Do arquiteto
Para Platão, a ordem e a beleza que vemos no Cosmo resulta de uma intervenção racional, intencional e benigna de um divino artesão, um "demiurgo" (gr. δημιουργός), que impôs uma ordem matemática a um caos preexistente e, assim, produziu um Universo divinamente organizado, a partir de um modelo eterno e imutável (Pl. Ti. 26a). A visão platônica da origem do Universo também teve enorme influência na filosofia, especialmente na neoplatônica, no ocultismo e na teologia desde o século -IV até nossos dias. www.greciantiga.org
Durante seu desenvolvimento pelo pensamento grego, a filosofia da natureza enveredou por um caminho equivocado. Esse pressuposto errôneo é vago e fluído no Timeu de Platão. WHITEHEAD, Alfred North: 31
Assim falou Zaratustra (NIETZSCHE, 1961: 7):
Que é o macaco para o homem? Uma irrisão ou uma dolorosa vergonha. Pois é o mesmo que deve ser para o Super-homem: uma irrisão ou uma dolorosa vergonha. Percorreste o caminho que medeia do verme ao homem, e ainda em vós resta muito do verme. Noutro tempo fostes macaco, e hoje é ainda mais macaco do que todos os macacos.
Dos primatas
Quando Deus determinou a ordem dos corpos celestes, tinha em mente os cinco sólidos regulares, famosos desde os tempos de Platão e Pitágoras até nossos dias. KEPLER,cit. GLEISER, Marcelo, Criação Imperfeita. 65
Os homens tinham a teoria de que a matéria celestial era fundamentalmente diferente da matéria terrestre e que era natural que os objetos assim caíssem, enquanto era natural que os objetos celestiais, tais como a Lua, permanecessem parados no céu. BOHM, David, Totalidade e ordem implicada: 20
Não puderam (os homens), com efeito, tendo considerado as coisas (da natureza), como meios, supor que elas tivessem sido produzidas por elas mesmas, mas, tirando a sua conclusão dos meios que se acostumaram a obter, tiveram que persuadir-se de que existiam um ou mais diretores da Natureza, dotados de liberdade humana, que tivessem provido todas as necessidades deles e tivessem feito tudo para seu uso (dos homens). Não tendo jamais recebido (a) respeito do propósito destes seres informação alguma, tiveram também de julgar segundo o seu próprio, e assim admitiram que os deuses dirigem todas as coisas para uso dos homens, a fim de que esses se lhes liguem e para que sejam tidos por esses na maior honra. Do que resulta que todos, referindo-se ao seu próprio propósito, inventaram diversos meios de render culto a Deus, a fim de que fossem amados por ele acima de todos, e para que obtivessem que dirigisse a Natureza inteira em proveito de seu desejo cego e de sua avidez insaciável.
SPINOZA, B,, Ética, Prop. XXVI, Apêndice
Esta lapidar percepção pertence ao meado do XVII. Não sei como não foram queimados esses livros, em praça pública. Talvez chamasse a atenção do povo à obviedade. Mas ´pela ousadia de despir o dogma Spinoza tomou a excomunhão.
Dous lados dizia Machado
Na Grécia, berço das artes e dos erros e onde se levou tão longe a grandeza e a estupidez do espírito humano, raciocinavam sobre a alma como nós.
VOLTAIRE, Cartas Filosóficas. «13.ª carta»,
Pode um indivíduo ser usado como veículo de outro? Com certeza. São Cristóvão é transatlântico a cumprir o trajeto à margem metafísica.
