domingo, 6 de junho de 2010

A teologia da Bíblia

 Durante o século IV a.C., verificou-se, no mundo grego, uma revivescência da vida religiosa. Segundo alguns historiadores, um dos factores que concorreram para esse fenômeno foi a linha política adotada pelos tiranos para garantir seu papel de líderes populares e para enfraquecer a antiga aristocracia, os tiranos favoreciam a expansão de cultos populares ou estrangeiros. Wikipédia
Para Platão, (Timeu. 26a) a ordem e a beleza que vemos no Cosmo resulta de uma intervenção racional, intencional e benigna de um divino artesão, um 'demiurgo' (gr. δημιουργός), que impôs uma ordem matemática a um caos preexistente e, assim, produziu um Universo divinamente organizado, a partir de um modelo eterno e imutável. Ele admite que a crença em Deus não pode ser demonstrada, nem sua existência; mas fala que ela não faz mal, só bem. O mal para Platão é apenas a ignorância do bem, e ele procura demonstrar que o mal inexiste, e ninguém opta por ele de forma voluntária.
Minha desconfiança em relação a Platão robustece-se cada vez mais. Parece-me que ele se desviou de todos os instintos fundamentais dos gregos; encontro-o tão impregnado de moral, tão cristão antes do cristianismo - já apresenta a idéia do bem como idéia superior - que me sinto tentado a empregar, antes de qualquer outro qualificativo que abranja todo o fenômeno o seguinte epíteto: Platão, ou a mais elevada farsa, ou melhor ainda: Platão, ou o idealismo. NIETZSCHE, F: Crespúsculo dos Ídolos, “O Que Devo aos Antigos”, 2.
O script platônico só não contava com o DEMIÚRGO* humanizado no Concílio à Constantino:
Se o justo aparecer na terra, será açoitado, atormentado, posto em cadeias, cegado de ambos os olhos, e, finalmente, depois de todos os martírios, pregado numa cruz, para chegar á compreensão que o importante neste mundo não é o ser justo, mas parecê-lo. PLATÃO, República: 361
O pragmatismo espartano consubstanciou a República de Roma, e os impérios Romano e Bizantino.
E como se desce, desse mundo de ironia e razão e veridicidade, ao reinado do sábio de Platão, cujos poderes mágicos o elevam muito acima dos homens comuns, embora não tão alto que dispense o uso de mentiras ou despreze o triste mercado de cada curandeiro, a venda de feitiços, de encantamento e criadores de raça, em troca de poder sobre seus concidadãos! PEREIRA, J.C., Epistemologia e Liberalismo - Uma Introdução a Filosofia de Karl R. Popper: 153
ZENON, o fundador do estoicismo, frequentara a já famosa Academia, para depois apresentar suas lições em plena ágora. Houve quem apelasse para a "solução" socrática:
No ano 65 d.C., Séneca foi acusado de ter participado na conspiração de Pisão, na qual o assassínio de Nero teria sido planejado. Sem qualquer julgamento, foi obrigado a cometer o suicídio. Na presença dos seus amigos cortou os pulsos, com o ânimo sereno que defendia em sua filosofia.
A visão imperial tinha que mirar a matéria. Todos preferiam acreditar que as realidades corpóreas existiam por sopro divino.
O pneuma ou espírito é a força ou o poder criativo e princípio racional que ordena todas as coisas, e dá-lhes os recursos que correspondem à sua maior perfeição. Aos romanos, e a CÍCERO, interessava a tècne:
Em 87 a.C., Filão de Larissa, o chefe da Academia fundada por Platão em Atenas 300 anos antes, chegou a Roma. Cícero, 'inspirado por um extraordinário zelo pela filosofia', sentou-se entusiasticamente aos seus pés e absorveu a filosofo de Platão, chegando a dizer que Platão era o seu deus. Admirava especialmente a seriedade moral e política de Platão, mas também respeitava a sua imaginação. Mesmo assim, Cícero rejeitou a teoria das Ideias dele.
O dèbacle do império exigiu a retomada do viés teológico.
