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O mais fácil, e ainda mais simpático é aplaudir o memorável feito goitacaz. Já tenho até observado que a voz discordante recebe a pecha de "espírito de porco", coisa de despeitado, ou de radical partidarismo. Como vivemos num
mar-de-lama, nem seria tão inusitado este espírito. Não comungo disso. Igualmente sou desprovido de despeito, porquanto nada almejo, exceto balizar a pista para os que chegam com suas asas danificadas por tanta insanidade. Por último, não vejo a menor distinção na disputa partidária, cujos embates me remontam a
telecatchs. Portanto, lavradas estas salvaguardas, sinto-me à vontade para examinar o assunto através de um laser cruel, embora reconheça, de antemão, de pouca utilidade, uma vez comprometido o destino de todos. Para meu alívio, a propósito, não estou só.
Quer dizer, então, que o governo de então vai pagar aos empreiteiros a fortuna colossal para a construção de obras da Olimpíada e o encargo de fiscalizar para que não haja corrupção pertence ao povo brasileiro? Isso soa como uma brincadeira. Ou como escárnio. SANTANA, P., Olimpíada da cegueira. - ZH, 6/10/2009
Não sou o 'estraga festas' inventando tragédias na alegria, mas transformar o dia a dia em festival de 'oba, oba' é gesto infantil, que despreza o futuro... Nenhuma olimpíada ou campeonato mundial de futebol redimirá nossas cidades, por mais obras públicas que se façam em função disso. TAVARES, F., ZH, 4/10/2009
A enquete de hoje do prestigiado
Terra dá conta: mais de 40% se opõem à iniciativa.
Se para a Inglaterra já há prognóstico de fiasco, mercê não só de seu pífio
trotoir por ocasião do encerramento dos jogos de Pequim, mas principalmente na comparação frente a espetacular pujança oferecida pela China, temo que essas nossas
Olimpíadas sejam as últimas*. O que se propaga são somente abstrações, ficções, presunções. Maior alienação é impossível.
"Além de ganharmos o direito de sediar os Jogos Olímpicos, ganhamos também a oportunidade de dar uma virada na qualidade de vida dos cariocas, com obras sensacionais e melhorias em todos os sentidos."
Melhorias em todos sentidos, seguramente não. Podemos arriscar apenas tênues prognósticos. O provável é não preencher tamanha expectativa, e mais: assim como a luz atrai as mariposas, e as riquezas expostas atraem piratas e contrabandistas, tal aventura pode nos custar ainda bem mais caro do que o brutal esforço necessário para realizar essas tarefas.
Eu quero mais é que o Rio se exploda. Coitado dos cariocas que irão ver seu custo de vida aumentar 200%. Por quê os senhores acham que a população das demais cidades candidatas estavam tão "animadas" com a idéia de ter sediar uma olimpíada? O Lula tá feliz da vida, afinal o bolso dele vai ficar pequeno pra tanta grana fria que vai entrar. Já o meu.... e o seu?
(Comentário de leitor)
Não são poucos os que agora planejam mudança de cidade. Vejamos um depoimento de um norteamericano "perdedor". Ele reflete a impressão de muitos moradores da
Cidade Maravilhosa, ainda mais considerando que não passam de tres as avenidas da orla: "Nós já temos bastante trânsito. Estou feliz que não conseguimos. Isso seria apenas muito mais que teríamos de pagar."
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Não há dúvidas sobre o
glamour das Olimpíadas e da Copa do Mundo. Por certo estimularão o ingresso de polpudas verbas estrangeiras, mormente nos quinze dias de cada uma. Dir-se-á que os efeitos ultrapassarão as datas, no que concordo, mas esta contabilidade não só é impossível, como irrisória. Ou será que tirante a recente e inesquecivel Pequim, e talvez aquela moscovita, quem sabe a dos terroristas de Munique, alguém mais vê algum reflexo em outra cidade-sede? E o que dizer do México, brindado com duas escolhas recentes de copas-do-mundo, não era para já ser a quinta potência do globo?
"É uma decisão corajosa, pois os Jogos no Rio não serão fáceis. Os custos serão imensos. A infraestrutura está longe de ser adequada a um evento olímpico."
(Neue Westfälische Zeitung, Bielefeld) A tanto contamos com o
Leviathan:
A política é a arte de unificar e organizar as ações humanas edirigi-las para um fim comum. Assim, o paralelo platônico entre a alma individual e a alma do Estado não é, de maneira alguma, uma mera figura de retórica ou simples analogia. É a expressão da tendência fundamental de Platão: a tendência para unificar o disperso, para trazer o caos de nossas mentes, dos nossos desejos e paixões, e da nossa vida política e social para um cosmos, para a ordem e harmonia... A teoria platônica do Estado legal tornou-se um patrimônio eterno da cultura humana. CASSIRER, E.: 102
Em vez de nos livrarmos do
carma, mergulhamos no delírio.
'Com orçamento garantido pelo governo', o Rio não exige que o Comitê Olímpico Internacional seja forçado a 'financiar um eventual déficit de recursos com dinheiro de patrocínio e televisão, como fez para os Jogos de Vancouver e teria que fazer por Chicago'. Breakingviews.com,
Há quem insinue a reaplicação daquele infalível método, desta feita em caráter internacional:
O governador de Tóquio, Shintaro Ishihara, disse que o Rio de Janeiro foi escolhido como cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016 por 'razões políticas obscuras'.
Pois não é que o próprio presidente do
mensalão de certo modo confessa?