Os homens podem cometer injustiças porque tem interesse em cometê-las e preferem sua própria satisfação que a dos outros. É sempre por um retorno que eles agem; nada é mau gratuitamente, é preciso que haja uma razão que determine e essa razão é sempre razão do interesse.MONTESQUIEU, Cartas Persas: 282
O caroneiro projeta a miragem, e o veículo escorrega pela gravidade. Caso se tornasse ponte, como preconizava Nietzsche, o caroneiro poderia deixar o santo se banhar à vontade, em vez de empregá-lo a seu vil interesse. O prazer do caroneiro, entretanto, não está propriamente no outro lado, mas em sentir-se poderoso sobre o veículo que dirige. A viagem sobre o dorso é que lhe apraz. O astuto aparece mais alto, porque na garupa; e mais importante, do que seu veículo, provado pelo sacrifício imposto, e docilmente aceito. Para onde vão, não vem ao caso - afinal todos para lá se dirigem,. Exceto o encantador Orfeu, todavia, ninguém mais voltou para dizer como são os aposentos do lado de lá. O mistagogo da ciência é que embarcou na ilusão, antecipando-se com a cicuta.
Do lado de cá, a matéria,, insofismável.. Todos são testemunhas. O Estado cuida de enaltecê-la ao máximo, e coloca todos no eixo. "Os bens são adquiridos com dedicação; porém, não há empenho algum pela pessoa que os vai possui". (Erasmo de Roterdã, De pueris) É que "a longo prazo estaremos todos mortos", ensina o biplatônico J.M. Keynes. A má tese, ou a má temática, a "quantofrenia", conforme Sorokin, ou a "aritmomania", como diz Georgescu-Roegens, coroou o homo faber tal homo mathematicus. O universo-máquina, que ainda tinha alma, passou a ser ‘um vasto sistema matemático de matéria em movimento’, um ‘universo material (onde) tudo funciona mecanicamente, segundo as leis matemáticas.’ Não há contabilidade, todavia, Mr. Keynes, e Herr Marx, que contemple o ser humano diante da infinidade de possibilidades emergentes.
A visão materialista estabelece: mais dinheiro=vida melhor. Porém, tendo adquirido mais e tendo descoberto que o vazio permanece, a conclusão da premissa materialista está errada.
ARNTZ, W.: 30
Como evidentemente em nada do lado de cá bate coração, o ser humano entende se achar excessão, por certo à Sua Imagem e Semelhança! “A terra, ou seja, a matéria, é contraposta à verdadeira natureza da alma, quer dizer, ao seu ‘ser boa’. A matéria representa o mal.” (Platão, cit. Kelsen, 1998: 3) Eis o dilema da civilização, já por 2.500 anos: o genuíno divino do lado de lá, tendo que transitar pela imperfeição do lado de cá.
Vã tentativa de armistício
Todos concordes com a primaz obviedade, o senso de equilíbrio torna justa a relação entre os simpatizantes de ambos os lados. O livre-arbítrio permite optar. Metade da face da terra, pelo menos, vem ocupado pelos chamados realistas - (de rei, veja só).Podemos ter vindo do lado de lá, muito provavelmente, sim, mas enquanto estivermos do lado de cá, a matéria é o que mais importa. Que adianta a velhice? "Não é um simples acaso que a idéia cartesiana de Deus como legislador do universo se desenvolva somente quarenta anos depois da teoria da soberania de Jean Bodin".(ZILSEI, E., The sociological roote of science, The American Journal of SociologyEstes) A autocognominacão racional veio por conta de que sabiam contar. Tinham razão. Ela deriva de ratio - ratear, contabilizar. A outra metade, contudo, merecia ser reservada a quem cuidasse do nosso distintivo primordial. Isso não pode ser medido. Não é geométriico, nem muito lógico, até ao contrário - meio deslocado no interior do ser humano, ,a caixa- preta tornada vermelha não obedece a nenhuma fita metrica, mas isso não quer dizer que ela não exista.Quando alguém é chamado de materialista, geralmente se ofende. Não seria para tanto: o espiritualismo, por desdenhar o material, implica na maior pobreza. Qual motivo para preferi-la? Alguns bacanas tiveram uma boa idéiia ao maquiarem o materialismo com o colorido escarlate e assim a região fronteiriça tem se ampliado consideravelmente. Ora os espiritualistas tratam de forrar o poncho; .e os materialistas agradecem a Deus tanta fartura. Assim todos mais ou menos concordes convencionaram a se chamar espiritualistas e materialistas, adversários, sim, mas não com explícitas agressões.
