sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

A subversão do Estado


A democracia fala de um governo comandado pelo povo e sujeito às suas leis; na realidade, entretanto, os regimes democráticos são dominados por elites que planejam maneiras de moldar e dobrar a lei a seu favor.  PIPES, R.:251.
Estamos nos tornando um país de fanáticos do sentimentalismo, de pervertidos da reclamação, de ditadores da reparação. Aquele que tiver a sorte, para desdita de muitos, de manejar o aparato do estado impõe, então, o seu fanatismo, a sua perversão, a sua ditadura. E ao arrepio da lei! Lei pra quê? O que importa é 'fazer justiça' segundo a metafísica influente. ABANDONO AFETIVO É PURA MANIFESTAÇÃO DE “DIREITO CRIATIVO”! É DEGRADAÇÃO DA CULTURA DEMOCRÁTICA. OU: QUANTO CUSTA O AMOR PATERNO?
Aventuras “ferrocarris-ideológicas” solapam com facilidade os parcos marcos democráticos....
O liberalismo exige que todo o poder - e, portanto, também o da maioria - seja submetido a limites. A democracia, ao contrário, chega a considerar a opinião da maioria como o único limite aos poderes governativos. HAYEK, F., cit. BOBBIO, N., 1993: 88
O conceito de democracia é inseparável do conceito de direitos do homem. Se se elimina uma concepção individualista da sociedade, não se pode mais justificar a democracia. Tenho dito freqüentemente que, quando nos referimos a uma democracia, seria mais correto falar de soberania dos cidadãos e não soberania popular. ‘Povo’ é um conceito ambíguo, do qual se serviram também todas as ditaduras modernas. BOBBIO, 1992: 101
MONTESQUIEU já não obtém o menor prestígio; e o predecessor, se de completo êxito na ocasião, logo se tornou inóquo.
Para Lukács, o liberalismo – que se inspirava na doutrina econômica clássica; que supunha suficiente a garantia de liberdade jurídico-formal para ação do homo economicus engendrar automaticamente um estado social e cultural de felicidade – foi desmoralizado, na prática, pela intervenção do Estado na vida econômica, pelo contrôle alfandegário, pelo protecionismo e sobretudo pelos monopólios. KONDER, 1980: 80
Nem sequer um doutrinário da democracia como Rousseau, com a concepção organicista da volonté générale, princípio tão aplaudido por Hegel, pode forrar-se a essa increpação uma vez que o poder popular assim concebido acabou gerando o despotismo de multidões, o autoritarismo do poder, a ditadura dos ordenamentos políticos. BONAVIDES, P. :56
Assim é que o Estado logra alcançar proporções muito maiores do que aquela pela qual fora criado - à defesa e/ou até mesmo tomada das terras.
A ideologia chega ao seu ponto máximo quando coloca o direito como instrumento acionado por uma 'vontade', a da maioria, através de seus ‘representantes’ - de ‘legisladores racionais.’ Jamais se questiona se os ‘representantes’ não estariam sujeitos as conveniências políticas.COELHO, L.F.: 341
Eis, flagrante, a subversão do esteio democrático, do Estado de Direito:

A justificação da democracia, ou seja, a principal razão que nos permite defender a democracia como melhor forma de governo ou a menos ruim, está precisamente no pressuposto de que o indivíduo singular, o indivíduo como pessoa moral e racional, é o melhor juiz do seu próprio interesse. BOBBIO, N., idem: 424
Nada disso, nem esboço é possível.
Examinarei, pois, o sistema do mais ilustre desses filósofos, J.J. Rousseau e mostrarei que, transportando para os tempos mais modernos um volume de poder social, de soberania coletiva que pertencia a outros séculos, este gênio sublime, que era animado pelo amor mais puro a liberdade, forneceu, todavia, desastrosos pretextos a mais de um tipo de tirania. CONSTANT, Benjamin, Da Liberdade dos Antigos Comparada a dos Modernos, tradução de textos escolhidos de Benjamin Constant, por GAUCHET, Marcel Org., paper Assembléia Legislativa do RS, 1996.
Não se pode negar que, enquanto massa de indivíduos de diferentes níveis econômicos e culturais, o povo não tem uma vontade uniforme, que somente o indivíduo tem uma vontade real, que a chamada 'vontade do povo' é uma figura de retórica e não uma realidade.KELSEN, Hans, A democracia.
Para Michaël Zöller, sociólogo alemão da universidade de Bayreuth, o que se chama de Estado é certamente um sistema de interesses pessoais organizados, uma Nova Classe. Como todos nós, sua ambição é aumentar a remuneração e a autoridade. Como classe, ocupam-se, pois, a desenvolver seus poderes, suas intervenções e sua parte no mercado, isto é, a apropriação pelo setor público dos recursos nacionais, operada através do imposto sobre a sociedade civil. SORMAN, G. :74.
"A liberdade de espírito e a vontade de uma nação deve ser mais apreciada do que a dos indivíduos, e o interesse vital superior da comunidade inteira deve exercer uma tutela sobre os interesses do indivíduo e lhe impor deveres" justificava o sapiente HITLER ( cit. KOLAKOWSKIi: 68)
O Führer era idolatrado não somente em sua terra natal; tinha adeptos em número considerável de americanos barulhentos e vociferantes.  BRIAN, Einstein, a ciência da vida: 329
Com efeito, hoje sabemos que o direito está imerso numa atmosfera ideológica e a teoria geral do direito, empenhando-se em abstrair este aspecto do direito, só pode falsear as perpectivas e, com isso, fica, por sua vez, sujeita à acusação de ser mais ideologia do que ciência. PERELMAN: 621
A lei, a chamada justiça, a qual contemplava algum direito do homem, do cidadão, ora volta seus olhos ao que ele produz, para determinar o rumo que deve tomar a riqueza - à garganta do próprio Leviathan:
A lei já não é um instrumento da justiça entendida em seu significado tradicional. É um meio dirigido à realização da concepção quantitativa da justiça que cuida de impor; um meio para transformar a sociedade conforme o modelo ideal que o legislador pretende instaurar. Aparecem assim as leis que em primeiro lugar pretendem iludir e mobilizar o povo, para que este caminhe gostosamente na direção - acertada ou não - que o governante deseja. E se a função de legislar se estima, ademais, como facere para realizar estas ilusões de transformar a sociedade ou de impor uma macro-justiça quantitativa: não resulta acaso a matematização como instrumento mais eficaz dessa pretensa macro-justiça? Mas como vimos antes, esta se realiza a custa de milhares de injustiças e da perda do sentido mesmo do justo e da virtude da justiça. (Goytisolo, J.M., O perigo da desumanização através do predomínio da tecnocracia, p. 155.)
O ordenamento jurídico continua preservando o direito do homem, isto é, sua integridade física, mas se subroga no direito de exercer o domínio e o poder sobre seu trabalho, por isso lhe preserva..
Como o ladrão, o Estado exige dinheiro sob o equivalente à mira de um revólver; se o pagador de impostos se recusar a pagar, seus bens são confiscados através da força; e se ele resistir a esta pilhagem, ele será preso ou levará um tiro se continuar a resistir. ROTHABARD, Murray, A ética da liberdade
Nesta perspectiva, os problemas de relação entre o homem e o Estado revestem um significado completamente novo. Não se trata mais de saber se a ditadura é preferível à democracia, se o fascismo italiano é superior ou não ao hitlerismo. Uma questão muito mais vital se coloca, então, a nós: o governo político, o Estado, será proveitoso à humanidade e qual é a sua influência sobre o indivíduo? GOLDMAN, Emma, O Indivíduo na Sociedade . - www.arteeanarquia.xpg.com.br
Ambicionar um sistema liberal, neoliberal, ou qualquer semelhança, equivale à marcha-ré ao pré-histórico. A mais moderna democracia não se furta de lançar mão até mesmo do rótulo de "direitos humanos", ainda que muitas vezes se atenha à proteção de animais, e de plantas. Desse modo, nada há, no Universo, que não seja humano. A propósito, não se admire:
A Suíça realiza em março um referendo sobre uma proposta que prevê que cada cantão do país seja obrigado a indicar um advogado para proteger animais domésticos de abusos - sejam eles bichos de estimação ou criados em fazendas. Os seres humanos acusados de crueldade contra os animais podem contratar um advogado ou ter um indicado para eles mas os animais não podem", disse o advogado Antoine Goetschel, segundo o jornal britânico The Sunday Times.
Já que a questão de Estado tomou outro matiz, fundamentalmente econômico, material, enveredei por alguns afluentes mais límpidos, na esperança de encontrar uma pureza, ou um conjunto mais hígido, capaz de redimi-lo. Até amanhã.
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