, que habita o fino país.
Viva o Chile, oásis e exemplo ao imenso deserto de idéias e boa-vontade que assola o sofrído continente.
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3 comentários:

  1. Como sempre uma bela e criteriosa avaliação.

    La democracia chilena continua a mesma de sempre, e não só ali, mas pelo mundo afora: a elite prepara um sushi com peixe estragado e o povo come com farinha.

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  2. Grato, Guizo. Não notamos divisões classistas entre os chilenos. E diferentemente de nosso nordeste, a região prima por caprichar na culinária.

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