É necessário que tal cidade não seja una, mas dupla, a dos pobres e a dos ricos, habitando no mesmo solo e conspirando incessantemente uns contra os outros. PLATÃO, A República, livro VIII., cit. SAUTET, M.: 252
A ideologia cria uma 'falsa consciência' sobre a realidade que visa a modo de suprir , morder e reforçar e perpetuar essa dominação. (Wikipédia)
De um jeito ou de outro, ambos costumam pártir conscientes que fizeram tudo que podiam em seu curto EspaçoTempo do lado de cá. Afinal, que outra alternativa se pode almejar? Quanto muito o misto, ou, como digo, a junção dos dois, preconizariam Platão e Aristóteles, e de modo simplista e até simplório, pelo grande psicólogo Erich Fromm:
A cultura medieval superior floresceu porque o povo seguia a visão da cidade de Deus. A sociedade moderna floresceu porque o povo foi vitalizado pela visão do crescimento da Cidade Terrena do Progresso. Em nosso século, porém, esta visão deteriorou-se no que foi a Torre de Babel, que está agora começando a ruir e em última análise sepultará a todos em suas ruína. Se a Cidade de Deus e a Cidade Terrena foram tese e antítese, a única alternativa para o caos é uma nova síntese.
FROMM, E., 195
O produto desta sapiência, desta síndrome pelo eixo estendido é o quadrado da ignorância.Com todo o respeito.
Quo vadis? Se a carência é total, mas a busca pela satisfação é taxada insana, como escapulir do brete? Existe alguma panacéia capaz de arreferecer a ansiedade aviltada por qualquer quadrante que se escolha? A realidade seria miragem, fruto de potência patológica? Para onde mirar, se qualquer alvo é tão efêmero quanto a ilusão? E se o olho engana, não deveríamos mesmo arrancá-lo, como sugeriu venerado mestre? É possível isso, ou seria mais uma tentativa infrutífera, e pior, abrindo um buraco muito maior do que se pretendia tapar? Quem sabe então sentar no jardim de alguma acrópole, para admirar os lírios do campo, ou quiçá no embalo de uma rede nordestina, apenas para divisar a inexorável marcha do tempo, já que nada nos resta fazer, além de pensar, comer, caminhar, e descansar?
Para aplacar a esquizofrenia, os pecados dos espiritualistas são tolerados, desde que purgados. coisas do limitado homem. E as falhas dos materialstas não seria de outro modo. Então todos embarcam imbuídos da mesma esperança, do otimismo realista que coroou o mistagogo da ciência.
A civilização despenca firme e granítica no rumo imprimido pelo grande arquiteto do universo, sim, do universo da palavra, da retórica, do sofisma, ao gáudio do inventor.
O dualismo cartesiano, ao criar a bifurcação mente-matéria, observador-observado, sujeiro-objeto, moldou o pensamento ocidental, poucos filósofos discordando dele, cujos mais notórios foram Spinoza e Schopenhauer. No século XX essa discordância se acentuou. GOTTSCHALL: 189
Grosso modo, a humanidade dessa maneira se divide: de um lado, espiritualistas mais ou menos radicais de toda a espécie - filósofos, alquimistas, magos e pastores, pintores, videntes, historiadores, padres e os iogues, ideológos e sonhadores, poetas, românticos, artistas, muitos outros humanistas, também muitos ingênuos e não poucas vítimas; do outro, perfilam-se pragmáticos, os especialistas, profissionais, operários, agricultores, serviçais, cientistas, técnicos, atletas, políticos, generais, muitos alienados, e não poucas vítimas também.
Embora a tradição mantenha a maciça maioria enfeixada na faina socrática, um encontro entre atenienses e espartanos corresponde ao Negro com Solimões*. Dificilmente essas águas se misturam.