 Não puderam (os homens), com efeito, tendo considerado as coisas (da natureza), como meios, supor que elas tivessem sido produzidas por elas mesmas, mas, tirando a sua conclusão dos meios que se acostumaram a obter, tiveram que persuadir-se de que existiam um ou mais diretores da Natureza, dotados de liberdade humana, que tivessem provido todas as necessidades deles e tivessem feito tudo para seu uso (dos homens). Não tendo jamais recebido (a) respeito do propósito destes seres informação alguma, tiveram também de julgar segundo o seu próprio, e assim admitiram que os deuses dirigem todas as coisas para uso dos homens, a fim de que esses se lhes liguem e para que sejam tidos por esses na maior honra. Do que resulta que todos, referindo-se ao seu próprio propósito, inventaram diversos meios de render culto a Deus, a fim de que fossem amados por ele acima de todos, e para que obtivessem que dirigisse a Natureza inteira em proveito de seu desejo cego e de sua avidez insaciável. SPINOZA, B,, Ética, Prop. XXVI, Apêndice
Com o surgimento dos imperadores romanos o curso dos tempos se torna ainda mais tormentoso e os homens interiormente ainda mais inquietos e angustiados. E chegamos então a um ponto, verdadeira e secularmente crítico, de profunda decadência, quando, subitamente, aparece a figura de Cristo, anunciando-se como a luz do inundo, a ressurreição e a vida. O Cristianismo, ainda jovem, entra em cena e aos poucos arranca, à Filosofia, a direção do homem. HIRSCHEBERGER, J., História da Filosofia na Antiguidade. www.portalsaofrancisco.com.br
 A pretensa episteme socrática poderia reforçar a malfadada tecnè platônica:
Desenvolvido por Plotino (205/270) no início do século IV, em meio à decadência do Império Romano, o neoplatonismo tornou-se uma das mais importantes correntes filosóficas da época e foi a última contribuição do pensamento grego à filosofia Ocidental. O neopitagorismo, que sobrevivera desde o século - IV como um modo de vida verdadeiramente religioso, também acabou por se fundir com o neoplatonismo.
www.greciantiga.org
O "espírito religioso" provinha do encantamento de PITÁGORAS ao devaneio de ORFEU. Se o céu era inalcançável, e o subsolo insondável, existia uma ordem oculta, onde só a alma poderia desvendar.
A interpretação religiosa assenta nessa mesma biguidade: una est religio in rituum varietate, proclama Ficino, que, na Teologia Platônica – título revelador – desenvolve o acordo entre o platonismo e o cristianismo.
Perfilando-se aos consagrados precursores, PLOTINO ( Enéada VI, 9º tratado) imagina um unico DEUS, o UNO. "É em virtude do Uno [unidade] que todas as coisas são coisas." Neste particular, o parceiro estóico PORFÍRIO* resolveu montar uma estrutura lógica sobre a realidade aferida, ao gosto da escola.
  A Árvore de Porfírio parte de qualquer conceito ou gênero amplo, divide esse gênero em outros tantos gêneros subordinados, mutuamente excludentes e coletivamente exaustivos, por meio de pares opostos, chamado "diferenças". O processo de divisão pelas diferenças segue até que a espécie mais baixa seja alcançada, espécie essa que não pode ser mais dividida. O ser humano, e esta concepção, encarada até hoje, na conservação dessa pura ignorância, surge dividido em corpo e alma, esta produto divino, e aquele, produto terráqueo..
A alma . . . se ela partir pura, não arrastando consigo nada do corpo, . . . parte para o que é como ela mesma, para o invisível, divino, imortal e sábio, e quando chega ali, ela é feliz, liberta do erro, e da tolice, e do medo . . . e de todos os outros males humanos, e . . . vive em verdade por todo o porvir com os deuses. PLATÃO. Phaedo (Fédon), 80, D, E; 81, A.
Por acreditar nesta sandice, e por querer conhecer o dark side of the moon é que SÓCRATES antecipou a partida ao reino de  HADES.
PORFÍRIO (c.232- c.304),decisivo discípulo de PLOTINO. Organizou e publicou 54 tratados do mestre na obra As Enéadas. Escreveu A Vida de Plotino e comentou as obras de PLATÃO e ARISTÓTELES . Seu livro Introductio in Praedicamenta foi traduzido para o latim por Boécio e transformou-se num texto padrão nas escolas e universidades medievais, possibilitando desenvolvimentos na filosofia, teologia e lógica durante a Idade Média
PLOTINO, dizia,  reavivou a douta disposição órfica apenas retirando de HADES a primazia da recepção aos mortos. Pela importância da função, o hall cabia diretamente ao Presidente da organização, mas nesse campo preferiu aguardar. PLOTINO passou 10 anos apenas ministrando lições, sem nada escrever, por respeito a um pacto que fizera com ORÍGENES. CELSUS (em grego: Κέλσος) atacara a forma encontrada para o nascimento de JESUS, que alegou ter sido adulterina, mas ORÍGENES tratou de afastá-lo, em manuscrito Contra Celsum. Pelos rastros até aqui apurados, PLOTINO omitiu-se da crítica a ORÍGENES no fito do exercício de poder, do pragmatismo que as tragédias evidenciadas estavam a reclamar. Qualquer alternativa de especular além-túmulo era escolha pessoal, de qualquer governante, mas fosse qual fosse não era certo. As atenções deveriam se restringir ao concreto, à confusa realidade vivida, e segundo os preceitos de PLATÃO, descontente com HADES, porque o guardião do submundo havia lhe roubado a parceria de forma antecipada.
