domingo, 10 de junho de 2012

Paradoxos e prejuízos do regime presidencialista - II

O Estado Poder inverte a ordem dos fatores. Para ele, sua força é que confere liberdade e prosperidade aos cidadãos. Seu princípio prioritário é a autoridade. Ávido de tudo reger, sequioso de tudo regular, absorve e centraliza um número sempre crescente de atividades. Apoiando-se num aparelho tecno-burocrático, dirige, comanda, ordena. Sem ouvir, nem informar-se. Distante, com relação ao Parlamento e aos organismos intermediários; cheio de suspeitas diante das associações e das coletividades locais, e a arrogância no poder. O Estado-Poder mantém a Nação sob tutela. Para fazer a felicidade dos cidadãos a despeito deles, senão contra eles. SCHWARTZENBERG, Roger-Gérard,  O Estado Espetáculo:  320
Seguramente este método não condiz com uma Nação civilizada, tampouco o alvo que acena. "A democracia fala de um governo comandado pelo povo e sujeito às suas leis; na realidade, entretanto, os regimes democráticos são dominados por elites que planejam maneiras de moldar e dobrar a lei a seu favor."(PIPES, R.:251)
Quanto mais os poderes coercitivos do Estado são expandidos além dos limites apreciados pelos teóricos do laissez-faire, maior o poder e a riqueza que se acumulam para a casta dominante que opera o aparato estatal. Conseqüentemente, a casta dominante, ansiosa por maximizar seu poder e sua riqueza, irá expandir o poder do Estado e irá encontrar apenas uma oposição pífia, dada a legitimidade que ele e os seus aliados intelectuais estão ganhando, e dada a falta de qualquer canal institucional de livre-mercado de resistência ao monopólio governamental de coerção e de tomada de decisão final. ROTHBARD, Murray, A ética da liberdade, cap. 23: As contradições inerentes do Estado
Identifica-se, aqui, o que Roger-Gérard Schwartzenberg cognomina do novo triângulo do poder nas democracias, que junta o poder político, a administração (os gestores públicos) e os círculos de negócios. Essas três hierarquias, agindo de forma circular, cruzando-se, recortando-se, interpenetrando-se, passam a tomar decisões que se afastam das expectativas do eleitor.Presos na teia de aranha
Os patrocinadores da campanha nada tem de patriotas, mas geralmente agiotas. "Não há um só escândalo no país que não nasça da organização mafiosa de entes privados para negociar com organizações mafiosas de entes estatais". Sendo o presidente obrigatoriamente representante máximo do partido que lhe elegeu, e pricipalmente por deter a chave do cofre, fica óbvio e patente que a premissa que levou Montesquieu a estabelecer a separação de poderes é apenas para inglês ver.  Não sobra nem resquício de independência sequer ao Judiciário, adjacente de designação executiva, e chancela legislativa.
O Congresso Nacional, aos poucos, vai deixando de existir como efetivo Poder da República, engolido pelos outros dois, Executivo e Judiciário. O primeiro golpe foi dado ainda na Constituinte, 24 anos atrás, com a adoção do instituto das medidas provisórias, que transfere ao Executivo a prerrogativa soberana de legislar. O Congresso, desde então, age como cartório do Planalto, chancelando decisões que não são suas – e que entram em vigor antes que dela tome conhecimento. Hoje, o Judiciário disputa com o Executivo a usurpação de prerrogativas do Legislativo. O ativismo de toga não apenas transferiu para si a missão de legislar, como atribui tal circunstância ao próprio Congresso, acusando-o de negligente. O Congresso acabou,, por Ruy Fabiano 28.4.2012
“É um reflexo da situação da justiça brasileira”, diz Marco Villa sobre a aceitação da violência contra criminosos
O Judiciário está contaminado pela politicagem miúda, o que faz com que juízes produzam decisões sob medida para atender aos interesses dos políticos, que, por sua vez, são os patrocinadores das indicações dos ministros. Hoje é a política que define o preenchimento de vagas nos tribunais superiores, por exemplo. Os piores magistrados terminam sendo os mais louvados. O ignorante, o despreparado, não cria problema com ninguém porque sabe que num embate ele levará a pior. Esse chegará ao topo do Judiciário. Estamos falando de outra questão muito séria. É como o braço político se infiltra no Poder Judiciário. ELIANA CALMON, Corregedora do Conselho Nacional de Justiça. - Rrevista Veja, 11/9/2011.
