domingo, 19 de julho de 2009

Dos espíritos das coisas





A ação de um átomo sobre o outro pressupõe também a sensação. Algo de estranho em si não pode agir sobre o outro. NIETZSCHE, F. , O livro do filósofo: 45
Inúmeros aglomerados cultuam enorme quantidade de objetos ou prenúncios tidos como amuletos, e naturalmente refutam os azarados. "Eu não creio em bruxas, mas que elas existem, existem", e até o grande Niels Bohr sabia disso: a porta de sua casa exibia flamante ferradura. Espantados, os colegas "atômicos" lhe interpelaram:
- Niels, não sabíamos que era supersticioso também. Como pode acreditar nesses preconceitos?
- Ora, meus amigos, é claro que não acredito, mas como me disseram que a ferradura dá sorte até para quem nela não acredita, preguei ela aí. Afinal, quem não aprecia usufruir de uma chance a mais?
(A influência de Niels Bohr)
Na verdade Niels não acreditava mesmo, mas sabia que correntes energéticas nos circundam equalizadas, e o distintivo servia para mostrar suas intenções, naturalmente, já na recepção. O que ele não queria era o azar, que sempre anda à espreita. A ferrada espantava o infortúnio. Per se a ameaça do coice indicava meia-volta, volver! Vetar cômodo à desgraça pode se constituir em efetivo golpe de sorte. Alguém discorda?
Como podem essas coisas desprovidas de sentido obterem tal qualificação? De que modo e por qual razão a matéria per se produziria algum efeito, negativo, ou positivo para alguma entidade etérea, abstrata, invisível, apenas imaginária?
"Sabemos que o universo manifestado, que parece ser formado por objetos sólidos, é na verdade composto por vibrações, com os diferentes objetos vibrando em frequências distintas." (CHOPRA, DEEPAK, A realização espontânea do desejo: 124)
BACHELARD se anunciava psicanalista de objetos. Se lembrarmos da fusão energia e matéria, ou seja, que a matéria intrínsicamente está sempre em ebulição, em transmutação, mercê da incessante atividade dos átomos que a compõe, e também inferirmos que nada seja por acaso, por acaso ela nela haveria mesmo algum resquício de consciência?
Matéria sem espírito não tem sentido.
Espírito sem matéria não é sentido
Na Polinésia existia uma tribo que emprestava um valor energético às coisas. Cada presente oferecido era considerado um talismã, uma parte do espírito de quem doava. Naturalmente que qualquer coisa furtada também portava o espírito do dono, de modo que ele se revoltava e amaldiçoava o detentor subretício.
Por coincidência, tirante alguma raríssima exceção, não lembro de nenhum bandido, gatuno ou corrupto exitoso. Nem em filme. A razão pode ser essa, mais singela do que todos pensamos, por que não?
Assim, descobriu-se recentemente que na natureza tudo está subordinado a uma ordem, até mesmo os fenômenos confusos, sem nexo, totalmente imprevisíveis. Esta ordem ‘superior’ é capaz de explicar eventos aparentemente randômicos - não importa se se trata de bolsa de valores, da mudança na temperatura de nosso planeta, ou da maneira que nós formulamos nossos pensamentos – e que podem ser expressos tanto em fórmulas matemáticas e físicas, quanto em belas imagens (os chamados fractals) disformes, mas com uma atraente irregularidade. Todos esses eventos têm algo em comum: o fato de serem atraídos a certos estados da natureza, o que lhes dá unidade, se bem que disfarçada. A nova regularidade dos fenômenos deu origem a uma nova ciência, que tem o ‘caos’ como tema central e na qual, um dia, deve se enquadrar a teoria das ondas.  WITKOWSKI, Bergè: 275
Um dos princípios elementares da física quântica é o da indeterminação. Não podemos estabelecer o tempo e a trajetória de um eletron na composição do átomo por várias razões. Ao focarmos nosso alvo, ele imediatamente muda sua órbita, e pior, sem deixar rastro. O safado pratica o que se convencionou de salto quântico. Pois se temos a capacidade de alterar o seu destino, seja da forma que for, porque não supor que podemos mudar a matéria com nossas simples ondas de pensamento?

Descaminho
Na Grécia, berço das artes e dos erros e onde se levou
tão longe a grandeza e a estupidez do espírito humano,
raciocinavam sobre a alma como nós.
VOLTAIRE,
«13.ª carta», Cartas Filosóficas.
Coube a PLATÃO desencaminhar o mundo de roldão. Sua técnica continha lógica: o homem era dotado de algo invisível, mas a sua ausência era perceptível na morte. Como qualquer coisa não desaparece, assim, tão facilmente, ele compôs a equação: o ser humano era composto por dois elementos primordiais: o corpo, e a alma - aquele mundano, esta divina.