O plano de carreira se resumia em matar o detentor do posto almejado. Por outro lado, não poderia todo mundo resolver as coisas com a solução socrática. Medidas de prevenção tinham que ser tomadas, ainda mais no meio daqueles milhões de desesperados, onde a água da chuva vinha com a marca do coração. Porém, daqui da enorme distância de seu EspaçoTempo, é fácil aquilatar a grande falha de PLOTINO.
Orígenes como é comum nos escritores cristãos influenciados pelas doutrinas derivadas de Platão coloca as Idéias platônicas na Mente Divina, na Sabedoria de Deus. O Filho de Deus, Segunda Pessoa da Trindade, é a Sabedoria biblica: Mente de Deus, substancialmente subsistente:
Orígenes afirma que Cristo é Filho por natureza, 'o Filho unigênito do Pai'. (Orígenes. Os princípios, livro I, 4, 4-5).
[…] Deus sempre foi Pai, e sempre teve o Filho unigênito, que, conforme tudo o que expusemos acima, é chamado também de sabedoria (…) nesta sabedoria que sempre estava com o Pai, estava sempre contida, preordenada sob a forma de idéias, a criação, de modo que não houve momento em que a idéia daquilo que teria sido criado não estivesse na sabedoria…(Orígenes. Os princípios, livro I, 4, 4-5.)
O pensamento de Orígenes chama bastante atenção no que diz respeito a esse tema, pois alem de afirmar a virgindade perpétua de Maria, o que foi praticamente uma unanimidade nos primeiros séculos do cristianismo, realça os olhos com que naturalidade afirma também a imaculada conceição de Maria: "Desposada com José, mas não carnalmente unida. A Mãe deste foi Mãe imaculada, Mãe incorrupta, Mãe intacta. A Mãe deste, de qual este? A Mãe do Senhor, Unigênito de Deus, do Rei universal, do Salvador e Redentor de todos. ORÍGENES, Homilia inter collectas ex variis locis. - http://pt.wikipedia.org/wiki/Or%C3%ADgenes#A_produ.C3.A7.C3.A3o_teol.C3.B3gica
Os neoplatônicos se dividiram. PORFÍRIO tomou consciência do alcance do quadro pintado por ORIGENES e não titubeou, intitulando sua mais famosa obra: Contra os cristãos. Tarde demais. A Septuaginta, já estava em circulação, ganhando lá numerosos adeptos, para formar o grande delta ao escritor SANTO AGOSTINHO.
Está escrito que Caim fundou uma comunidade; mas Abel não fez o mesmo, fiel ao seu caráter peregrino e de hóspede temporário. É que a Comunidade dos Santos não é deste mundo, embora aqui tenha dado origem a cidadãos através dos quais se realiza sua peregrinação até que chegue o tempo de seu reino, quando todos se congregarão.  Santo Agostinho: De Civitae Dei, Livro XV, cap. I.

Para MARIA BAKER EDDY, a cristandade é "o sistema científico de cura divina." Ela descobriu o fenômeno a partir de si própria, em 1866, quando milagrosamente se restabeleceu de grave doença graças à leitura do Evangelho segundo S. MATEUS (IX, 1-38). A fé curava. Se em seguida ela morresse atropelada seria contingência da vida, não falta de fé. De qualquer sorte ela poderia contar com uma espécie de revanche:
Se acreditamos em um Deus justo, acima de qualquer outro atributo, só podemos vislumbrar essa justiça via reencarnação. Se não, como explicar essa justiça divina dentro de um mundo de contrastes e desigualdades abismais? Como entender o gênio e a besta criados ao acaso, por mero capricho, e conciliar sua existência com a justiça do Criador? LIMA, M.C.A., Afinal, quem somos nós? : 116
 EINSTEIN & INFELD (A Evolução da Física), contudo, bem compreenderam a faina milenar: "O cientista nunca dialoga com a natureza pura, mas com um certo estado de relação entre a natureza e a cultura, definível pelo período da história no qual ele vive, sua civilização, os recursos materiais dos quais dispõe."
Por primar pela diversidade e pela interatividade, o Universo ignora o que venha a ser Justiça
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Notas
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No cristianismo, isso se dá a partir da Bíblia. O teólogo suíço Karl Barth definiu a Teologia como um "falar a partir de Deus". O termo teologia foi usado pela primeira vez por Platão, no diálogo A República, para referir-se à compreensão da natureza divina de forma racional, em oposição à compreensão literária própria da poesia, tal como era conduzida pelos seus conterrâneos. Mais tarde, Aristóteles empregou o termo em numerosas ocasiões, com dois significados:
  • Teologia como o ramo fundamental da filosofia, também chamada filosofia primeira ou ciência dos primeiros princípios, mais tarde chamada de Metafísica por seus seguidores;
  • Teologia como denominação do pensamento mitológico imediadamente anterior à Filosofia, com uma conotação pejorativa, e sobretudo utilizado para referir-se aos pensadores antigos não-filósofos (como Hesíodo e Ferécides de Siro)

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