Lula também elogiou toda a equipe que trabalhou na candidatura do Rio e destacou o papel da diplomacia brasileira na campanha olímpica que, segundo ele, 'é como ganhar voto na Câmara, no Senado, no sindicato'. BBC-Brasil, 4/10/2009
A questão do envolvimento nacional em único projeto, ainda mais improdutivo, não é só risco, mas certeza de equívoco. Se a maior parte do Rio aplaude o gigantesco projeto, sejam desportistas, engenheiros, operários, empreiteiras, imprensa, alguns patrocinadores/investidores, profissionais liberais, politicos, hotéis, meios de transporte, bancos, cambistas, agentes-de-viagens, estacionamentos,
flanelinhas, postos, restaurantes e lojas, indústrias e serviços que abastecem tudo isso, até a bandidagem, e
tietes e simpatizantes de toda espécie, é certo que os restantes sei-lá quantos estados e classes produtoras ficarão não só a ver navios, como serão expropriados de seus recursos para construir o sonho da pequena casta.
A realização dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro deverá aumentar o fluxo de turistas estrangeiros no Brasil em até 15% em relação a 2015. Em entrevista à Agência Brasil, a presidente da Embratur, Jeanine Pires, afirmou que o Rio de Janeiro já é usado como 'âncora' para atrair visitantes.
Por qual razão nossos portos estão abandonados, nossas estradas estraçalhadas, as melhorias dos aeroportos barradas por fraudes em licitações, enquanto adquirimos caças, e submarinos? Queremos receber visitantes com flores, ou com chumbo grosso?
Âncora é para navio, embora se use a designação, de modo meio forçado, à grande loja de
shopping. O sentido assegura algum resquício de faturamento às pequenas. Não é o caso. As demais prateleiras restarão às moscas:
"O investimento de R$ 8,9 bilhões destinados ao transporte público no Rio para os Jogos Olímpicos atendem apenas a algumas regiões da cidade; obras são principalmente na região da Barra da Tijuca."
Lembro da construção de Brasília. Custa-me saudades de
JÂNIO QUADROS.
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Um dos grande apelos dá conta da enorme quantidade de trabalhadores que o programa irá demandar. Acredito. Segundo a cartilha keynesiana, se não houver emprego, que se mande pintar de branco a
Floresta Negra! Vai ver, até a
Pedra da Gávea será lapidada. Com certeza finalmente darão um jeito na poluição da
RODRIGO DE FREITAS, mas a pergunta que se impõe é por que se necessita receber visitas para se limpar a casa.
Trata-se de uma educação que visa a domesticação, a criação
de pessoas medíocres e úteis aos ditames de seu tempo.
NEUKAMP, E. http://www.consciencia.org/nietzsche_educacaoneukamp.shtml
O
comitè adverte pela imperiosidade da formação de atletas. Encontrará amplo apoio, começando pela mais efusiva residente, e colegas. E dê-lhe contos-de- fadas. Veremos uma enxurrada de apelos, histórias e estatísticas esportivas, resgates de ídolos, fabricação de novos, incentivos e exemplos alhures.
Brasil olímpico! Eis quiçá o mais notável prejuízo social: a farta distribuição dos recursos amealhados da produção destinados a escolas atléticas, somados à maciça propaganda, atrairão o jovem ao estéril ideal da disputa por medalha, orquestra de
Titanic.
O Brasil, em 2016, vai arremessar o peso, vai saltar no hipismo das varas, vai emaranhar-se no tatame do judô com seus adversários, vai esgrimir, vai flechar, vai saltar em distância, vai nadar, vai jogar futebol, basquete e vôlei, vai saltar com vara o Brasil, vai saltar em altura, vai dar um salto triplo no rumo do... abismo. SANTANA, P., ZH, 3/10/2009
Dizem que é melhor retirá-lo das ruas, das drogas, e perfilá-lo no esporte. É uma falsa dicotomia, como sempre antecede aos dúbios interesses. A prévia construção dialética, a serviço da
pastoral. Para mim, trata-se de trocar uma alienação por outra, apenas. Já não chega a enorme quantidade que quando crescer quer ser jogador de futebol, outro tanto piloto de
Fórmula 1. Apurar-se-ão algumas dezenas de felizardos. Os milhões restantes verão seu tempo, sua vida, e toda parafernália, em vão. Mas até passar a efeméride, a
pastoral residente terá forrado seus cofres, e o rei, aclamado desde agora por tão heróico feito, verá qualquer desmando ser apreciado como ínfimo
, insignificante no confronto com o zelo e abnegação social sobejamente demonstrados. Isso, enfim, é o que interessa.
Sim, nós perdemos. A questão que o Brasil urge enfrentar não tem nada de esportiva, tampouco é tarefa a
marketeiros. Nossas mazelas são intestinas, e referentes apenas a nós mesmos, brasileiros.
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*Para não decepcionar os ingleses, e o mundo, podemos encerrar os festejos de Londres dando serviço ao Colosso dos Sete Mares de Iracema, o tal porta-aviões francês recebido de lambuja, por conta da entrega daquela Copa do Mundo de 1998. Está sempre inativo, o coitado. B
asta atracá-lo no Tâmisa, ou adjacências, às evoluções das gloriosas Escolas de Samba. Para inglês ver.
César! O comentário que voçê posta sobre os jogos Olímpicos serem no rio são apocalípticos. Estou a ver voçê a escrever para um "Folha de S.Paulo" ou assim. Será que o problema do Brasil são os Índios, a miscigenação? O terceiro-mundo a celebrar a vitória da alienação? É isso não é? Me preocupa a violência. Especialmente a sul-americana. Tem muito índio aí. O Caetano Veloso também diz isso. É pá voçê está um jornalista engajé de pé cheio. Não é só Literatura! Desculpe Filosofia...
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