O mundo platônico não é um mundo de unidade,
e o abismo que, de diversas formas, resulta dessa
bifurcação, surge em inúmeras formas.
KELSEN, H., 2001: 8
“Na Idade Média, a dialética torna-se disputatio...” ( ABRÃO, B.: 353)
Esta drástica separação levou uma série interminável de equívocos, e armações, causa da humanidade se perder em mitos e obstáculos epistemológicos de todos os calibres e matizes. Pois assim como é impossível separar a luz de sua fonte, é inverossímel qualquer antagonismo, seja interno ou externo.
Tanto o platonismo quanto o cristianismo distanciam os seres humanos do meio que os rodeia. A natureza e a experiência eram encaradas como o mundo das modificações perturbadoras, o mundo do erro e do caos. Para o cristianismo, a dúvida e a incerteza são obra do diabo. ZOHAR, D., O Ser Quântico, Uma visão revolucionária da natureza humana e da consciência, baseada na nova física: 188.
Enfeitiçado pela doutrina órfica de PITÁGORAS, PLATÃO compôs toda a base religiosa, e também a científica postulando o caminho algébrico como exclusivo esteio à produção científica. Diante da perfeita lei de DEUS o conhecimento ficou relegado, mas quando a alguém percebeu que não era o centro do Universo, e que portanto, não seríamos assim tão importantes para Ele, o mundo derivou para a alternativa científica. Calcada no ditame primário da matemática, o homem julgou poder se livrar do engano.
No tempo desses artífices a vela continuava rainha da noite  e a fé permanecia “iluminando” os pobres mortais. Quando a vela caia, e incendiava tudo, nada era culpa de Deus. Ele não tapeia suas criaturas. Os equívocos advém do “gênio mau”, “manhoso e enganador”, sempre empenhado no seu papel, o diabo caricaturado na Meditação Primeira, de Descartes, meditação deveras primária. Como o Grande Relojoeiro fizera tudo com maestria, cabia ao homem a desmontagem, a descobrir seus segredos.O Deus cartesiano nos dá algumas idéias claras e precisas que nos permite encontrar a verdade, "desde que nos atenhamos a elas e não nos deixeis cair no erro". "O erro, o Mal entra pelo corpo, transforma o divino Bem da alma", e isso já ensinara Platão: “A terra, ou seja, a matéria, é contraposta à verdadeira natureza da alma, quer dizer, ao seu ‘ser boa’. A matéria representa o mal.” (Cit. Kelsen, 1998: 3)
Infelizmente, pois, atolamos neste outro deslize, ainda mais prejudicial porque se manteve o primeiro, acrescido do segundo:
As teorias de Newton lançaram-nos em um curso que desembocou no materialismo que ora domina a cultura ocidental. Esta visão realista materialista do mundo exilou-nos do mundo encantado em que vivíamos no passado e condenou-nos a um mundo alienígena. BERMAN, MORRIS, cit. GOSWAMI: 31
Infelizmente, a civilização permanece impregnada do carma platônico. Maior bobagem não pode haver.
É uma questão que atualmente deve ser reconsiderada, tendo em vista que a fragmentação já se espalhou completamente, não apenas na sociedade, mas especialmente em cada indivído; e isso conduz a um tipo de confusão generalizada da mente, que por sua vez cria uma série infinita de problemas, interferindo com a nossa clareza de percepção de maneira tão grave a ponto de bloquear nossa capacidade de resolver a maioria deles. BOHM, D., Totalidade e ordem implicada: 17
Reversão
Depois de muito tempo, a eletrodinâmica de Faraday e Maxwell, confirmada pelas experiências de Hertz, obrigaram a ciência a tomar consciência de fenômenos não propriamente materiais.  As ondas são veículos pelos quais a energia se concentra, e se dissipa.  Elas suportam o intercâmbio de informações de modo infinito.
Tal qual o arco faz vibrar as cordas do violino produzindo sons típicos, as excitações térmicas promovem transições eletrônicas e assim os átomos emitem espectros específicos de radiação (não sonoras mas) de ondas eletromagnéticas, em uma grande gama de freqüências tais como rádio, microondas, infravermelho, luz visível, raios X, etc.COHEN, Aba, Listening to the atoms
A realidade se concebe nesta dinâmica teia de eventos inter-relacionados. Pelos seus movimentos naturais, em tese podemos surfar a qualquer porto idealizado.Futuro do Universo pode estar influenciando o presente
Um pedaço de matéria, que tomávamos como uma entidade persistente única, é na verdade uma cadeia de entidades, como os objetos aparentemente contínuos em um filme... Ambos são apenas uma cadeia de eventos que têm certas relações interessantes uns com os outros. A física moderna nos permite dar corpo à sugestão de Mach e de James de que a 'essência' do mundo mental e do mundo físico é a mesma. RUSSELL, B., Ensaios céticos: 74
A descoberta da radiatividade ratifica a possibilidade da transmutação dos elementos, processo pelo qual um material se modifica, ao talhe alquimista, se preferir. O urânio, por exemplo, transforma-se em tório, daí a rádio, que por sua vez origina o radônio, e este em polônio, que por último se converte em chumbo.