Em que pese os letrados passageiros do May Flower viajarem com a bíblia democrática de John Locke, o fato de terem dispensado a figura real pela presidencial exigiu a promoção do Judiciário a poder,  a adaptação francesa articulada por Montesquieu. O ímpeto por justiça, platônico par excellence, da França ao Eua e alhures, faz-se ponte à qualquer ideologia introjetada.
No fito de interferir nas relações sociais e produtivas, o festejado Roosevelt  contrabandeou a demagogia legislativa de Mussolini. "O Estado rooseveltiano ou a república da França apresentava, na época histórica do fascismo, características do Estado intervencionista (função econômica do Estado e fortalecimento do Executivo, por exemplo) que marcavam igualmente os fascismos alemão e italiano, sem que isto tenha significado o Estado de exceção." (POULANTZAS: 240)
Graças ao Judiciário, o populista presidente viu confirmados os instrumentos fascistas que introduzira na terra da estátua da liberdade. Ao ser reeleito com grande apoio popular, o marido de Leonor enfrentava fortes resistências na Suprema Corte, insistente em declarar a inconstitucionalidade das numerosas leis editadas, e "proteções" sociais aos trabalhadores. Roosevelt, então, enviou ao Capitólio um projeto revogando a vitaliciedade da corte,  dando direito à corporação para que ela prória nomeasse o substituto de cada aposentado compulsoriamente ao completar 70 anos anos de idade. O projeto naturalmente foi barrado, mas logrou simpatia na Suprema Corte, em seguida brindada com benesses compensatórias, entre as quais as oriundas da já reconhecida regulamentação social, extraindo-lhe assim a concordância com as medidas italianas, não só tremendamente inflacionárias, como totalmente estranhas á índole individualista e independente da maioria de seus cidadãos  "A nova América não será capitalista no velho sentido, e tampouco será socialista. Se a tendência atual é para o fascismo, será um fascismo americano, que incorporara a experiência, as traições e as aspirações de uma grande nação de classe média." (Current History Magazine, cit. Rothbart: 41)
Outro momento marcante, também com dantescas consequências não só ao Eua, como ao mundo todo, aconteceu na eleição do famigerado Bush.  O estado da Florida apurava uma série de fraudes na eleição, quando a Suprema Corte determinou a vitória de George W. Bush. Dois juízes foram decisivos na sentença: o filho de um trabalhava numa banca de advocacia voltada a Bush; e do outro, em  escritório jurídico ao vice Al Gore.
No Brasil se proliferam os tipos. Há quase 30 mil cargos federais de livre provimento. No Eua,  não chegam a 9 mil; no Reino Unido, apenas 300!
Vejam o caso do financiamento do subjornalismo pistoleiro, um aspecto para o qual tenho chamado a atenção já faz alguns anos. Em que pais do mundo democrático bancos públicos financiariam páginas, eletrônicas ou de papel, cujo objetivo declarado é atacar aqueles que o partido do poder considera 'inimigos'?  Dados os poderes imperiais do Executivo para regular a economia, a legislação tributária e fiscal pode eleger setores que serão beneficiados por incentivos e isenções fiscais.
O resultado desse modelo é um só: déficit de democracia O MAL ESSENCIAL DO BRASIL É O TAMANHO DO ESTADO!
“A estrutura social e econômica que a América Latina herdou da Península Ibérica impediu-a de seguir o exemplo das antigas colônias inglêsas e suas repúblicas nunca desenvolveram os símbolos e a aura de legitimidade.” (LIPSET, Seymor, O Homem Político: 84)
Para 'Economist', salários de servidores no Brasil são 'roubo' ao contribuinte
Os fatos políticos recentes podem indicar que estamos caminhando perigosamente para um sistema político que se aproxima muito do hiperpresidencialismo, caracterizado pelo excesso de poderes concedidos ao Executivo, o que pode levar à deterioração da democracia, ou até mesmo à sua destruição. Sintomas do hiperpresidencialismo

