sábado, 24 de novembro de 2012

Constituição vilã

Os niveladores… rapazes bonzinhos e desajeitados… mas que são cativos e ridiculamente superficiais… O que eles gostariam de perseguir com todas as suas foras é a universal felicidade do rebanho em pasto verde, com segurança, ausência de perigo, bem-estar e facilidade para todos; suas doutrinas e cantigas mais lembradas são ‘igualdade de direitos’ e ‘compaixão pelos que sofrem’ – e o sofrimento mesmo é visto por eles como algo que se deve abolir. NIETZSCHE, F., Além do Bem e do Mal: 45
Reputo ao arremedo constitucional a emulação de todos os crimes que vem sendo cometidos ao nosso redor, ora em escala geométrica. Toca-me trabalhar
Dono de medíocre técnica jurídica, sequer alguma coerência política, o diploma é conseqüência do estupendo golpe cruzado sofrido pela Nação. Seu rosto foi esculpido com fisionomia republicana, o corpo democrata, e braços fascistas. As mãos são por demais visíveis. Na direita o indicador aponta para a esquerda, à metonímia socialista. E a sinistra empunha uma metralhadora carregada de Medidas Provisórias, equipamento mil vezes mais eficaz do que qualquer decreto ou ato institucional de fuzil. Os lábios são parlamentaristas, claro, mas o shape da língua é apropriado ao sotaque das fasces. Os dentes seguem o modelito de Constantinopla¹, um amor. Por via das dúvidas no pescoço da vilã lhe impingiram colar de cidadã. Nesta bizarra integração somente se desintegra o cidadão. A precária e sofrível engrenagem passou a girar justamente quando o executivo brasileiro, não o português, propiciava que o boi magro valesse mais do que o gordo, e o carro usado, mais caro do que 0 Km. O único artigo que defendia a Nação, foi considerado enxêrto, por isso maculado de imediato sem a menor cerimônia: a limitação dos juros à taxa de doze por cento ao ano, não ao mês, como sói acontecer nesta terra de símios e aves bicudas. De fato, taxas de juros não devem compor constituições, mas regramentos trabalhistas e sociais, também não. E a divisão de tarefas e prerrogativas oficiais deve ocupar apenas um acento, ou mesmo ir de pé, deixando vagos os demais lugares aos infortunados passageiros.
Para completar, o pelego-mor,  na condição de relator, não teve escrúpulos em confessar perante a Nação ter levado os palimpsestos para casa, alterando o que convinha à sua grei, para em seguida colher as assinaturas dos patos, que sequer olharam o que assinavam. Aos convivas, virtuais dirigentes, o que interessava já estava garantido.
Não existe tirania mais cruel do que a exercida à sombra da lei e com uma aparência de justiça, quando, por assim dizer, os infelizes são afogados com a própria prancha em que tinham sido salvos. MONTESQUIEU, Do Espírito das Leis: 109
A tal Medida Provisória, sempre permanente, e emitida no exclusivo interesse do Executivo, em nosso caso não tem nada de medida, que significa ação, mas de decreto, que significa determinação, ordem, obrigação de cumprir sem discussão, seja ético ou não, racional ou no intuito de corrupção. O macete veio contrabandeado do sistema parlamentarista italiano, e aqui adulterado como expressão de "direito divino". A prevalência deste instrumento, tornado flagrantemente ditatorial, denota a parcimônia, a anemia, a ignorância social, o mínimo conhecimento de como se assenta um regime que se quer democrático.  A prerrogativa pressupõe, também,  a ignorância do Executivo, posto não precisar pensar, nem raciocinar, tampouco se explicar – basta mandar. O Direito assim tornado hiperpositivista e formalista, repleto de salvaguardas à atuação presidencial.
No que toca à gente é apenas programática, metafísica jamais alcançada pelo cidadão comum. Não é sem razão que a imprensa norte-americana tenha tratado com descrédito e até humor esta constituição brasileira de 1988. Um texto que desce a níveis bem específicos e se prolonga por centenas de artigos é, na tradição americana, uma piada. Ela se presta a oferecer gigantesca faixa de irresponsabilidade ao governante, na certeza de que sua vontade sempre encontrará guarida no legítimo respaldo do corpo jurídico.  Imagine Obama tomando atitudes ou empurrando regulamentações ao povo americano ao arrepio do Capitólio. Não é o caso de uma republiqueta, nascida e mantida na base do sabre e da traição.
O Brasil tem o modelo federativo mais centralizador do mundo. Mais de 70% de tudo o que os brasileiros pagam de taxas e impostos vão parar nos cofres da União, que por sua vez os distribui por mensalões às deltas e cachoeiras que lhe circundam.
O maior dos cientistas teve o desprazer de assistir as peripécias de Bismarck, Lenin, Satálin, Hitler, Mussolini, Franco, Salazar, Perón, Getúlio, Tito, e tantos: 
O mais importante tipo de tolerância é aquele da sociedade e do Estado para com o indivíduo. Quando o Estado se transforma na coisa principal, e o homem no seu instrumento frágil e sem vontade, os valores mais altos estão perdidos. EINSTEIN, Albert, cit. BRIAN:50
Ora lhe consagra a plêiade que toma conta do país.

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