Suplantamos tantas eras de superstição, e preconceito, graças aos gênios do XX:
Eminentes cientistas e filósofos da Ciência como Niels Bohr, Louis Victor de Broglie, Philip Frank, Gaston Bachelard e F. Gonseth sentem a necessidade de recorrer a um novo tipo de dialética, a de complementariedade, para explicar problemas insuscetíveis de solução em termos de lógica axiomática. REALE, M.,1992: 72
O que governa a dinâmica da natureza, inclusive em seu aspecto mais material, na física, não é uma ordem rígida, predeterminada. Nem tampouco uma dialética entre contrários em luta, que leve a síntese, até que se produza uma nova antítese, como na visão dialética marxista rechaçada também pela genética, segundo diz MONOD. É precisamente uma interação - que já existe nos níveis materiais mais elementares entre o aspecto onda e o aspecto corpúsculo - o que impulsiona a dinâmica da natureza. Assim o mostram as relações de mecânica ondulatória, que explicou LOUIS DE BROGLIE, síntese genial que tornou possível, como diz RUEFF, uma filosofia quântica do universo, aplicável não somente às ciências físicas, senão também a todas as ciências humanas. Juan Vallet de Goytisolo  Interações
À neurociência cabe verificar o modus operandi de nossa intricada mente, via-de-regra ampliada em crescente complexidade da integração neuronal. Quanto mais neurônios e quanto mais sinapses, mais complexa é a nossa mente. Sendo assim, mente/cons­ciência é um conceito dependente e assim pode tornar a matéria, conforme o molde, como a Terra curva o Espaço, que por sua vez informa ao planeta o roteiro mais adequado. Há uma simbiose entre corpo/espaço, mente/matéria, em inequívoca interatividade. As pessoas que sóem complicar, por quererem tudo abarcar, no vêzo do poder. Não é bem assim. Definitivamente, não estamos sós. Mister o respeito:
Nesse caso, os neutrinos que criamos em nosso organismo podem ter a nossa marca e podem estar fazendo a nossa interação com o universo. Podem estar levando nossa mensagem, mostrando nossa existência e o que somos, do mesmo modo que a luz das estrelas nos faz tomar conhecimento de sua existência. ANDREETA, José Pedro e ANDREETA, Maria de Lourdes, Quem se atreve a ter certeza? A realidade quântica e a filosofia: 162.
Amit Goswami, ques­tiona o nível molecular da matéria. Se o encéfalo é o forjador das mentes, quem é o forjador dos encéfalos? No nível molecular, as dúvidas geradas pelas partículas subatômicas são inúmeras, mas é exatamente através dessas dúvidas, fortemente alicerçadas sobre uma miríade de fórmulas matemáticas inquestioná­veis até o presente momento, que Goswami afirma: a mente não é a consciência. A consciência vai além da mente, e é ela a responsável por fixar a matéria no cos­mo.
Na fi­losofia budista, coexistem espírito e matéria: Sambhogakaya e Nirmanakaya.
Dharmakaya
esparrama sua luz para ambos.
"Isto faz dos seres vivos elementos numa vasta rede de inter-relações que abarca a bioesfera de nosso planeta – que em si mesma é um elemento interligado dentro das conexões mais amplas do campo psi que se estende pelo cosmos." (LASZLO: 198)
O conceito de um mundo sutilmente interligado, um oceano cósmico no qual estamos intimamente ligados uns aos outros e à natureza, assimilado por nosso intelecto e abraçado por nosso coração, poderá talvez inspirar novos modos de pensar e de agir que transformem o espectro de uma derrocada global no triunfo de uma renovação global – uma renovação para uma era mais humana e sustentável. (Idem: 205)
Este conhecimento pode ser decisivo. 
Acredito que quem estiver entrando no caminho da iluminação será absolutamente impecável em tudo o que fizer. E por causa do medo da condenação? Não. Ou de punição de Deus, ou porque pequei e não alcancei o perdão? Não, não, não. Os verdadeiros iluminados verão que toda a ação tem uma reação com a qual eles terão de lidar, e se formos sábios, não faremos coisas que nos levarão a ter de enfrentar resolver e equilibrar isso em nossa alma mais tarde. Esse é o verdadeiro critério. LEDWIN, M., cit. ARNTZ, W.: 203

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