 A compulsória dá direito ao Executivo nomear o Judiciário que lhe apraz. E  a Constiutição de 1988 acabou com a vitaliciedade dos titulares de cartórios extra-judiciais, concedendo ao Judiciário a prerrogativa de regulamentar o preenchimento dos milionários cargos, tarefa que lhe seria totalmente estranha por dois mais candentes motivos, entre outros: trata-se de atividade extra-judicial - portanto, longe do alcance judiciário; a tarefa exclusiva do judiciário é "dizer" o direito, e não promovê-lo, ou gerenciá-lo. Com a inovação do privilégio, não poucos estabelecimentos apresentam à testa parentes, filhos, amigos e sócios de juízes e desembargadores, pelo país afora, elevados ao cargo através de concursos fraudados, claro, no fito de legitimá-los.. Graças à compulsória já predisposta, e ao mandato dobrado pelo congresso do pioneiro mensalão, nosso napoleão-de- hospício  logrou designar nada menos do que oito integrantes do Supremo Tribunal. Com sua quadrilha flagrada no mais grave delito, calou o congresso, mas não a Procuradoria da República. O urgente processo sofre incontáveis paralizações. Tal qual a Nova Era, contudo, seu desfecho é inexorável. Para não atrapalhar a campanha do PT, e mais do que isso, manchar sua artificial imagem que pretende histórica, "o maior dos governantes desde Tomé de Souza" entendeu que o julgamento  não deveria ocorrer este anos. A tanto, ordenou ao seu preposto, o revisor Ricardo Lewandowski, o retardo na conclusão do relatório; e ordenou a outro marionete, Dias Toffoli, que ignorasse os muitos motivos para declarar-se sob suspeição e votasse a favor dos culpados. Para finalizar, os réus tentam arregimentar seus parcos prosélitos para que saiam às ruas no intuito de constranger os julgadores recalcitrantes: "Todos sabem que este julgamento é uma batalha política. E essa batalha deve ser travada nas ruas também porque senão a gente só vai ouvir uma voz, a voz pedindo a condenação, mesmo sem provas. É a voz do monopólio da mídia. Eu preciso do apoio de vocês." (José Dirceu, ex-Chefe da Casa Nostra, digo Civil do ex-presidente Lula.) Ouça comentário na CBN
O fascismo caracteriza-se pela tomada de poder por gangsters, o que Marx chama de lumpen, gente não pertencente a nenhuma classe organizada da sociedade. Tomada de poder em nome do povo e da comunidade sem a limitação de nenhum controle racional. LIPSET, Seymor Martin, O homem político: 182
O que distingue o fascismo dos demais sistemas políticos autoritários é que, enquanto as ditaduras capitalistas tradicionais se contentam em monopolizar o poder, mantendo o povo calado e subjugado sob as patas de seus patrões (ou “donos”) respectivos, e garantir a continuidade da dominação de classes, os fascistas pretendem regulamentar, vigiar, fiscalizar e manter sob estrito controle cada aspecto da vida de seus “súditos”. Não lhes basta que os corpos retorcidos, famintos e mal-tratados dos trabalhadores sirvam ao doentio fausto e ao luxo fútil dos senhores, mourejando de sol a sol na produção dos meios para a vadiagem chique, em troca de migalhas Lula em filme é bom demais para ser verdade, diz 'Economist'
A democracia brasileira é, como o fascismo, 'autoritária'. A sua novidade consiste no quase desaparecimento da divisão de Poderes, pela supremacia concedida a um deles, o Executivo. Assumindo este a chefia suprema, ficariam os demais reduzidos a 'funções'. ALMEIDA MOURA,  G. de — A representação proporcional e a Carta de 10 de Novembro de 1937.5
É inconcebível que uma das mais importantes democracias do mundo seja assombrada por uma forma de autoritarismo hipócrita.
Jurista Hélio Bicudo, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso, cientistas políticos Leôncio Martins Rodrigues, José Arthur Gianotti, José Álvaro Moisés e Lourdes Sola,,o poeta Ferreira Gullar, d. Paulo Evaristo Arns, os historiadores Marco Antonio Villa e Bóris Fausto, o embaixador Celso Lafer, os atores Carlos Vereza e Mauro Mendonça e a atriz Rosamaria Murtinho. Manifesto em defesa da democracia,
"Um monopolista não tem incentivos para melhorar a qualidade de seus serviços nem para reduzir seus preços, pois não tem competidores." (BOTER, Albert Esplugas, É viável o anarcocapitalismo? 16/3/2010)
Eis porque o regime presidencialista é paradoxal ao exercício da Democracia, do Estado de Direito almejado, e da liberdade sonhada.  Com isso não estou fazendo apologia ao parlamentarismo, muito menos uma ode à Grâ-Gretanha. Nenhum (e ninguém) é perfeito. Mesmo este simples dos regime de ordenamento polídico-jurídico-econômico-social apresenta lá seus fundilhos.

O eleitor britânico, por exemplo, apóia a taxação confiscatória das altas rendas basicamente na esperança que isto irá se reverter em vantagens materiais, ou na certeza de que isto tende a reduzir indesejadas e irritantes desigualdades sociais? No geral, a ânsia por igualdade em nossas democracias modernas não é frequentemente mais forte do que o desejo de aumentar a própria fortuna material? Tanto quanto é impossível estabelecer parâmetros à noção de Justiça, ou brecar o crescimento da criança, não há como limitar o poder do Estado. DEAN RAPPARD
No country da amada Rainha, todavia, são outros quinhentos. Seus pertences não podem ser considerados travestidos, posto tratados de frente, e não em círculos, como sói acontecer com os congressos das democracias presidencialistas.
A Nova Era ainda aguarda a inexorabilidade: 
O terceiro princípio vital para a política do amanhã visa a quebrar o bloqueio decisório e colocar as decisões no lugar a que pertencem. Isso, que não é simplesmente um remanejamento de líderes, e o antídoto para a paralisia política.É o que chamamos de ‘divisão de decisão’. CHARDIN, Teilhard, cit. FERGUNSON, N.: 48

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