Existem todo o tipo de pessoas, mas acho que seria razoável dizer que ninguém que se diga filósofo realmente entenda o que se quer dizer com a descrição da complementariedade. A relação entre os cientistas e os filósofos é bastante curiosa. A dificuldade é que é inútil que haja qualquer tipo de compreensão entre os cientistas e os filósofos diretamente. BOHR, NIELS, cit. PAIS, ABRAHAM, Einstein viveu aqui: 33O salto conceitual que o físico alemão Max Planck deu em 1900, engendrando a base da mecânica quântica, reformulou de tal maneira a visão do mundo que, ao menos um historiador da ciência, não teria razões para supor que seu impacto já tivesse sido todo absorvido. CAPOZOLI, U., Presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico (ABJC)
O anacronismo dialético
O cérebro do Universo e capaz de contar acima de dois. Os dilemas do intelectual-artista e do teórico-político tem mais de dois chifres. Entre a torre de marfim, de um lado, e a ação política direta, de outro, existe a alternativa da espiritualidade. Do mesmo modo, entre o fascismo totalitário e o socialismo totalitário existe a alternativa da descentralização e do empreendimento cooperativo - o sistema político-econômico mais natural à espiritualidade. Cit. FERGUNSON, M. : 211
Malgrado o estrondoso alerta lá do alto do penhasco, com os pulmões ao máximo, pressão arterial medida em torque, e numa elegância incomparável, com tudo isso continuamos símios. E pior, ainda: por causa da evolução e da seleção natural, pessoal anda preferindo derivar a gorila. Talvez no pressuposto da inexorabilidade genética aferida pelo astuto botânico virado rei dos animais, consubstanciada pela magnifica presença do indescritível Deus, mesmo que Ele exista apenas em nossa priviliegiada e já bem desenvolvida cabeça, sujeitamo-nos a continuar seguindo os passos da macacada, com certeza como gesto de humildade e prudência. Pois convém informar os primatas:: não há fronteiras no Universo. Não tem nem se precisa misturar algo que não está separado. Qualquer cisão lhe mutilará. A outra margem que não enxergamos é apenas um prolongamento.
E=MC²
Por mais otimismo, certeza, e boa-vontade que pudermos compactar, qualquer opção, qualquer preferência por um ou outro polo, ou mesmo os dois ajuntados estará fadado ao fracasso, porquanto desdenha tudo o mais do EspaçoTempo. Se optarmos apenas pelo que os olhos vêem, e por isso tem certeza, equiparar--nos-emos ao chimpanzé. Embora parente, e inocente, e até mais simpático, o bananeiro não tem direito a Habeas Corpus. Se voltado ao abstrato, perder-se-á em suas brumas, ainda antes de iniciar a travessia, Se engrossar o coro dos bacanas, verá que eles apenas racionalizaram o artifício, de modo que o atoleiro ainda será mais profundo, porque dobrado.
Bem e mal são categorias inventadas pelo homem para conviver. [...] A imensidão do espaço não pode ser analisada do ponto de vista do bem e do mal. Não tem sentido, nenhum sentido, do ponto de vista do bem e do mal.BOBBIO, N., e VIROLI, M.: 79
Os velados embates decorrentes da parca imaginação socrática acusam exaustão. Restam muitos vitoriosos, por ambos os lados; e mesmo número de derrotados, alhures.:A estéril dicotomia vem sendo arrefecida conforme se dissemina o entendimento, o conhecimento, isto é, o reconhecimento:
Só conhecemos uma realidade - a dos pensamentos. Como? Se isso fosse a essência das coisas? Se a memória e a sensação fossem os materiais das coisas? NIETZSCHE, F., O livro dos filósofos: 45A teoria quântica dos campos ensina tanto a matéria (hadrons e leptons) quanto os condutores de força (bosons mensageiros) são causa & efeito do campo fundamental de energia mínima, ,não-nula (vácuo).
Em seu estado puro, isolado, os quanta não estão apenas num determinado lugar e num determinado tempo: cada quantum isolado está tanto aqui como ali - e num certo sentido, está em toda a parte do espaço-tempoLaszlo, E.: 33
Eternidade? Existe sim, óbvio. Nessarte já estamos inseridos. Hades: estás dispensado!
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