quarta-feira, 21 de maio de 2008

Reexames em faculdades de medicina

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A medicina cria pessoas doentes,
a matemática, pessoas tristes

e a teologia pecadores.

Martinho Lutero -

João Neves da Fontoura acrescenta que, no início,
a impugnação dos médicos diplomados fundava-se
'no combate
ao charlatanismo, ao curandeiro,
às benzeduras e semelhantes'.
Profa. Beatriz Teixeira Weber, Universidade Federal de Santa Maria-
TRANSCORRIDO O SÉCULO, as preocupações se endereçam aos próprios profissionais:

O Ministério da Educação anunciou fechar o cerco sobre os cursos de medicina. A intenção do rigor foi tornada pública após denúncias e protestos da Associação Paulista de Medicina (APM), da Associação Médica Brasileira (AMB), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e do conjunto das sociedades de especialidades.  (O Globo, 19/5/2008)

Os três cursos de medicina mais caros de São Paulo estão entre os piores no exame anual feito pelo Cremesp, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo: Universidade de Marília (Unimar), Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp) e a Universidade Metropolitana de Santos (Unimes). Parte das denúncias contra médicos tem relação com a má qualificação profissional. 'São médicos com menos de oito anos de formados, muitos com dois a três anos de prática', diz o médico Bráulio Luna Filho, coordenador do exame do Cremesp e integrante da comissão de especialistas do MEC que vai supervisionar os cursos.
Por qual escola este supervisor, especialista, teria logrado a formação?

O Tribunal de Contas da União (TCU) investiga irregularidades que teriam sido cometidas por membros da diretoria do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) nos últimos 7 anos. O processo 018.478/2005-6 está em andamento, mas um parecer de dois técnicos do órgão questiona, entre outras medidas, a compra, aluguel e reforma de imóveis sem licitação, no valor de R$ 687.722; a contratação de 33 funcionários sem concurso público; e o pagamento de diárias e salários a 21 conselheiros suplentes como eles se fossem titulares.
(Estadão, 1/7/2008)
Um quarto dos cursos superiores das áreas de ciências da saúde e agrárias vai passar por uma vistoria do Ministério da Educação durante o próximo ano. O resultado do Exame Nacional do Desempenho do Estudante (Enade), divulgado pelo MEC, mostra que 508 cursos não conseguiram ir além de notas 1 e 2 no Conceito Preliminar do Curso (CPC), o novo instrumento utilizado pelo ministério para avaliar as instituições.
(Estadão, 6/8/2008)
Dos currículos
"A medicina progrediu tanto em termos tecnológicos que o sentido do normal se perdeu."
(Revista da Semana, 28/4/2008, p. 22)
O preço tem sido caro, a todos:

