sábado, 1 de setembro de 2012

Religião & Psicanálise

Serve para possibilitar que a pessoa suporte viver a pós-modernidade. Saímos de uma sociedade que estabelecia claramente os certos e os errados. O homem atual se apavora frente a essa liberdade e se esconde atrás das fórmulas prontas de viver. Nesse contexto, a psicanálise vai na contracorrente da ideologia de que tudo tem remédio, dos livros de autoajuda e das neorreligiões. Ela transforma a angústia paralisante do homem frente à liberdade responsável das opções em uma ação criativa. Dr. JORGE FORBES
Nada mais claro, e também mais antigo e difundido, do que os Dez Mandamentos. A pergunta que se impõe é a seguinte: se não houvesse o dispositivo celestial entregue à guarda de Moises os homens se matariam uns aos outros, inclusive entre crianças e familiares?
O homem não precisa "ver" expresso o que é certo ou errado. Ele sente. Seu sentimento é que se faz empanado, especialmente quando a ribalta é jogada ao objeto que interessa ao manipulador.
No homem primitivo era o medo, acima de quaisquer outras emoções, que o levava à religião. Esta religião do medo – medo da fome, de animais selvagens, de doenças e da morte – revelava-se através de atos e sacrifícios destinados a obter o amparo e o favor de uma divindade antropomórfica, de cujos desejos e ações dependiam aqueles temerosos sucessos. Como o entendimento do homem primitivo sobre as relações de causa e efeito era pobremente desenvolvido, essa religião do medo criou uma tradição transmitida, de geração a geração, por uma casta especial de sacerdotes que se postara como mediadora entre o povo e as entidades temidas. Essa hegemonia concentrou o poder nas mãos de uma classe privilegiada, que exercia as funções clericais como autoridade secular a fim de assegurar seu poderio. Nesse ínterim se verificava a associação dos governantes políticos à casta clerical, na defesa dos interesses comuns. EINSTEIN cit. GABERDIAN, H. GORDON: 314
A psicanálise, a religião e, claro, a política necessitam de moldura, arcabouço no qual instalam suas preciosidades. Ele precisa ser rachado, porque seu homem também virá dividido, exatamente em duas metades, como manda a boa matemática, a simetria, e fundamentalmente a justiça. 
"Os analistas também atuam cada vez mais no setor jurídico, trabalhando como mediadores e peritos em questões de família, divórcio, guarda de filhos. E podem contribuir muito graças à visão global que têm de situações complexas como interdição, brigas, drogadição, violência doméstica etc." 
A cristã resolveu adotar o modo mais prático: de um lado, o divino ser humano, voltado à esperança, à imortalidade, porquanto criado à imagem e semelhança de Deus. De outro, o herói pecador, diante das necessidades mundanas. Para construir o contraponto, todavia, ela recorreu à mais pueril fantasia. Apenas o artifício pode lhe delegar valor, uma vez que sua inexistência acarreta a dispensa do afazer, a perda de seu próprio objeto. Se não existisse o maligno, não haveria necessidade de religião, pois não?
As ciências da mente emprestavam credibilidade à primaz percepção dos dois fragmentos.
A psicanálise funciona como uma metafísica de substituição num mundo sem metafísica e oferece elementos para a construção de uma religião numa época do pós-religioso. A instituição foi construída por seus 'sacerdotes' num esquema próximo ao da religião cristã, com seus patriarcas trabalhando diligentemente para esconder o quhttp://www.blogger.com/blogger.g?blogID=3511951494661377313#editor/target=post;postID=7200710639805200124e poderia vir a macular o mito. ONFRAY, Michel, Le Crepuscule d'une Idole - L'Affabulation Freudienne (O Crepúsculo de um Ídolo - A Fabulação Freudiana)
Seu método extrapola a técnica religiosa.
O superego é um juiz malévolo, como seu inconsciente é um carcereiro obtuso: velando sempre tão zelosamente sobre seu segredo, ele acaba por designar o local onde se esconde. Sob o pretexto de liberar os complexos, as pessoas se enredam cada vez mais nos assuntos sociais, familiares. BACHELARD, GASTON, cit. QUILLET, PIERRE: 61
São egos e superegos, bipolares, borderlines, o preto contra o branco, consciente versus inconsciente, o filho contra o pai, a vida enfrentando a morte, o máximo de cotejos possível, a distrair o incauto sofredor
. A medida que se difundiam as teorias de Freud, ele se revelava o maior desmancha-prazeres da história do pensamento humano, transformando as piadas e as pequenas satisfações do homem em sombrias e misteriosas repressões, descobrindo ódios na raiz do amor, maldade no âmago da ternura, incesto nos afetos filiais, culpa na generosidade, e o ódio reprimido pelo próprio pai como herança humana normal. (DOWNS,  R.B., p. 210. O autor não informa quem formulou a frase, limitando-se a caracterizá-lo como sendo "um critico um tanto jocoso".)
Esse é o grande desafio atual: lidar com fobias, pânico, transtorno bipolar, borderline, os chamados estados narcísicos. Todas essas patologias têm em comum o fato de serem estruturas arcaicas [criadas no início da vida, antes da linguagem e do amadurecimento da psique], ou seja: se instalam antes do mecanismo de repressão. Na neurose, a repressão já está instalada, existem os conflitos psíquicos e, nessa etapa, é possível simbolizar o sofrimento. No caso do pânico, por exemplo, não existe nem esse conflito. Imagine o medo tentando entrar na mente. Sem a parede da censura para barrá-lo, ele a invade. E, como na estrutura arcaica não há possibilidade de simbolização, o que costuma ocorrer são dores e outras manifestações corporais. Os psicanalistas hoje se debruçam sobre esses fenômenos. A Sociedade tem equipes de estudos de fibromialgia, dores crônicas, psicossomática. Há membros da Sociedade pesquisando conexões entre dor física e psíquica. MONTAGNA, Dr. Plinio Luiz Kouznetz, Presidente do IPA
Se Marx alcunhou a religião "ópio do povo",  a droga da elite qual seria?
A psicanálise, contudo, procura se modernizar. "A descoberta do mundo quântico, que tanto impacto teve nas ciências e tecnologias, ameaça agora envolver o 'etéreo' universo da psique." (COVOLAN, Roberto J. M., Instituto de Física Gleb Wataghin, Unicamp, Consciência Quântica ou Consciência Crítica? )
A prova maior é o abandono às causas subjacentes da patologia que examina, especulativas par excellence. Ora importa a simples superação. "Nesse contexto, a psicanálise vai na contracorrente da ideologia de que tudo tem remédio, dos livros de autoajuda e das neorreligiões. Ela transforma a angústia paralisante do homem frente à liberdade responsável das opções em uma ação criativa."  É o retorno do ser humano à  integridade cerebral tolhida há 2.500 anos.
LUCIANA SADDI: Conheça os perigos de se autodefinir; "um dia a casa cai", diz psicanalista

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