O número de processos por erro médico que chegaram ao Superior Tribunal de Justiça triplicou nos últimos seis anos. Em 2002, o STJ recebeu 120 recursos em ações por erro médico. Neste ano, até o final do mês de outubro, já eram 360 novos recursos autuados por esse motivo, a maioria questionando a responsabilidade civil do médico. As informações são da Assessoria de Imprensa do STJ.
A má qualificação não deve ser debitada tão somente à falta de experiência, nem a falta de equipamentos adequados, à vocação, tampouco à carência de mestres. Não é sequer restrita às entidades elencadas:
"Estamos tratando as doenças muito além do necessário", confessa Peter Nelson, do Centro de Pesquisa sobre o Câncer Fred Hutchinso, de Seattle, à revista Wired.
A razão primaz parte justamente dos burocratas encarregados da fiscalização:
O que você diria hoje do grande número de estudantes que consideram o saber como meio utilitário, como um meio de se tornarem uma engrenagem na máquina econômica e social? Os estudantes da máquina de que você fala fazem o que lhes mandam fazer. Adultos construíram essa máquina, essa ratoeira, esse labirinto. Num labirinto onde os ratos se perdem, as pessoas não dizem, ao observá-los 'os ratos estão loucos'; dizem 'construiu-se um labirinto para deixar os ratos loucos'. Em muitos países, o ensino foi construído para deixar os estudantes não muito felizes.
(Serres, Michel, De duas coisas, a outra; cit. Derrida, J., p. 67)
A especialização hipertrofiada leva os salvadores ao enfadonho:
Os médicos precisam ficar em dia com a própria saúde. Pesquisa do Conselho Federal de Medicina (CFM), realizada com 7.700 profissionais, revela que quase metade deles apresenta quadro preocupante de transtornos psicológicos. Quarenta e quatro por cento sofrem de depressão ou ansiedade. E a grande maioria, 57%, tem estafa e desânimo com o emprego.
(Estadão, hoje.)
"Em cada 100 médicos, cinco sentem-se sem esperança, infelizes e têm pensado em dar fim à própria vida". (Centro de Pesquisas e Documentação - CPDOC)
"Uma pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina do ABC com 481 estudantes de medicina indica que 38% deles têm sintomas de depressão."(Folha de São Paulo,
5/12/2008)
Os currículos induzem as faculdades olvidarem, até mesmo, por paradoxo, essas incontáveis peculiaridades humanas, além de ignorarem a evolução da física, e extensão da química, matérias praticamente apartadas do exercício da medicina, mas não da natureza:
O desenvolvimento de medicamentos inteligentes, nos quais o cientista identifica um alvo molecular e projeta uma droga para atingir aquele alvo específico, têm produzido resultados tremendos, com certeza. Mas essas drogas são relativamente poucas e continuamos a depender, talvez mais do que nunca, dos produtos naturais como uma referência e fonte de inspiração para esse trabalho. A molécula do Taxol, por exemplo, tem uma espinha dorsal composta de mais de 30 átomos.
(
Aaron Bernstein, pesquisador do Centro para a Saúde e Meio Ambiente Global da Faculdade de Medicina de Harvard; Estadão, 25/5/2008 )
Nossa Universidade atual forma, pelo mundo afora, uma proporção demasiado grande de especialistas em disciplinas predeterminadas, portanto artificialmente delimitadas, enquanto uma grande parte das atividades sociais, como o próprio desenvolvimento da ciência, exige homens capazes de um ângulo de visão muito mais amplo e, ao mesmo tempo, de um enfoque dos problemas em profundidade, além de novos progressos que transgridam as fronteiras históricas das disciplinas.
(Lichnerowicz; cit. Morin, 2002: 13)
"Conhecer o que é comum, voltar à prática da medicina 'antiga', cujo parâmetro era a normalidade do funcionamento do corpo, parece o essencial." (Pat Brown Universidade de Stanford, 28/4/2008, Revista da Semana, p. 22.)

Hoje a Antropologia não pode abster-se de uma reflexão sobre: o princípio de relatividade einsteniano; o princípio de indeterminação, de Heisenberg; a descoberta da ‘antimatéria’, desde o anti-elétron (1932) até o antinêutron (1956); a cibernética, a teoria da informação; a química biológica; o conceito de realidade. Tudo o que diz respeito ao homem nos revela ao mesmo tempo o homem em movimento e o homem permanente; o homem diverso e o homem uno.
(Lèvy, Pierre, Uma constelação científica em transformação, in Witkowski, N., p. 353)

Enfim, defendemos que a Filosofia, especialmente sua dimensão crítica, tem muito a oferecer na formação e atuação dos profissionais da saúde. Ela contribui, especialmente no campo da educação em saúde, para o exercício de uma reflexão sobre os pressupostos epistemológicos que presidem a formação acadêmica (domínio da ciência) e a atuação no campo (domínio do senso comum), elaborando um esforço para compreender o elo entre os saberes.
Ediara Rabello Girão Rios , Senso comum, ciência e filosofia - elo dos saberes necessários à promoção da saúde
A pesquisa ortomolecular parece evoluir compatível.

Veja, ainda:

A cabeceira cartesiana da medicina
Do dano positivista à medicina
A importância da solidariedade na medicina
A patologia da Medicina

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